A fase crucial do processo do mensalão
Se houve alguma posição heterodoxa no STF, foi a do ministro Ricardo Lewandowski.
Ao rejeitar a maioria dos embargos declaratórios, o Supremo
Tribunal Federal decidiu de forma técnica. Resta saber qual será a
interpretação que o STF dará sobre o cabimento dos embargos
infringentes, que permitiriam a reavaliação das condenações, que
contaram com 4 votos, ao menos, favoráveis ao condenado.
Na quinta-feira, o STF encerrou o julgamento dos embargos
declaratórios dos réus da ação penal 470, o processo do mensalão,
rejeitando a maioria dos recursos. A decisão do Tribunal foi
tecnicamente correta. Esses embargos existem com o fim de esclarecer a
decisão judicial. O recurso não se presta a uma reavaliação da decisão.
Se houve alguma posição heterodoxa, foi a do ministro
Ricardo Lewandowski, que a todo tempo se valeu de expressões vagas para
decidir de modo inovador. Isso ficou evidente na questão das penas, em
que ele se valia de argumentos que nada tinham a ver com eventual
esclarecimento do acórdão. O que impressiona na posição de Lewandowski é
que seus votos se baseiam, frequentemente, em argumentos sobre a
excepcionalidade do caso.
Ele insiste que as penas foram excessivas. “Houve
desproporção inaceitável”, bradou. Todavia, em razão da gravidade
excepcional dos crimes pelos quais foram condenados os réus, as penas
não foram muito altas. Uma corrupção passiva praticada pelo então
presidente da Câmara dos Deputados deve ter uma pena bem mais rigorosa
que a cometida por vereador de uma pequena cidade. As penas previstas em
lei são variáveis, exatamente, para que se permita fixá-la de acordo
com a gravidade do caso concreto.
De qualquer modo, essa análise não é possível nos embargos
declaratórios. A posição de Lewandowski, de dar maior amplitude ao
recurso, beira o tratamento privilegiado. Se os embargos declaratórios,
para qualquer mortal, só servem para esclarecer a sentença, por que
razão para os réus do mensalão o recurso deveria ser mais amplo?
Superada essa fase, o Supremo irá enfrentar uma questão
polêmica sobre o cabimento dos embargos infringentes contra a decisão
condenatória, em que o réu conte com, no mínimo, 4 votos favoráveis. A
decisão foi adiada para a semana que vem.
Os embargos infringentes permitiriam a reavaliação sobre os
pontos específicos em que o condenado teve 4 ou 5 votos favoráveis. Por
exemplo, veja-se um dos mais simples casos: José Genoíno foi condenado
por crime de corrupção ativa a pena de 4 anos e 8 meses, por 9 votos a
1, e por quadrilha, a pena de 2 anos e 3 meses, por 6 votos a 4. Se o
Tribunal entender cabíveis os embargos infringentes, Genoíno teria
direito a um novo julgamento por crime de quadrilha.
Em situação semelhante estão José Dirceu, que teria direito
a novo julgamento por quadrilha, e João Paulo Cunha, por lavagem de
dinheiro. E a eventual absolvição por esse crime poderia livrar os dois
do regime fechado, pois as penas ficariam inferiores a 8 anos.
A controvérsia está no fato de que o Regimento Interno do
STF prevê os embargos infringentes (art. 333, I, parágrafo único), mas
esse recurso não está previsto na Lei que estabelece o procedimento para
os processos perante o STF (8.069/1990).
A dúvida de interpretação está na circunstância de que o
Regimento Interno é de 1980 e a lei de dez anos depois. Trata-se de
saber se a lei ao regular o procedimento das ações penais no STF, sem
prever os embargos infringentes, revogou implicitamente o Regimento
Interno nesse ponto.
Uma interpretação possível é entender que a lei, superior
ao regimento, por ter tratado integralmente do assunto, revogou o
cabimento dos embargos.
Outra interpretação, também viável, seria entender que o
Regimento é mais específico e a previsão dos embargos infringentes não
contraria a lei e seria mais compatível com a Constituição por garantir o
exercício da ampla defesa.
Como houve a mudança da composição, se o STF admitir o
cabimento dos embargos infringentes, voltará a ser incerta a decisão
condenatória que teve, ao menos, 4 votos favoráveis ao condenado.

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