Por Fábio Jammal Makhul, na Revista do Brasil
Não é improvável um
espectador do telejornal noturno ter o sono perturbado com vozes
soturnas de apresentadores e analistas. Pelo que se vê e se ouve, não se
sabe o que aquele apresentador sério quer dizer com "boa noite".
Afinal, a economia do Brasil pode estar à beira da bancarrota. Tampouco
se perdoa o "bom dia" do apresentador da manhã, pois os jornais do dia
também trarão o apocalipse. Não é para menos.A preocupação com a
economia move o dia a dia das pessoas, inclusive as que dormem mais cedo
que os jornais noturnos. Ninguém passa um único e escasso dia sem fazer
contas. Foi entendendo a importância dessa ciência, nem sempre exata,
que o estrategista James Carville, do Partido Democrata, eternizou a
frase "é a economia, estúpido!"
Era
1992, e com esse aprendizado Bill Clinton superaria o favoritismo do
republicano George Bush, o pai, demonstrando sintonia com as angústias
cotidianas dos norte-americanos nesse quesito. Eis o segredo do homem
que faria história no Salão Oval da Casa Branca pelos próximos oito
anos: saber o que, com quem e por que estava falando.O noticiário
econômico cumpre vários objetivos. Um deles, saciar os humores do
mercado financeiro, servir de ponte para suscitar apostas nos cassinos
da especulação, detectar (ou criar) o clima do ambiente eleitoral, entre
outros, inclusive informar de vez em quando. Porém, pelo que algumas
pesquisas têm demonstrado, a opinião pública talvez não veja a economia
do Brasil como a veem os especialistas.
Pesquisas
do Datafolha apuram o índice de confiança do brasileiro em relação ao
país. Numa escala de 0 a 200, um levantamento feito no início de julho
revelou que a expectativa da situação econômica pessoal é de 160 pontos,
sendo um dos "aspectos para os quais os brasileiros demonstram um
sentimento positivo acima da média", no relato do instituto. Já a
expectativa da situação econômica do país¬ registrou 102 pontos em
julho, alta de 6 pontos na comparação com maio. Os eleitores brasileiros
também foram consultados sobre a situação econômica pessoal e 48%
esperam que ela vá melhorar nos próximos meses. Outros 38% acreditam que
ficará como está.
E
apenas 12%, que vai piorar. Pela pesquisa, pode-se constatar que há um
grande descompasso entre o sentimento positivo do brasileiro com relação
à economia e o cenário catastrófico divulgado pela mídia tradicional.
O
jornal ou o caixaO comerciante Mário Paixão da Silva, de 46 anos, tem
uma pequena loja de roupas no centro do Recife (PE) há mais de 20 anos. E
diz que basta conferir as vendas para saber se a economia está bem ou
não.
"Você
acha que vou acreditar no jornal ou no meu caixa?", brinca, ainda
comemorando as vendas que fez durante a Copa do Mundo. "A gente precisa
ser criativo e se reinventar a cada dia. Durante a Copa, por exemplo,
troquei as tradicionais roupas da vitrine por camisas da seleção ou por
peças que privilegiassem o verde e o amarelo. Vendi muito, não posso
reclamar. E, nos últimos meses, minhas vendas estão no mesmo patamar dos
anos anteriores", diz.Mesma opinião tem a auxiliar de serviços gerais
Vilma Silva de Lima, de 57 anos.
O
noticiário econômico não é algo que a perturbe, ou atraia. Moradora de
um bairro pobre de Camaragibe, região metropolitana do Recife, Vilma diz
que as principais preocupações são com a saúde pública e a segurança.
"Aliás, nas próximas eleições, vou prestar atenção no que os candidatos
vão dizer sobre esses problemas", afirma.Com a aproximação do pleito, a
mídia tradicional começa a definir candidatos que querem ajudar ou
atrapalhar.
E,
diferentemente de quase um quarto do eleitorado, parece não estar
indecisa, analisa o jornalista e sociólogo Venício Artur de Lima,
professor titular de Ciência Política e Comunicação da Universidade de
Brasília (UnB). Ele analisa o comportamento midiático em eleições há
três décadas e tem vários livros sobre o tema.Lima avalia que a profusão
de informações parciais para privilegiar uns e prejudicar outros dá o
tom. "Seguem a mesma conduta das eleições passadas, talvez de forma
ainda mais exacerbada."O pesquisador pondera, porém, que o Brasil mudou e
o eleitor está mais capacitado e dispõe de meios diversos de informação
para decidir o voto.
"Tenho
uma visão diferente da que tinha quando comecei a estudar eleições, nos
anos 80. As pessoas buscam muito mais informação fora do esquema da
grande mídia. É claro que a TV aberta continua sendo a principal fonte
de informação, mas as fontes alternativas têm peso muito grande desde
2006", avalia. Isso não significa, observa Lima, que a mídia
convencional não seja importante para influenciar comportamentos em
longo prazo.
"A
percepção das pessoas sobre corrupção e a estigmatização dos partidos
ainda é influenciada pela mídia, mas no comportamento eleitoral em si, o
peso do que é publicado nos principais jornais, na TV e no rádio
diminuiu, graças a meios que antes não existiam", comenta.Pessimismo
militanteUsar o jornalismo econômico para fazer política no Brasil é uma
estratégia que tem sido bastante criticada por Luis Nassif, jornalista
econômico com 45 anos de experiência e organizador do portal GGN.
Para
ele, há muitas críticas à condução da política econômica do governo
federal e vulnerabilidades que precisam ser enfrentadas - especialmente o
desequilíbrio nas contas externas do país. "Mas nada que, nem de longe,
se pareça com o quadro pintado nos grandes veículos. Aumentos de meio
ponto percentual ao ano nos índices inflacionários são tratados como
prenúncio de hiperinflação; acomodamento das vendas do varejo, em níveis
elevados, como prenúncio de recessão", comenta.
O
que ele chama de "pessimismo militante" compromete a crítica necessária
sobre os pontos efetivamente vulneráveis da política econômica e do
processo de desenvolvimento do Brasil. "Há uma guerra política
inaugurada em 2005, que sacrifica a notícia no altar das disputas
partidárias. É evidente que há muito a melhorar no ambiente e na
política econômica, mas quem está em crise exposta, hoje em dia, é certo
tipo de jornalismo que acabou subordinando os fatos a disputas
menores."
O
fotógrafo Alexandre Lombardi, de 38 anos, não gosta de generalizar uma
má conduta da mídia. Ele não duvida que todo veículo favoreça um lado e
prejudique outro. Lê os jornais tradicionais, procura na internet por
blogs, fóruns de discussão e mídias sociais com pensamentos diferentes,
mas desconfia à esquerda e à direita, e procura consistência:"Gosto da
pluralidade de pensamentos", conta Alexandre, que mora em Sorocaba,
interior paulista. "A internet deixou tudo muito fácil.
É
possível comparar versões. Analiso, converso com os amigos e formo a
minha própria opinião. Não tiro conclusões baseadas em uma única fonte",
explica. Ele ainda não definiu candidatos para a próxima eleição, mas
levará em conta as¬ propostas, inclusive para a economia.Transmitir
confiança, credibilidade e consistência, com propostas claras, será o
melhor meio de ganhar o voto do eleitor em outubro.
Quem
afirma é o publicitário Renato Meirelles, sócio-diretor do instituto
Data Popular - empresa de pesquisa especializada no conhecimento das
classes C e D, onde se concentra a maioria dos brasileiros.
"O
que vai decidir o voto é a capacidade das candidaturas de entender os
problemas reais que o eleitor enfrenta e de oferecer perspectivas de
futuro", observa.Para Meirelles, será, antes de tudo, uma eleição sobre o
futuro e não de legado. "Os eleitores estão mais preocupados em saber o
que vai levar o Brasil adiante e não o que trouxe o país até aqui. Isso
-coloca a discussão em outro patamar. Os candidatos devem fazer uma
campanha muito mais propositiva em vez de ficar falando do passado",
explica.
A
queda na credibilidade da mídia, as novas tecnologias da informação e a
recente ascensão social no Brasil criaram um novo formador de opinião
que terá peso nestas eleições. Trata-se do jovem da classe C. "Esses
jovens estudaram mais que os pais, estão mais conectados, contribuem
mais com a renda familiar do que o jovem da elite. Ele é provedor de
conteúdo em casa e sua opinião vai ajudar a definir o voto da família",
afirma Meirelles.
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