terça-feira, 1 de abril de 2014

POLÍTICA - Lula está fazendo falta.

Reveses, pessimismo e esperança, por Aldo Fornazieri

A semana passada foi marcada por uma série de  reveses para o governo Dilma: rebaixamento da nota de risco do Brasil pela Standard & Poor’s; crescimento das denúncias sobre a má gestão da Petrobras, algo reconhecido até mesmo por petistas; coleta suficiente de assinaturas no Senado para a convocação de uma CPI da Petrobras; sinais continuados de crescimento da inflação; más notícias acerca do setor elétrico por conta da escassez de chuvas no Sudeste por um lado, e pela necessidade de injetar mais recursos do Tesouro para manter as tarifas baixas, por outro; atritos na base governista; e, finalmente, queda de sete pontos na avaliação positiva do governo.
Nem tudo está perdido, é claro, e mesmo com tudo isto, Dilma deverá iniciar o processo eleitoral como favorita. A troca de Ideli Salvati por Ricardo Berzoini é um sinal de que, depois de três anos e três meses de governo, a presidente percebeu que é preciso melhorar sua coordenação política para evitar desastres maiores. Dilma vem sendo beneficiada pela incompetência da oposição. Mas é preciso estar em alerta: em política, a fortuna (sorte), costuma mudar de lado e abandona, quase sempre, governos negligentes que não se mostram capazes de imprimir direção e sentido ao curso do Estado.
O fato é que existe um pessimismo generalizado na sociedade. Para alguns analistas, ele é exagerado, pois as coisas não estão tão ruins e o Brasil não perdeu o prumo na economia. Para outros, ele se justifica já que o governo teria emitido sinais excessivos de perda de rumo e sinais equivocados em várias áreas da economia, além da apatia na condução política do governo.
Há outra tempestade que se avizinha e que poderá atingir o governo federal, além de governadores e prefeitos: a necessidade de aumentar o preço das passagens do transporte público em várias capitais. Se as passagens aumentarem nos próximos meses poderão gerar um ambiente explosivo: a conjugação dos protestos contra a copa com novos protestos contra o aumento das passagens. O fato é que muitas prefeituras chegaram a um limite de suportabilidade quanto a conceder subsídios para o transporte público. Estão tirando dinheiro das creches, da saúde e da educação para manter baixas tarifas.
A única saída razoável para evitar o agravamento da crise no setor de transporte consistiria em implementar a proposta que o prefeito Fernando Haddad vem defendendo: a municipalização da CIDE (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), tributo sobre os combustíveis hoje de competência exclusiva da União. A municipalização da CIDE não só poderia conter o aumento das passagens, mas proporcionaria até mesmo sua redução.
As Razões do Pessimismo
O pessimismo que vem se disseminando pela sociedade tem três razões de ser: baixas perspectivas econômicas; sua fabricação pelo mercado financeiro e egarçamento social. A crise de perspectivas econômicas vem sendo determinada por alguns fatores: baixo crescimento, inflação elevada, sinais errados do governo e necessidade de ajustes duros no futuro próximo. Todos esses elementos estão relacionados. Ao combater a inflação pelo câmbio e pelo controle das tarifas administradas, o governo produziu dois males. Por um lado, o desempenho da indústria sofreu um impacto negativo, que é um dos fatores do baixo crescimento. Por outro, gerou-se uma crise no setor elétrico e na Petrobras pela depressão dos preços da energia e dos combustíveis. Seja quem for o próximo presidente, terá que fazer um ajuste duro nesses dois setores, o que implicará também numa política mais agressiva de combate à inflação.
O mercado financeiro, por sua vez, se aproveita deste ambiente econômico pouco animador, mas não descontrolado, para especular e para derrubar (eleitoralmente) a presidente Dilma. Isto ficou evidente na véspera da divulgação da última pesquisa do Ibope. Disseminou-se a informação de que Dilma cairia nas intenções de voto. A bolsa subiu, o que foi uma especulação, e também aproveitou-se do episódio para gerar um desgaste político-eleitoral contra a presidente com a insinuação de que, sem ela, a economia poderia melhorar. O mercado financeiro quer potencializar o pessimismo ante a possibilidade da continuidade do atual governo.
Em que pese não haver uma crise social em termos de desemprego, carestia e perda significativa do poder de compra, o pessimismo social vem se alastrando. As causas são várias. Vivemos numa sociedade violenta e moralmente degradada. A pesquisa do IPEA, que mostra que 65% dos brasileiros concordam que as mulheres que não se vestem adequadamente merecem ser atacadas, é uma evidência dessa crise moral. Nas relações sociais, no trânsito, na economia se expressam como uma espécie de vale tudo.
A Articulação da Esperança
Determinados grupos se arvoram o direito de fazer justiça pelas próprias mãos. O que se vê são ruas e avenidas bloqueadas diariamente, desocupações violentas, incêndio de ônibus e carros, justiçamentos, depredação do CEAGESP etc. Este clima de descontrole vai empurrando a maioria da sociedade para um posicionamento cada vez mais conservador. Várias pesquisas mostram que em relação a temas morais e de segurança pública, a sociedade se posiciona cada vez mais à direita. Neste momento não há, ainda, um grupo político capaz de capitalizar esse sentimento. Mas a tentativa fracassada de reedição da Marcha com Deus e pela Família é um sintoma de que poderá surgir uma direita autoritária organizada politicamente. O resumo de tudo isso é o fato de que as instituições e os agentes políticos e sociais não conseguem apontar rumos e não conseguem liderar a sociedade, agravando a crise de representação.
Como se sabe, com raras exceções, os políticos brasileiros são antimaquiavelianos, no sentido de que são desprovidos de uma ideologia republicana da virtude e subordinam o bem comum aos interesses pessoais e de grupos particularistas privados. Não usam, porque não querem e porque não sabem, a psicologia da esperança como meio fundamental de liderança política e de estímulo econômico. Na verdade, os governantes que assumem o figurino do gestor tecnocrata não sabem usar esse meio porque nunca lideraram o povo. É precisamente nos momentos de crise que a psicologia da esperança precisa ser mais usada.
Em 2008, no momento de pavor com a crise mundial, Lula simplesmente declarou que ela não atingiria o Brasil e que aqui não passaria de uma “marolinha”. Conclamou os empresários a investirem e a sociedade a consumir. Gerou otimismo num momento de desorientação e crise. Em contrapartida, hoje, o que mais se houve das bocas de Dilma e de Guido Mantega é a lamúria em torno crise européia, apontada como a vilã do baixo crescimento. Fazem uma espécie de exercício da psicologia da depressão. O governo precisa, de fato, de um forte freio de arrumação política para não desandar ainda mais.
Aldo Fornazieri – Cientista Político e Professor da Escola de Sociologia e Política.

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