A candidata da Bolsa de Valores
Na terça-feira (26/8), enquanto os cidadãos comuns esperavam a
divulgação oficial da mais recente pesquisa de intenção de voto do
Ibope, operadores do mercado financeiro faziam dinheiro e integrantes
dos comitês de campanha corriam para fazer ajustes no ensaio para o
primeiro debate na TV dos candidatos à Presidência da República.
A imprensa registra que as especulações sobre uma mudança drástica no
cenário eleitoral fizeram a Bolsa de Valores fechar o pregão de
segunda-feira perto dos 60 mil pontos, o nível mais alto desde 2013. O
motor do mercado de ações foi novamente a Petrobras, cujos papéis
tiveram uma valorização de 5%, por conta do boato de que a candidata do
PSB, Marina Silva, apareceria em segundo lugar na pesquisa, o que
aumentaria as chances de haver um segundo turno.
Como os investidores acreditam piamente que a empresa nacional de
petróleo vai produzir mais lucro com um governo amigo daqueles que vivem
de renda, a possibilidade de uma derrota da atual presidente anima o
pregão. Então, o leitor crítico, que costuma olhar o prazo de validade
de tudo que compra, se pergunta: “Mas não é Marina Silva que está
crescendo? E ela não seria mais indigesta para os defensores do livre
mercado, ao contrário de Aécio Neves?”
Pois então: o mercado está convencido de que uma eventual presidente
Marina Silva não seria a mesma Marina Silva que construiu sua carreira
no movimento ambientalista e que, isolada num partido que é o contrário
de suas pregações, seria facilmente engolida pelo sistema que pretende
transformar. Essa avaliação vem sendo divulgada intensamente por
corretoras e até gerentes de bancos, com base em declarações da
economista-chefe da consultoria Rosenberg Associados, Thaís Zara (ver aqui).
Para o mercado, segundo essa análise, Aécio e Marina são igualmente
confiáveis. A presença na chapa do PSB do deputado gaúcho Beto
Albuquerque, como candidato a vice-presidente, é vista como uma garantia
de que Marina não apenas será domesticada pelo mercado, como ficará
mais vulnerável à ação do lobby de empresas que atualmente abomina, como as gigantes do setor de agrotóxicos e a indústria de cigarros.
Dormindo com o inimigo
Beto Albuquerque não é apenas simpatizante desses setores: sua carreira
tem sido financiada por produtores de fumo e pela Monsanto,
multinacional que é o avesso de tudo que Marina Silva representa. Além
isso, ele é um dos articuladores de projetos que pretendem transferir
para o Congresso Nacional e as Assembleias Legislativas dos estados a
prerrogativa de delimitar as terras indígenas, assunto que interessa ao
agronegócio mais predador.
Com seu feroz pragmatismo, o mercado considera que a candidata não tem
força política – nem saúde – para enfrentar um embate com essas
potências. Por outro lado, o leitor e a leitora que não compram gato por
lebre devem ficar curiosos com o fato de o candidato do PSDB, Aécio
Neves, não parecer nem um pouco preocupado com o tsunami de votos que
Marina Silva está levantando. Para o candidato do PSDB, Marina é uma
onda que passa “em 15 ou 20 dias”, e suas propostas não resistem às
contradições que assume ao herdar a candidatura de Eduardo Campos.
Análises disponíveis sobre o eleitorado de Marina Silva, baseadas em
dados da pesquisa Datafolha feita dois dias depois da morte do
ex-governador de Pernambuco, dão conta de que ela capitalizou o desejo
de mudança que se manifestava desde os protestos iniciados em junho do
ano passado. Assim, ela seria a escolha dos mais jovens e daqueles que,
descontentes com o atual governo, também descartam a polarização com o
PSDB.
Marina tem um problema: se acena para o mercado, desagrada os
eleitores; se reafirma seus princípios, espanta o mercado e perde apoio
na imprensa.
A pesquisa Ibope que será divulgada na tarde de terça-feira (26)
registra o pico da “onda” Marina. O debate na TV Bandeirantes, que se
realiza em seguida, vai refletir esse quadro.
O problema, para Aécio Neves, será administrar o dano que o crescimento
da ex-ministra vai causar em seus indicadores neste primeiro movimento.
Para a presidente Dilma Rousseff, trata-se de ficar onde está e esperar
o refluxo das águas.
A campanha pra valer começa exatamente nesse ponto.
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