
Nos últimos dias a imprensa foi dominada pelo pessimismo econômico. Apesar do bom desempenho da economia brasileira, cujo pleno emprego combinado ao aumento da renda do operariado tem beneficiado classes sociais eternamente oprimidas por recessões recorrentes ou períodos de crescimento elevado que não se traduziram em melhorias salariais em razão de taxas de desemprego elevadas, os jornalistas estão a beira de um ataque de nervos. As descrições que eles fazem do Brasil parece se referir a um país muito, muito, muito distante.
O tom fabuloso do telejornalismo parece ter três origens. A primeira é a simpatia de algumas redes de TV em relação ao candidato Aécio Neves granjeada pelas gordas verbas de propaganda distribuídas pelo governo paulista (este é o caso da TV Gazeta e, possivelmente da Rede Bandeirantes). A segunda é a raiva que alguns barões da mídia nutrem em relação ao governo Dilma, que tem cobrado impostos que eles devem e não querem pagar (este parece ser o caso da Rede Globo). O terceiro é a crença absurda de que a credibilidade dos telejornais é automática e dispensa qualquer rigor científico, inclusive quando o tema é economia.
Sobre a crença dos telejornalistas no poder que, supostamente, eles tem de conquistar os corações e mentes dos brasileiros não é preciso dizer muito coisa. Qualquer observador atento é capaz de perceber que há três eleições presidenciais os telejornais brasileiros não conseguem empurrar seu candidato goela abaixo do eleitor. Os brasileiros adquiriram maturidade política suficiente para votar considerando mais seus próprios interesses do que a propaganda disfarçada de jornalismo veiculada pelos telejornais em anos eleitorais. Se os telejornalistas ainda não perceberam o quanto a opinião político-partidária deles é irrelevante tanto melhor.
Economia, porém, é uma ciência. Sua exploração jornalística deveria ser feita com algum rigor. Desprezando os evidentes benefícios sociais do pleno emprego e do aumento da renda dos trabalhadores, os telejornais massacram sistematicamente Dilma Roussef por causa do fraco desempenho da economia brasileira. Os especialistas convidados para dar suas contribuições nos telejornais sempre dizem que o Brasil está crescendo pouco, que estamos ficando para traz, que a condução da política econômica não é satisfatória, que a taxa de juros deve ser elevada para atrair capitais estrangeiros, etc.
Os argumentos alinhavados pelos telejornais parecem racionais, mas não são. O desempenho do Brasil não é fraco. O país está crescendo, pouco é verdade, mas seus parceiros e concorrentes europeus (Itália, França, Portugal e Espanha) estão todos amargando recessões dolorosas combinadas com taxas de desemprego elevadas. Apesar da miopia da imprensa, a indústria naval brasileira está florescendo novamente. Imensos petroleiros e barcos de apoio dotados da melhor tecnologia disponível no setor foram lançados ao mar recentemente. Os ganhos tecnológicos neste setor são evidentes e não poderiam ser ignorados. Uma taxa de juros elevada interessa apenas àqueles especuladores que destruíram as economias européias. Nosso país não deve se submeter aos mesquinhos interesses do mercado, pois este só cuida de si mesmo e o governo brasileiro é eleito precipuamente para cuidar do bem estar do povo brasileiro.
Sobre o crescimento econômico, algo diferente poderia ser dito por especialistas em economia que tem idéias diferentes das daqueles que são escolhidos a dedo pelos telejornais porque fazem apologia do mercado. Crescer é bom, mas também pode ser uma mania destrutiva. Sobre o assunto, vale a pena repetir aqui as palavras de um economista que fez bastante sucesso há algumas décadas:
“...embora o crescimento econômico não fosse desconhecido antes deste século – sem dúvida os economistas do século XVIII tiveram viva percepção das oportunidades de expansão econômica, através de inovações, comércio e divisão do trabalho – só quando a recente recuperação do pós-guerra se transformou em um período de avanço econômico continuado no Ocidente e os últimos produtos de inovação tecnológica por toda parte se tornaram visíveis, e audíveis, é que países ricos e pobres tiveram consciência de um novo fenômeno no calendário de acontecimentos, desde então observando em toda parte com atenção e ansiedade: o índice de crescimento. Enquanto o pai se considerava feliz em ter um emprego decente, o trabalhador europeu de hoje expressa ressentimento se sua atenção é chamada para qualquer diferença a menos entre seus ganhos e aqueles de outras ocupações. Se, antes da guerra, a nação se mostrava agradecida por um ano próspero, hoje somos concitados a irritar-nos e aborrecer-nos com a descoberta de que outras nações conseguiram ainda mais.” (Desenvolvimento a que preço?, E. J. Mishan, Ibrasa, 1976, p. 27/28)
É exatamente isto que os telejornais tem feito nos últimos dias: concitar os brasileiros a ficarem irritados com a descoberta de que outras nações conseguiram ainda mais que o Brasil. Isto é feito propositalmente e com finalidade eleitoral? Tenho a impressão que sim, pois os telejornais minimizam o fato de outras nações (Itália, França, Portugal e Espanha) terem conseguido bem menos para que os brasileiros não fiquem felizes em razão de terem empregos decentes agradecendo o fato de o Brasil ter sido próspero o suficiente para empregar quase toda sua população economicamente ativa.
Um pouco mais adiante, E. J. Mishan afirma que:
“No esforço para deter essa fuga em massa da realidade para a estatística, espero persuadir o leitor de que as fontes principais de bem-estar social não são encontradas em crescimento econômico per se, mas em uma forma mais seletiva de desenvolvimento que deve incluir uma radical remodelação de nosso ambiente físico na qual se tenha principalmente em mente as necessidades da vida aprazível e não as necessidades do tráfego e indústria. De fato, nos últimos capítulos argumentarei que os processos sociais pelos quais se acomodava o avanço tecnológico em qualquer caso, quase certamente reduzem nossas fontes de satisfação na vida.” (Desenvolvimento a que preço?, E. J. Mishan, Ibrasa, 1976, p. 32/33)
Os telejornais no presente momento nem mesmo se pautam pelos interesses da indústria, cujo desempenho em alguns setores tem sido não tão bom, mas em outros tem sido excepcional (caso da indústria naval, por exemplo). Quando exigem um aumento da taxa de juros, por exemplo, os telejornais levam em consideração apenas os interesses dos banqueiros e dos investidores internacionais. Os interesses do respeitável público brasileiro, porém, são diametralmente opostos. Taxas de juros mais baixas pesam menos no bolso dos empresários e trabalhadores, além de transferir menos renda estatal para setores improdutivos da economia permitindo, assim, que o Estado, faça o que tem que fazer para atender demandas que o mercado não quer atender (como contratar Mais Médicos no estrangeiro para trabalhar nos rincões rejeitados pelos médicos brasileiros, por exemplo).
Muitas vezes os telejornais citam veículos de comunicação internacionais para desacreditar a política econômica brasileira. Um dos preferidos pelos telejornalistas e especialistas que eles convidam é o The Economist. Curiosamente, The Economist disse o seguinte sobre a obra de “Desenvolvimento a que preço?”, de E. J. Mishan:
“O Dr. Mishan escreveu o livro perfeito para quem deseje iniciar-se no estudo da economia.” (nota na orelha interna da contra-capa do livro citado)
Àqueles que não concordam com as bobagens, meias-verdades e mentiras descaradas que foram ditas pelos telejornais nos últimos dias e que não conseguem entender muito bem porque a economia brasileira não se comporta exatamente como tem sido descrita pelos telejornalistas sugiro a leitura de “Desenvolvimento a que preço?”, de E. J. Mishan. Afinal, o próprio The Economist citado para desabonar o governo brasileiro fez o exatamente o oposto ao recomendar este livro.
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