domingo, 24 de agosto de 2014

MÍDIA - Globo atirou no "basso"?

Paulo Roberto Costa: Globo atirou no “basso”?

Autor: Miguel do Rosário
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Dias atrás, Carlos Alberto Sardenberg, um dos âncoras mais fiéis da Globo, publicou artigo no jornal tentando justificar um recente (e alarmante) sinal de incompetência da empresa. A Globo foi uma das últimas mídias a confirmar a morte de Eduardo Campos. Me pareceu um recado indireto ao Brasil 247, que se vangloriou de ter sido o primeiro veículo a dar o “furo”.
Segundo ele, a Globo não “atira no basso”. Sardenberg tenta provar que a Globo é séria e por isso não publica nenhuma notícia cuja autenticidade não tenha sido intensamente checada antes. O colunista narra um “causo” antigo, de uma notícia escrita com grafia errada (fulano recebeu tiro no “basso”; o certo é “baço”) que havia sido publicada e republicada por vários jornais.
Pois é. A notícia sobre a “delação premiada” de Paulo Roberto Costa está me cheirando exatamente a um “tiro no basso”.
Na sexta-feira, o jornal tascou um manchetão cheio de certeza.
“Ex-diretor da Petrobrás aceita delação premiada”.
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Notícia bombástica, não? Naturalmente, foi republicada em centenas de sites na internet.
Eu já escrevi sobre isso ontem, dizendo que a notícia tinha cheiro de factóide, visto que, poucas horas depois de ser publicada, a nova advogada de Costa, Beatriz Catta Preta aparece na mídia negando peremptoriamente qualquer decisão de Costa a respeito. PF e Ministério Público também negaram qualquer acordo.
Ué, então temos aqui uma contradição. Os jornais asseveram que Costa aceitou fazer delação premiada, o advogado Nélio Costa inclusive teria abandonado o caso por discordar da estratégia, e depois a advogada nega que haja qualquer decisão a respeito?
Afinal, ele vai delatar ou não?
Pois bem, abro os jornais hoje, à procura de atualização sobre o assunto, curioso como cidadão e blogueiro.
Na Folha e no Estadão, nada. No Globo, há uma notícia na página 11 dizendo que “Delação premiada de Costa deixa base de Dilma aflita”, mas sem entrar no mérito principal da notícia, ou seja, se Costa realmente fará um acordo de delação premiada.
Ainda na página 11, sem destaque, outra notícia sobre o caso. O título é “Advogada diz que ex-diretor vive momento difícil”.
Tadinho.
Vamos ler a notícia, e descobrimos, escondida no meio da matéria, a informação que buscávamos:
“Na última sexta-feira, ela teve um encontro de aproximadamente 30 minutos com seu cliente, mas nega que já tenha iniciado tratativas sobre delação com o Ministério Público Federal (MPF), primeiro passo de uma eventual opção pelo recurso. Segundo ela, ainda caberá ao seu cliente “bater o martelo” pela delação.
- Ele ainda não está decidido. Esta é uma escolha muito pessoal, muito subjetiva.”
Ué, o jornal não havia asseverado que ele o faria, com certeza, na segunda-feira? A certeza não era tanta que se usou uma manchete garrafal na primeira página? Agora o mesmo jornal, na maior cara de pau, diz que Costa “ainda não está decidido”?
A notícia cheira a um tiro no escuro. Se Costa realmente decidir fazer a delação premiada, beleza, está tudo bem. Se não, esquece e muda de assunto. Para que se importar com detalhes insignificantes, não é? O leitor não irá se lembrar. Logo veremos, porém, que a “não-notícia” serve a um propósito político e eleitoral.
Na capa do site da Globo, por exemplo, aparece a Dilma, associada aos “escândalos da Petrobrás”, com o subtítulo: “Presidenta (…) não comenta sobre Paulo Roberto Costa fazer delação premiada”.
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Como é que é? A troco de quê ela falaria de uma coisa que ainda não existe? Não se sabe se ele vai falar ou não, não se sabe o que vai falar, não se sabe se vai falar alguma coisa de consistente. Enfim, qual o sentido em cobrar um comentário de Dilma a esse respeito? É como noticiar que Dilma não comentou nada sobre Zé da Silva se separar de sua esposa, omitindo os seguintes fatos: 1) Zé da Silva ainda não tomou nenhuma decisão; 2) Zé da Silva não é casado; 3) Dilma não conhece nenhum Zé da Silva; 4) Zé da Silva não existe.
Isso é jornalismo?
Ao final de seu artigo, Sardenberg, no afã de agradar seus patrões, encerra com uma frase gloriosa:
“Tudo isso para dizer que aqui no sistema Globo a gente não atira no basso de ninguém, não faz nada escondido e, sobretudo, não usa anônimos para mexer no perfil dos outros.”
Pausa para rir durante algumas semanas.
A Globo vive publicando denúncias não-confirmadas. A história de Costa é apenas o exemplo mais recente. A certeza sobre um fato não parece ter mais tanta importância para o jornalismo da Globo. Basso ou baço, tanto faz, o importante é dar o tiro.
Quanto a “não fazer nada escondido”, bem, a sonegação fiscal flagrada pela Receita foi uma ação bem escondida, não? E continua escondida até hoje. Tanto é que os jornais do grupo nunca informaram seus leitores sobre a estrepolia da empresa nas Ilhas Virgens Britânicas.
Resta saber se a Globo “usa anônimos para mexer no pefil dos outros”. Pois bem, Sardenberg errou de novo. Bastou-me uma pesquisa rápida para descobrir que um dos IPs da TV Globo, o 200.208.25.68, andou remexendo e corrigindo centenas de páginas da Wikipédia.
O IP da TV Globo mexeu no perfil dos jornalistas Fernando Morais e Fausto Wolff. E fez acréscimos e correções nos perfis de inúmeros artistas, inclusive não-globais, como Renato Russo. Zico, Rui Castro, Fernando Meirelles, Tim Maia, etc, também tiveram seus perfis no Wikipédia modificados por alguém usando o IP da TV Globo.
A alteração mais interessante é a tentativa de minimizar críticas presentes na página do Beyound Citizen Kane (Muito além do Cidadão Kane), um importante documentário da BBC, a TV pública do Reino Unido, que conta a história de Roberto Marinho e suas alianças com a ditadura.
Sardenberg, Sardenberg. O “basso” da Globo está cheio de tiros.

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