quarta-feira, 23 de março de 2022

O "caçador de comunistas" na CNN.

 

Com Boris Casoy, a CNN ganha selo de propagadora de fake news

No quadro “Liberdade de Opinião”, Boris Casoy levanta o caso Celso Daniel e solta uma série de teorias conspiratórias incompatíveis com o jornalismo

No auge da campanha do impeachment, uma das formas de torpedear Dilma Rousseff eram as referências misóginas a supostas manifestações de ignorância de sua parte.

Podia-se criticar o governo Dilma. Mas eu a conhecia suficientemente – e alguns dos jornalistas críticos a ela – para saber da estrondosa diferença de nível de informação entre ela e seus críticos. Dilma é uma pessoa muitíssimo bem informada.

Mas o país viu-se exposto a um festival do que Amadeu Penzin, pelo Twitter, chamou de “burrice ostentação”, a inigualável capacidade do jornalista de dizer uma tolice aceita como observação inteligente pelo senso comum.

Ele se referia à ironia ignorante de Boris Casoy, na CNN, sobre a menção ao tema “estocar ventos” por Dilma. Foi elegantemente corrigido por sua contraparte no programa “Liberdade de Opinião”, advogado Bruno Salles, lembrando que se trata de uma tecnologia de ponta, para armazenamento de energia eólica.

Na época, no apogeu da campanha do impeachment, “estocar vento” se transformou no bordão principal da campanha contra Dilma. E, depois, uma entrevista que me deu, quando comentou e-mails em nuvens sendo utilizadas pela Lava Jato para mais uma de suas operações. Indagou: “que nuvem é essa?”, obviamente querendo dizer de que servidor saiu esse e-mail. 

O colunista Rui Castro caiu matando, como se Dilma não dominasse a informática.

Em sua coluna, caçoava do “estocar vento”, do e-mail em nuvem:

“Sua última façanha está na internet e é facilmente acessível basta digitar “Dilma” e “nuvem”. Ao saber outro dia que as acusações contra ela estão na “nuvem” — uma nova forma de armazenamento incorpóreo e universal de arquivos –, soltou os cachorros em entrevista a um canal de televisão.

“Pois bem”, rugiu. “Inventam uma história fantástica. Que tá na nuvem. É. Tá na nuvem. Sei lá que nuvem. Sabe, eu não entendi muito bem essa história de nuvem. Tô aqui tentando apurar direitinho. Como é que uma coisa pode estar na nuvem? É muito simples estar na nuvem, não tem de provar. Que nuvem? Onde está a prova?”

O próprio Ruy, aliás, levou anos até incorporar o computador em seu dia-a-dia.

Pouco depois, ele escreveu uma crônica, encantado com a expressão “freios e contrapesos”, a teoria da separação de poderes desenvolvida por Montesquieu. O filósofo morreu em 1755.

Mas, segundo Ruy

“Há uma nova expressão no ar: “sistema de freios e contrapesos”. Vem da física, mas tem sido usada nos EUA para definir um complexo de entraves dentro do governo americano que impedem que um presidente, por mais estabanado, possa tomar decisões desastrosas”.

Hoje em dia, não existe “burrice ostentação” mais significativa que a de Boris Casoy na CNN. Aliás, é incompreensível, em um momento em que se combatem as fakenews em redes sociais, que a CNN se preste a ser um canal de desinformação e disseminação de teorias conspiratórias.

Isso ocorre no quadro “Liberdade de Opinião”, tendo, no momento, de um lado Boris – supostamente representando a direita – e no outro Bruno Salles, representando à esquerda.

Ora, em outros tempos a direita foi representada por jovens advogados com opiniões polêmicas, mas fundamentadas. De repente, a CNN – que entrou prometendo um novo jornalismo – decidiu incorporar personagens folclóricos, sem informação nem compromisso com o jornalismo.

No seu comentário de hoje de manhã, Boris levantou novamente o caso Celso Daniel e soltou uma série de teorias conspiratórias tiradas diretamente dos subterrâneos dos aplicativos. 

  1. A morte de Celso Daniel teria sido crime político porque seria impossível abrir o carro por fora. Como se o carro dele fosse um tanque de guerra.
  2. Morreram várias pessoas ligadas diretamente ao caso.
  3. Haveria provas de que cubanos mataram o legista que fez a autópsia em Celso.

Pergunto: como é possível que, em nome do sensacionalismo, uma emissora que se pretende de jornalismo de alto nível, permita aberrações dessa natureza?

Em nenhum dos comentários, Boris avança uma informação relevante, uma análise mais sofisticada. Limita-se aos bordões de mesa de bar e às difamações recorrentes.

Em outro comentário afirmou que o PT roubava as companhias de ônibus do ABC para financiar campanha política. Aí entrou José Dirceu que passou a roubar em proveito próprio. Sem apresentar uma prova, um documento, uma evidência.

Ora, o bom jornalismo exige a diversidade de opinião. Mas uma das razões de ser do jornalismo é a apuração correta dos fatos. Ao permitir que seu canal se transforme em difusor de fakenews, a CNN Brasil passa a se igualar aos grupos de WhatsApp. E deprecia a boa equipe de jornalistas que reuniu e que, durante algum tempo, passou a esperança de que o jornalismo seria recuperado.

A morte de Celso Daniel foi crime político ou comum? Nesta Web Stories você encontra todas as informações que precisa saber sobre o caso

Nenhum comentário:

Postar um comentário