José Antonio Lima
Da Carta Capital
Charge publicada em 16 de maio de 2010 no blog Trágico e Cômico. Partidos mais fortes do sistema, PT e PSDB são vistos por muitos eleitores como iguais
A pesquisa Datafolha divulgada na segunda-feira 18 trouxe uma série de novidades com a inclusão da provável candidatura de Marina Silva (PSB) entre os postulantes ao Palácio do Planalto. Uma das principais é a volta à disputa de uma parte importante do eleitorado, os desencantados que seguiam indecisos ou cogitavam anular o voto. São brasileiros para os quais os políticos parecem ser motivo de receio e os partidos, indistinguíveis em sua precariedade ideológica.
Este não é um grupo pequeno de eleitores. Chegava a 27% com Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) como principais candidatos, mas cai para 17% com a entrada de Marina no páreo. A diferença de dez pontos migra para o colo da ex-senadora com a simples menção a seu nome, mas a campanha começa nesta terça-feira 19. E o eleitor vai se deparar com uma Marina Silva enrolada na aliança de sua Rede Sustentabilidade com o PSB, onde está abrigada, lutando para não alienar esses eleitores.
A missão de cultivar este grupo, cuja existência ficou escancarada na explosão das manifestações de junho de 2013, não será simples. Os protestos ficaram para trás, mas os motivos que levaram milhões às ruas continuam presentes, como mostra o livro Trágico e Cômico (Primavera Editorial, 69 pág.), coletânea de cinco anos do trabalho do chargista Diogo Salles no falecido Jornal da Tarde e no blog que levava o nome do livro.
O trabalho de Salles dialoga com o sentimento que eclodiu nas ruas em 2013 e segue presente nas pesquisas de opinião. O chargista dedica bastante espaço aos erros comuns de PT e PSDB, bem como a seus aliados, como o senador José Sarney (PMDB-AP) e o deputado federal Paulo Maluf (PP-SP), um dos alvos preferidos do chargista. Há também muitos retratos tragicômicos sobre inúmeros casos de corrupção dos últimos anos, que fizeram do Brasil, segundo Salles, uma “valetudocracia” e, de Brasília, uma “cargolândia”.
Salles critica sem pudores tanto petistas quanto tucanos e relembra no posfácio da obra as ofensas que sofria por conta de seu trabalho. Basicamente, era chamado de "golpista" por governistas e de "comunista" por opositores, um drama comum a qualquer integrante da imprensa brasileira nos tempos atuais. O trabalho do chargista, como o dos jornalistas e dos jornais, precisa ser visto de forma global, entretanto. Essas críticas extremadas, ervas daninhas da internet, são também alvo do trabalho de Salles, que dedica algumas charges aos apoiadores radicais de PT e PSDB na imprensa e no submundo da internet. Do ponto de vista de uma análise em conjunto, é fácil ver que o alvo de Salles não é este ou aquele partido, mas o sistema como um todo.
O trabalho de Salles é, assim, retrato do tempo em que está inserido. Trata-se de um período no qual PT e PSDB polarizaram a política brasileira, e passaram a sofrer do mesmo mal dos partidos de centro-esquerda e centro-direita da Europa: uma aproximação ideológica no centro do espectro político que torna difícil a distinção entre eles. E que, lamentavelmente, acaba abrindo espaço para uma espécie de autoritarismo anti-política que faz mal à sociedade como um todo.
O agravante no cenário brasileiro é que este centro é povoado por partidos fisiológicos sem os quais, aparentemente, é impossível governar. Em 2010, Marina Silva fez campanha com o mote de “governar com os melhores”. Em 2014, Campos seguia na mesma linha, até sua trágica morte. Marina pegará o fio da meada, mas precisará mostrar aos desencantados que, apesar de estar no PSB, um partido de firmes alianças com o PSDB e o PT, é o algo “diferente” esperado por eles, e não mais do mesmo.
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