Golpe: A Boca no Trombone
Carlos A. Lungarzo
Já
está na hora de o advogado defensor da presidente levar o problema
perante a OEA. A decisão do ministro do STF que se pronunciou ontem
contra o recurso da AGU era previsível. Porém, recorrer à justiça
internacional sem esgotar o processo dentro do país poderia ter parecido
indelicado. O brilhante ministro José Cardozo deu uma lição não só de
qualidade jurídica, mas também de refinamento social. Porém, tudo indica
que esta cortesia já foi suficiente. Ninguém acredita numa
miraculosa posição equânime do STF. Isso ficou óbvio até na conversa de
um ministro com o secretário geral da OEA.
Aliás,
Luis Leonardo Almagro Lemes declarou, com uma sinceridade impensável em
outros dignitários, que não ficou convencido pelas explicações dos
juízes nem dos senadores, sobre a existência de crime por parte da
presidente, e que ia a consultar com a CrIDH.
Então:
o primeiro passo que deve tomar a equipe de Dilma deve ser um recurso
formal à OEA, que deve entrar antes do 10 dias do golpe, de acordo com a
Resolução 1080. O golpe atingiu sua maturidade hoje, com a expulsão da
presidenta. Então, deveria ser apresentado antes de 22 de maio.
Quinze
organizações sociais, sindicais, políticas e humanitárias já
encaminharam um pedido à OEA para que se pronuncie oficialmente sobre o
golpe no Brasil. O documento deve estar chegando a Washington em dois ou três
dias. Mas esse documento (e outro que está sendo preparado com cerca de
cinquenta organizações) é um petitório. É a vez agora de uma ação
jurídica que deverá ser apresentada pela equipe de Dilma.
(Informarei mais sobre isto quando se produzam novidades)
O apoio da OEA deve ser solicitado sem perder tempo e, mesmo se for atendido, o recurso a ONU e outros organismos (UNASUL, MERCOSUL, etc.) é indispensável; um grande golpe não pode ser amortecido por uma única instituição.
Por
via da comparação, é importante lembrar que o golpe contra Fernando
Lugo no Paraguai (junho 2012) foi repudiado pela OEA. O processo foi
também um golpe legislativo, mas a diferença principal é que Lugo foi
acusado por fatos reais.
Mesmo
se esses fatos foram usados como pretexto, a verdade é que o
presidente, em seu caráter de chefe supremo de todas as forças de
segurança (Cuidado! Paraguai não é federal, e não tem polícias
estaduais!) no impediu o ataque da polícia a um grupo de Sem Terra em
maio de 2012, ficando, no total, 17 mortos.
Não
acredito que ninguém seja capaz de negar, em púbico, que a perda de
vidas humanas é mais grave que ficar seis meses em dívida com um banco.
Além disso, Lugo não foi suspenso antes
da expulsão, nem foi inabilitado para o futuro. De fato, oito meses
depois foi eleito senador, e nunca foi criticado pelas oligarquias como
acontece, de maneira incessante, com Dilma Rousseff. Ninguém dos que
apoiaram Lugo contra o golpe, poderá duvidar que o golpe no Brasil, que é
muitíssimo mais grave, deve ser resistido.
Esse é um dos motivos pelos quais devem envidar-se todos os esforços, no país e no exterior, para obter a anulação do impeachment antes dos seis meses de suspensão “temporária”.
No
mundo todo há 21 países que ainda mantêm o impeachment, mas apenas um
deles possui uma cláusula de suspensão temporária, a Romênia; mas é
apenas pelo tempo necessário para preparar um referendum. Por exemplo, o
presidente Traian Băsescu, foi suspenso em 19/04/2007, ficou vitorioso
no referendum nacional, e foi reconduzido em 19/05/2007.
É evidente que ninguém precisa de mais de um mês para julgar uma única pessoa, sobretudo quando o impeachment foi
cogitado há quase dois anos, e já em 2015 as cartas estavam
marcadíssimas. Quando a aliança entre narcos e crentes perdeu as
eleições de 2014 e entrou numa raivosa caçada (pedido de recontagem,
obstrução à diplomação, vandalismo), começou a falar-se de impeachment.
Ficou claro que já no início de 2015 a forca estava montada e só
faltavam figuras suficientes patológicas para escrever a denúncia.
A vigilância internacional
é necessária também, por uma razão mais profunda. A lei paleolítica
1079 está sendo interpretada das maneiras mais contraditórias e, apesar
do dito pela mídia, ninguém acredita que a imunidade da presidenta será mantida.
Em um, dois, três meses... será facílimo encontrar um pretexto para
prender Dilma, caso sua ação dentro do país possa incomodar os
golpistas. No Brasil, ninguém que se oponha às elites sabe quando sairá
de uma prisão, nem mesmo se sairá vivo.
Para
essa ocasião, se houver, precisam-se garantias de que qualquer agressão
contra militantes antigolpe será motivo de denúncia global. A formação de um tribunal internacional paralelo,
como propôs o senador Lindenberg (além dos tribunais internacionais
oficiais) é uma necessidade tanto do ponto de vista político como da
segurança humanitária.
Isto será objeto de uma análise próxima.
Lembremos
que o Brasil é recordista em Ocidente em massacres de populares, e as
personagens que agora participam do golpe têm sido autores, mandantes ou
cúmplices de El Dorado, Carandiru, Pinheirinho, Osasco e centenas de
outros crimes de lesa humanidade. Em vários fóruns internacionais já se
fala do papel absolutamente parcial da mídia brasileira para incitar ao golpe. Então, é preciso fazer uma detalhada descrição do acionar do golpismo informativo, e mostrar seu papel no golpe legislativo.
É importante fazer conhecer ao mundo que alguns senadores golpistas são suspeitos de estar comprometidos com o narcotráfico,
e que essas suspeitas são consideradas robustas por várias mídias
europeias, e, de maneira não ostensiva, até pela DEA. Nem aos EUA
conviria lidar com mais um narco-estado.
Nunca, na
história, desde a abolição da escravidão até a derrota (temporária) do
nazismo, foi conseguida qualquer conquista sem a colaboração
internacional. A América Latina, apesar de sua instabilidade e sua
insegurança, nunca foi, em sua história democrática, cenário de um fato
que mostrasse tanta miséria moral, política e social como este. Se você
conhecer outro, por favor, me informe!
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