sexta-feira, 12 de julho de 2013

POLÍTICA - "Maioria conservadora quer impedir que povo enterre um sistema político apodrecido"

As elites conservadoras preferem os conchavos de gabinete. Sempre tiveram mêdo da democracia direta pois se acham as donas da verdade, as mais preparadas para decidir o que é bom para o país.

Breno Altman: “Maioria conservadora que impedir que o povo enterre um sistema político apodrecido”

Jornalista analisa a investida contra o plebiscito da reforma política e afirma que a maioria dos deputados não representa programas, mas sim aqueles grupos que financiam as suas campanhas
A decisão do colégio de líderes da Câmara dos Deputados, anulando a possibilidade de convocação de consulta popular imediata sobre reforma política, faz de célebre música dos Paralamas o hino do momento. “Luiz Inácio falou, Luiz Inácio avisou, são trezentos picaretas com anel de doutor”, diz a letra famosa. Formou-se, afinal, maioria conservadora entre os parlamentares para impedir que o povo enterre um sistema político apodrecido e antidemocrático.
O fato é relevante para entender o que se passa com o país. Eleita através de mecanismos que se apoiam no poder econômico e nas relações clientelistas, a maioria dos deputados não representa partidos ou programas. Compõe-se de porta-vozes de grupos que financiam suas campanhas, além de dedicarem o principal de suas energias para garantir a renovação de mandatos. De quebra, uns e outros não perdem a oportunidade para colocar algum no bolso.
Afirma-se, em tese corretamente, que o parlamento expressa a vontade média e heterogênea da cidadania. Essa assertiva, porém, tem pouca validade quando os filtros estruturais do sistema estão construídos para diluir o enfrentamento político-ideológico, transformar os partidos em colchas de retalho, estabelecer o mandato como instrumento de lobby e amarrar os eleitores com as cordas dos benefícios paroquiais.
Não é à toa que, apesar do eleitorado ter conduzido um partido de esquerda ao governo federal por três vezes consecutivas, os ventos de mudança não afetaram seriamente a correlação de forças nas duas casas do Congresso. Ainda sobrevive, nessa instituição, um bloco político majoritário que funciona como esteio parlamentar da plutocracia.
A administração petista, com erros e acertos, há dez anos trata de negociar, no interior da ordem estabelecida, a formação de alianças que permitam a implantação de seu programa reformador. Muito se avançou, aos trancos e barrancos, mas quaisquer mudanças estruturais são barradas pelas fileiras predominantes do conservadorismo e da fisiologia.
Os exemplos são muitos. O imposto sobre grandes fortunas, na última tentativa de implementá-lo, naufragou com menos de 150 votos a favor, em 2003. Não se aprova a emenda contra trabalho escravo. O marco regulatório da internet está parado há dois anos e corre-se o risco de ser aprovada a criminalização de conteúdos sem determinação judicial.
Pressionado pelas ruas, o Senado aprovou a demagogia de considerar corrupção um crime hediondo, mas derrubou projeto que diminuía o número de suplentes e impedia que parentes ocupassem a vaga do titular. Pura hipocrisia. Um símbolo de que, de todas as reformas de base necessárias, a que mais resistência encontra no parlamento é a política.
Agora foi a gota d’água. A resolução capitaneada por Henrique Eduardo Alves e Eduardo Cunha, caciques do PMDB, partido da base aliada, empareda o governo entre as ruas e o Congresso. A estratégia de construir governabilidade sem mudar as instituições está se exaurindo, e leva junto boa parte da popularidade acumulada nos anos anteriores.
Se a presidente, o PT e a esquerda não forem capazes de romper o cerco, repactuando com os movimentos sociais e pressionando o parlamento de fora para dentro, será real e imediato o perigo de definhamento do projeto político guindado ao Planalto no alvorecer do século.
Há uma ruptura entre a vontade popular e o sistema político, manifestada claramente nas jornadas de junho e nas pesquisas subsequentes. A aceitação sem luta do cambalacho contra o plebiscito, sem explicitar aos cidadãos qual é e onde está o ovo da serpente, eventualmente constituiria erro de proporções avassaladoras.
Hoje, dia 11 de julho, as greves e mobilizações pela pauta dos trabalhadores e pelo plebiscito serão ensaio decisivo para o grave momento que se vive. Não deveria ser, no entanto, um instante fugaz. As forças progressistas dependem de uma escalada das ruas para disputar hegemonia e abrir processo constituinte que aprofunde a democracia, varrendo a resistência dos trezentos picaretas sobre os quais Luiz Inácio avisou.
http://revistaforum.com.br/blog/2013/07/breno-altman-maioria-conservadora-que-impedir-que-o-povo-enterre-um-sistema-politico-apodrecido/

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