quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

SAÚDE PÚBLICA - Por que não?

 
Colunista José Augusto Ribeiro
                     
                                   
                 
Na reunião de governadores em Brasília na virada do ano, para discutir a crise econômica, o Governador de São Paulo, Geraldo Alkmin, falando sobre a situação catastrófica da saúde pública nos Estados, perguntou diante das câmeras:  por que os governos estaduais não podem, só o governo federal pode, cobrar dos planos de saúde o atendimento, em hospitais públicos estaduais, a clientes desses planos? 
No Rio, onde a situação é mais grave, a crise é atribuída à queda dos preços do petróleo, que reduziu drasticamente os royalties pagos ao Estado, mas com certeza resulta, igualmente e  em grande medida, da recessão imposta pelo modelo de ajuste fiscal adotado pelo governo federal, sem falar nos fatores incompetência e corrupção. De qualquer maneira, a cobrança aos planos de saúde viria em boa hora.
Mas o governo federal não permite que os Estados cobrem e ele próprio não cobra, com medo, segundo se diz, de que os planos cumpram  a ameaça de aumentar seus preços. São, a esta altura, bilhões e bilhões, que poderiam cobrir parte dos cortes do ajuste fiscal. Os planos impõem a chantagem dos preços e o governo fica inerme, como se não houvesse alternativa. 
Há mais de meio século, em situação muito pior, o mundo aprendeu que, quando não existe alternativa, é preciso inventar alguma e, em seguida, multiplicá-la. Foi na crise dos mísseis em Cuba, em 1962, no momento talvez o mais perigoso da Guerra Fria. Nikita Kruschev, que governava a União Soviética, forneceu a Cuba uma bateria de foguetes de alcance intercontinental, com ogivas armadas de bombas atômicas, formalmente para defesa da ilha, mas capazes de atingir qualquer ponto do território dos Estados Unidos – até, se já existissem, as Torres Gêmeas do World Trade Center em Nova York.
Os americanos descobriram e fotografaram. E exigiram a retirada dos mísseis. Os soviéticos disseram não e num instante estávamos na iminência da Terceira Guerra Mundial, com a linha dura civil e militar dos dois lados doida para o confronto. Não parecia haver alternativa quando o Secretário da Defesa dos Estados Unidos, Robert McNamara, sugeriu ao Presidente Kennedy que não desistissem, que se empenhassem em inventar e multiplicar alternativas. 
  McNamara era um plutocrata e vinha da presidência da General Motors, mas depois se viu, quando bem mais tarde foi Presidente do Banco Mundial, que era um homem muito mais esclarecido que os moldados na linha de produção de empresas como a GM. O exercício proposto por McNamara, multiplicar as alternativas, acabou dando certo, porque Kruschev, de certo modo, topou  jogar o mesmo jogo e, como Kennedy, conseguiu segurar os brucutus de sua linha dura. A crise foi solucionada pacificamente,  Kruschev retirou os mísseis de Cuba e Kennedy, em troca, retirou os que os Estados Unidos mantinham na Turquia, a curta distância do território soviético. Nosso pequeno planeta escapava mais uma vez da Terceira Guerra Mundial, que poderia extinguir a vida humana de sua  face. 
O modelo econômico sob o qual vivemos desde o arrastão neoliberal conseguiu colocar em desuso esse exercício de multiplicar as alternativas. Hoje, como no caso do ajuste fiscal brasileiro, o que mais se ouve é que não há alternativa. Nem se pergunta por que não tentar a alternativa de outro modelo de ajuste fiscal,  e muito menos por que não pensar num ajuste fiscal pelo aumento das receitas e pelo crescimento da economia.
Nesta segunda hipótese a resposta continua a ser que não há alternativa porque o governo já tentou reativar a economia e não conseguiu. Só que não se faz a pergunta: por que não conseguiu? Talvez porque o governo tentou o crescimento apelas pelo caminho do consumo – o tal “voo da galinha” - e não  do investimento. 
Também não se faz a pergunta feita outro dia pelo ex-Ministro Delfim Neto, entrevistado por Luís Nassif num canal de audiência insignificante, como a ex-Tv-Educativa, hoje Tv-Brasil: por que o Brasil  não cobra imposto sobre os dividendos pagos a acionistas de sociedades anônimas? Delfim faria a mesma pergunta se entrevistado nos canais de grande audiência e talvez já não o ouçam com a frequência anterior porque, ao lado dessa pergunta, ele encaixou uma afirmação incômoda: a de que é insustentável este modelo econômico que permite ao setor financeiro dominar o conjunto da economia e sufocar o setor produtivo.
Se voltarmos a perguntar mais - por que isso? por que aquilo? por que não? - começaremos a descobrir e multiplicar alternativas. Mas, voltando à pergunta do Governador Alkmin: por que o governo não pensa em criar, numa joint venture do Banco do Brasil e da Caixa Econômica, talvez com o concurso daquele braço do BNDES chamado BNDESpar, de participações acionárias, um plano de saúde alternativo que concorra, em igualdade de condições, sem qualquer privilégio, com os planos  privados? No mínimo isso lhes baixaria a crista e reduziria a arrogância e os abusos deles, que são recordistas de reclamações em todos os Procons. E o governo teria condições de cobrar o que hoje não cobra.
Fonte: AEPET

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