Brasil não tem como voltar atrás
A destruição das Torres Gêmeas de Nova York pelo terrorismo mudou o mundo. Desde então, não fomos os mesmos.
No Brasil,
que é observado hoje pelos países que reconhecem sua importância no
cenário mundial, explodiu uma bomba política, o processo de destituição
da presidenta, a ex-guerilheira Dilma Rousseff, cujas consequências ainda estão por decifrar.
A reportagem é de Juan Arias, publicada por El País, 04-12-2015.
A bomba foi lançada por
um político com poder, o terceiro na hierarquia da República, o
presidente da Câmara, e a explosão já ultrapassou, por sua gravidade, as
fronteiras do país. O mundo está desconcertado com a notícia.
A perplexidade foi maior porque o personagem que acendeu o pavio da bomba, o deputado Eduardo Cunha, conta com a rejeição universal e até mesmo visceral da sociedade.
De acordo com o consultor político Murillo de Aragão, as chances de que o processo termine com a saída de Dilma Rousseff são de 50%, a mesma porcentagem que nas redes sociais divide os favoráveis e os contrários ao impeachment.
A bomba, porém,
explodiu e não há como voltar atrás. Resta apenas esperar o resultado.
Algo, porém, já parece se esboçar: o gesto suicida de Cunha fará com que o país não volte a ser o mesmo.
E não será, ganhe ou perda Dilma.
Desse estouro, que metade do país aplaude e outra metade reprova, poderia sair um Brasil
diferente. E como em todas as convulsões políticas e sociais, é difícil
saber se será melhor ou pior. Sairá mais unido ou mais rachado?
Se Dilma Rousseff
permanecer porque o Congresso a absolveu, nem ela nem seu Governo
poderão ser os mesmos. Muitas coisas terão que mudar para que ela
recupere, por exemplo, sua popularidade que hoje é de apenas 10%. E para
voltar a unir uma sociedade dividida.
A presidenta terá de
reconstruir a alquebrada maioria no Congresso; terá que dar uma guinada
em seu Governo, pois o processo deixará feridas entre os partidos que
demorarão a cicatrizar.
Ela terá de apresentar ao país um projeto claro e rápido para recuperar a economia que afunda e cujo índice de desemprego atinge 20% da juventude.
Ela terá de esclarecer as relações com seu partido, o PT, assim como com seu mentor, o ex-presidente Lula, para que não haja dúvidas sobre quem governa o país.
Terá de ficar claro
para os cidadãos comuns que a fórmula maldita de oferecer cargos e
regalias para comprar o apoio de partidos e de congressistas (um pecado
que está na raiz de tantas ilegalidades) sairá para sempre de sua
agenda.
Terá de saber conquistar aqueles brasileiros que a levaram ao poder e que hoje confessam estar arrependidos.
Terá de demonstrar que
estão errados aqueles que hoje a acusam de não se interessar pela
política. Terá de aprender a ouvir mais e sem excessiva irritação. Terá
de aceitar que nem sempre acertou no passado.
Dilma Rousseff
não poderá ser a mesma se sair ilesa da guerra. Nem o país será o mesmo
se ela tiver de deixar o comando. Os vencedores deverão demonstrar que
têm uma fórmula melhor e mais segura para estancar com urgência a
hemorragia da economia.
Terão de convencer o
país de que eles saberão distribuir melhor a riqueza e que são capazes
de oferecer um plus de realismo e de eficiência para gerenciar o Estado
sem arruiná-lo novamente.
Terão de demonstrar que contam com a força e a lealdade no Congresso que faltou a Dilma. Que têm claro o caminho para uma alternativa melhor.
Terão de demolir com fatos a acusação de que o que pretendiam era apenas afastar a presidenta para ocuparem seu lugar e continuar com as mesmas falcatruas e as mesmas ambiguidades.
Terão, em primeiro
lugar e acima de tudo, de conseguir pacificar a sociedade mostrando que
sabem governar para todos usando mais as armas do diálogo do que as da
guerra.
Os próximos meses, até que se conheça o resultado da bomba que Cunha
se empenhou em fazer explodir, serão decisivos para saber que país
emergirá desses escombros. Se melhor ou pior, mais unido ou mais
dilacerado, com maior ou menor esperança e entusiasmo.
Dizem que existe quem seja capaz de escrever certo por linhas tortas. Oxalá que, com qualquer resultado do impeachment, o Brasil
seja capaz de surpreender a si mesmo. Sem esquecer que é geralmente
melhor não o que mais cacareja que ama o país, mas o que melhor sabe
demonstrá-lo com fatos. E com menos desperdício de dinheiro público e de
palavras vazias.
A política precisaria
de mais silêncio e reflexão. De menos algazarra e menos brigas de galos.
De menos fariseus vociferantes e mais samaritanos dispostos a curar com
amor as feridas dos que sempre acabam esquecidos.
Todo o resto é apenas lixo.
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