Um especialista em especulação financeira a ser levado à Fazenda, por J. Carlos de Assis

Aécio Neves teve a audácia de pré-nomear Armínio Fraga como seu ministro da Fazenda caso vença o segundo turno das eleições. Audácia, porque só quem confia de forma absoluta na desinformação do público ou de sua pouca memória pode apresentar como guru da economia alguém cuja principal credencial para o cargo é ser um especialista em mercado financeiro globalizado, a saber, um craque na especulação, um especialista na jogatina com títulos, um perito em bolsa, uma autoridade em derivativos – tudo descolado da economia real.
Foi Armínio Fraga, quando guindado por Fernando Henrique à posição de presidente do Banco Central, quem inventou o swap cambial reverso. Não passa de uma pilantragem financeira, pela qual o Banco Central banca um jogo com índices de juros e de câmbio em favor de apaniguados do mercado. Ganha quem acerta melhor nas taxas de juros e de câmbio futuras. Como o Banco Central controla diretamente os juros básicos e indiretamente a taxa de câmbio ele põe o resultado onde quiser. Os amiguinhos do Banco, por certo, podem ser avisados previamente dele.
Henrique Meirelles continuou com essa prática, que cheguei a denunciar na época. Para defendê-la tanto Armínio quanto Meirelles alegavam que era para proteger as reservas cambiais. Meu argumento era que o que se queria proteger de fato era um grupo privilegiado de insiders, inclusive com risco para grupos empresariais que confiassem no swap cambial reverso como um jogo limpo. Não deu outra. Como consequência, virou o jogo e três dos maiores grupos empresariais brasileiros, Votorantim, Sadia e Aracruz, tiveram um rombo tão grande que quase quebraram em 2010.
Numa recente entrevista ao "Estadão" Armínio Fraga disse candidamente que vai acabar com o swap. Arrependimento? Ou medo de que apareça algum especialista em mercado financeiro que entenda o labirinto dos derivativos, indecifrável para os mortais comuns, que tenha apetite e meios de comunicação para voltar na história e mostrar as entranhas de sua criatura. Aviso que não é fácil. Dei notícia crime do swap cambial reverso, com assistência de dois funcionários do BC, indignados com sua criação, ao Ministério Público e à Polícia Federal. Ambos não se sentiram seguros para encaminhar a denúncia.
Falei com Senadores e com uma alta figura da República, hoje já falecido, e ele se desculpou por não poder fazer nada porque eu próprio não consegui explicar-lhe de uma forma simples como era o funcionamento do swap cambial reverso. Amigos meus, economistas de renome, moralmente insuspeitos, também ficaram inseguros. Um dos poucos que fizeram crítica pública ao instrumento foi Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-presidente do Banco Central, desses poucos que tiveram amplo poder no setor público e que saíram de lá com o pequeno patrimônio com que entraram.
Pois bem, Armínio agora promete acabar com sua criatura. Claro, como o instrumento ainda existe, embora com pouco uso, para acabar com ele terá que conversar com o futuro presidente do BC independente. O que ele tem mais em mente? É preciso saber se ele se converteu à economia real, à economia dos bens de consumo, à economia dos serviços públicos e pessoais, à economia da nossa comida, à economia do comércio exterior. Aécio acha que não é preciso dar qualquer outra explicação sobre Armínio, exceto que foi presidente do BC. Ele chegou a essa posição sem história. Era um especulador na equipe do mega-especulador George Soros – a propósito, Soros é muito mais progressista do que ele -, considerado o sujeito certo para enfrentar a crise especulativa montada em nosso mercado financeiro por Gustavo Franco e Chico Lopes.
A propósito, Armínio é também franco defensor da independência do Banco Central. Acho curioso que alguém que participou do Governo Fernando Henrique seja favorável a isso. Vamos supor que, entre as medidas neoliberais que adotou, Fernando Henrique tivesse institucionalizado a independência do Banco Central. O que ele iria fazer quando descobrisse que Gustavo Franco, na presidência do BC, estava levando o país para o total descalabro financeiro? O que iria fazer quando visse que Chico Lopes, com sua matemática de fancaria, estava nos levando todos para o abismo? Iria respeitar a independência do Banco Central? Ou a independência do BC, para os neoliberais, é a independência dos amigos da família e dos promotores do swap cambial reverso?
*Economista, doutor pela Coppe-UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB.
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