segunda-feira, 4 de agosto de 2008

AS NACIONALIZAÇÕES DO CAPITAL>

As nacionalizações do capital

Capitalismo.

Em nome das virtudes do mercado privatizou-se a economia, destruiram-se sectores produtivos, direitos, empregos, salários. (…) A quem pedia uma intervenção estatal respondia-se com discursos. Não era possível. A «teta do Estado acabou». Agora que a crise do capitalismo se agrava dia-a-dia vão-se os princípios do não intervencionismo e os Estados participam com o dinheiro dos impostos na salvação dos responsáveis pela crise: os detentores do capital.

Jorge Cadima - 03.08.08

A crise do capitalismo agrava-se. E como afirma a revista The Economist (17.7.08), «nesta crise financeira, cada episódio da saga parece ser ainda mais poderoso do que o anterior».

O pessimismo do Economist resulta da situação dramática de dois gigantes financeiros, ligados aos empréstimos no sector imobiliário dos EUA, e conhecidos pelos nomes de Fannie Mae e Freddie Mac. «São tão grandes – detêm ou garantem cerca de metade dos 12 triliões de dólares das hipotecas sobre habitações próprias nos EUA – que a ideia de que pudessem soçobrar era até aqui inimaginável» afirma o International Herald Tribune (12.7.08). Mas, desde Maio de 2007, perderam 85% do seu valor na bolsa (IHT, 12.7.08), acompanhando o afundamento do mercado imobiliário. O passivo das duas instituições «é de cerca de 40% do PIB dos EUA» (Martin Wolf, Financial Times, 16.7.08). «O Fannie Mae e o Freddie Mac [...] começaram a cair no que parecia ser um possível colapso potencialmente gerador de uma derrocada financeira global» (IHT, 27.7.08). Também este mês faliu a IndyMac Bancorp, «que se deverá tornar na segunda maior falência bancária da história dos EUA» (Economist, 17.7.08). E a crise não afecta apenas os sectores financeiro e imobiliário. O gigante automóvel General Motors perdeu 74% do seu valor bolsista desde Outubro e a Merrill Lynch declarou que «a falência [da GM] não é impossível» (Bloomberg, 2.7.08). Na opinião do comentador económico Martin Wolf, a crise «provavelmente ainda nem chegou ao fim do seu princípio» (FT, 16.7.08).

A reacção do grande capital à crise não se fez esperar: venha o dinheiro do contribuinte! Os ingleses nacionalizaram o falido banco Northern Rock. Em Março, a Reserva Federal dos EUA disponibilizou milhões de dinheiros públicos para salvar o banco de investimentos Bear Stearns. Bush declara que a dívida dos FMs «tem uma garantia implícita do governo» (FT, 16.7.08). Em poucos dias «um enorme pacote legislativo» de emergência foi aprovado nas duas Câmaras do Parlamento dos EUA autorizando o governo a disponibilizar dinheiro por tempo indeterminado aos bancos em apuros (IHT, 27.7.08).

Durante anos andaram a proclamar as virtudes do privado, detentor exclusivo da competência, eficiência e rigor. Em nome das virtudes do mercado privatizou-se a economia, destruiram-se sectores produtivos, direitos, empregos, salários. Milhões de pessoas, regiões, países e continentes inteiros foram destroçados. Alastraram a miséria, a exploração, as guerras. A quem pedia uma intervenção estatal respondia-se com discursos. Não era possível. A «teta do Estado acabou». O «contribuinte» não podia suportar serviços sociais ou apoios estatais. Enquanto isso, os ricos tornavam-se obscenamente ricos. Mas agora que o grande capital, pela sua própria acção e agindo de acordo com as suas próprias leis, ameaça fazer implodir a economia mundial, até o Presidente Bush se proclama amigo da nacionalização... dos prejuízos. O famoso contribuinte verá o seu dinheiro usado para subsidiar o grande capital. Como dizem alguns cínicos, é o «socialismo para os ricos».

É impossível exagerar a gravidade e os perigos inerentes a esta crise. O imperialismo comporta-se como uma fera, mesmo quando não está ferido de morte. E agora tem feridas graves. Mas um sistema que produz miséria e guerra em tempo de vacas gordas, e ainda mais miséria e guerra em tempo de crise, é um sistema que inevitavelmente irá gerar a resistência e a revolta. Foi assim no Século XX. Vai ser assim num futuro que talvez esteja mais próximo do que muitos pensam.


Este artigo foi publicado no Avante nº 1.809 de 31 de Julho de 2008

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