Na reunião de governadores em
Brasília na virada do ano, para discutir a crise econômica, o Governador
de São Paulo, Geraldo Alkmin, falando sobre a situação catastrófica da
saúde pública nos Estados, perguntou diante das câmeras: por que os
governos estaduais não podem, só o governo federal pode, cobrar dos
planos de saúde o atendimento, em hospitais públicos estaduais, a
clientes desses planos?
No Rio, onde a situação é mais grave, a
crise é atribuída à queda dos preços do petróleo, que reduziu
drasticamente os royalties pagos ao Estado, mas com certeza resulta,
igualmente e em grande medida, da recessão imposta pelo modelo de
ajuste fiscal adotado pelo governo federal, sem falar nos fatores
incompetência e corrupção. De qualquer maneira, a cobrança aos planos de
saúde viria em boa hora.
Mas o governo federal não permite que
os Estados cobrem e ele próprio não cobra, com medo, segundo se diz, de
que os planos cumpram a ameaça de aumentar seus preços. São, a esta
altura, bilhões e bilhões, que poderiam cobrir parte dos cortes do
ajuste fiscal. Os planos impõem a chantagem dos preços e o governo fica
inerme, como se não houvesse alternativa.
Há mais de meio século, em situação
muito pior, o mundo aprendeu que, quando não existe alternativa, é
preciso inventar alguma e, em seguida, multiplicá-la. Foi na crise dos
mísseis em Cuba, em 1962, no momento talvez o mais perigoso da Guerra
Fria. Nikita Kruschev, que governava a União Soviética, forneceu a Cuba
uma bateria de foguetes de alcance intercontinental, com ogivas armadas
de bombas atômicas, formalmente para defesa da ilha, mas capazes de
atingir qualquer ponto do território dos Estados Unidos – até, se já
existissem, as Torres Gêmeas do World Trade Center em Nova York.
Os americanos descobriram e
fotografaram. E exigiram a retirada dos mísseis. Os soviéticos disseram
não e num instante estávamos na iminência da Terceira Guerra Mundial,
com a linha dura civil e militar dos dois lados doida para o confronto.
Não parecia haver alternativa quando o Secretário da Defesa dos Estados
Unidos, Robert McNamara, sugeriu ao Presidente Kennedy que não
desistissem, que se empenhassem em inventar e multiplicar alternativas.
McNamara era um plutocrata e vinha da
presidência da General Motors, mas depois se viu, quando bem mais tarde
foi Presidente do Banco Mundial, que era um homem muito mais esclarecido
que os moldados na linha de produção de empresas como a GM. O exercício
proposto por McNamara, multiplicar as alternativas, acabou dando certo,
porque Kruschev, de certo modo, topou jogar o mesmo jogo e, como
Kennedy, conseguiu segurar os brucutus de sua linha dura. A crise foi
solucionada pacificamente, Kruschev retirou os mísseis de Cuba e
Kennedy, em troca, retirou os que os Estados Unidos mantinham na
Turquia, a curta distância do território soviético. Nosso pequeno
planeta escapava mais uma vez da Terceira Guerra Mundial, que poderia
extinguir a vida humana de sua face.
O modelo econômico sob o qual vivemos
desde o arrastão neoliberal conseguiu colocar em desuso esse exercício
de multiplicar as alternativas. Hoje, como no caso do ajuste fiscal
brasileiro, o que mais se ouve é que não há alternativa. Nem se pergunta
por que não tentar a alternativa de outro modelo de ajuste fiscal, e
muito menos por que não pensar num ajuste fiscal pelo aumento das
receitas e pelo crescimento da economia.
Nesta segunda hipótese a resposta
continua a ser que não há alternativa porque o governo já tentou
reativar a economia e não conseguiu. Só que não se faz a pergunta: por
que não conseguiu? Talvez porque o governo tentou o crescimento apelas
pelo caminho do consumo – o tal “voo da galinha” - e não do
investimento.
Também não se faz a pergunta feita
outro dia pelo ex-Ministro Delfim Neto, entrevistado por Luís Nassif num
canal de audiência insignificante, como a ex-Tv-Educativa, hoje
Tv-Brasil: por que o Brasil não cobra imposto sobre os dividendos pagos
a acionistas de sociedades anônimas? Delfim faria a mesma pergunta se
entrevistado nos canais de grande audiência e talvez já não o ouçam com a
frequência anterior porque, ao lado dessa pergunta, ele encaixou uma
afirmação incômoda: a de que é insustentável este modelo econômico que
permite ao setor financeiro dominar o conjunto da economia e sufocar o
setor produtivo.
Se voltarmos a perguntar mais - por que
isso? por que aquilo? por que não? - começaremos a descobrir e
multiplicar alternativas. Mas, voltando à pergunta do Governador Alkmin:
por que o governo não pensa em criar, numa joint venture do Banco do
Brasil e da Caixa Econômica, talvez com o concurso daquele braço do
BNDES chamado BNDESpar, de participações acionárias, um plano de saúde
alternativo que concorra, em igualdade de condições, sem qualquer
privilégio, com os planos privados? No mínimo isso lhes baixaria a
crista e reduziria a arrogância e os abusos deles, que são recordistas
de reclamações em todos os Procons. E o governo teria condições de
cobrar o que hoje não cobra.
Fonte: AEPET
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