segunda-feira, 6 de outubro de 2008

ARTIGO - O fim salutar do aventureirismo americano.

O FIM SALUTAR DO AVENTUREIRISMO AMERICANO

Quantas delegações de bancos de negócios recorreram, nestes últimos meses, aos fundos soberanos? Todas pediam dinheiro vivo para zerar suas contas. Muitas aparentavam uma surpreendente segurança. A rodada seria quase uma brincadeira, avaliavam eles.

Sua falta de discernimento seria tanta que eles se deixaram cegar pela arrogância? Crêem eles que os países da Península Arábica têm vocação para oferecer-lhes dinheiro indefinidamente para que eles, imediatamente, o queime? O que eles conhecem do mundo a não ser equações matemáticas mal aplicadas e cenários fantásticos? Logo, desiludidos, eles saem desiludidos. Abatida, a elite dos negócios não consegue fazer uso do bom senso!

A seqüência é conhecida. Os bancos se debilitam e as bolsas entram em colapso. Em regime de urgência, o governo americano se prepara para injetar liquidez no mercado. Porém, o processo não é viável a menos que ocorra uma contribuição maciça de capitais vindos do exterior. Abre-se, então, uma outra frente: qual será a atitude dos atores estrangeiros? Soa o sinal de alarme! No âmbito do seu programa de financiamento complementar destinado a socorrer a Reserva Federal, o FED, o tesouro americano, acelera a emissão de bônus do Tesouro. Quem serão os compradores? Sendo um país devedor, a assinatura dos Estados Unidos é inquestionável? `Vocês dispõem de grande liquidez - martelam os americanos - comprem à vontade nossos títulos e o crescimento mundial se tornará mais bonito!` Que dizer do déficit da balança de pagamentos? Que dizer do agravamento da situação das contas internas? Que dizer da capitalização insuficiente do sistema financeiro? `Tudo isto é provisório, afirmam eles, a economia americana é a mais invejada do mundo!`

O `VALOR DA CONFIANÇA`

Todavia, ao mesmo tempo, a Merrill Lynch aconselha seus clientes a venderem seus dólares em virtude do aumento previsível das despesas orçamentárias. Ao mesmo tempo, o prêmio dos seguros contra uma eventual falta de pagamento pelos frágeis Estados Unidos atinge níveis inconcebíveis, quase o triplo do da Alemanha. Pedem-nos para ajudar a economia americana enquanto que seus próprios financistas pensam de maneira inversa? A assinatura dos Estados Unidos vale mais que um blefe no jogo de pôquer! Fazer a comunidade internacional suportar a deterioração da sua economia não é a melhor alternativa. O `valor da confiança` não é uma arte abstrata e nunca pode ser inexpressivo. Ele descansa sobre fundamentos sadios, a cada dia reavaliados. Pressupõe uma justa avaliação dos ativos. Baseia-se em alguma coisa como a gestão de um bom chefe-de-família: viver de acordo com os seus meios!

Quando não se leva em conta estas questões, alguma resistência, na certa, vai surgir, como uma maior pressão sobre a auditagem da dívida soberana dos Estados Unidos ou uma pressão sobre o ouro. E se, por acaso, amanhã ou depois a fatura energética não puder mais ser honrada em dólares, o que ocorrerá com os Estados Unidos?

Não desejamos, de modo algum, abandonar os Estados Unidos no meio da borrasca. Mas cabe a eles e aos seus aliados de infortúnio assumir, até o fim, as conseqüências de uma desregulamentação que eles jamais ousaram contestar. Não existe outro antídoto para os americanos senão aprender a viver de outra forma e não mais às custas do mundo inteiro. Certamente a pílula será amarga, a reorganização será dolorosa, a riqueza irá encolher e o produto interno bruto (PIB) recuará. Este é o preço a ser pago para que se recupere a confiança e para que a economia americana retome seu fôlego.

Os Estados Unidos não devem temer esta perspectiva. Não se deve, de modo algum, falar de recessão - como alguns já se apressam em brincar com seus próprios medos - mas de reajustamento de uma economia à sua situação real. Encerrado seu papel dominante, terminado o aventureirismo, vale falar de um rejuvenescimento e da integração da economia americana à economia mundial e não o inverso. Os Estados Unidos são um país como qualquer outro e não uma terra de exceção!

Mnahi Al-Masoud é estudante saudita na Escola Politécnica, Paris.

Tradução de Argemiro Pertence

Publicado originalmente: LE MONDE

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