Aprendi, com os 10.000 pacientes com câncer de quem cuidei diretamente
nos últimos 36 anos da minha vida a não temer o futuro, a viver cada dia
com intensidade e amorosidade, a perder os vícios e deixar as mágoas de
lado, a viajar leve pela vida e pela eternidade... Posso dizer que a
maioria dos meus pacientes, depois de enfrentarem o câncer, vive com
mais liberdade e alegria, podendo usufruir o que significa ter saúde em
abundância, ter autonomia para andar, viajar, comer certo, ir ao
banheiro, se divertir, ver os filhos crescerem, acolher os netos; enfim,
viver. Viver em um país como o Brasil, com tantas belezas naturais, com
um povo bonito na sua diversidade multiracial e cultural, com as suas
vertentes religiosas e filosóficas, com a sua capacidade de doação, sua
verdade e coragem de ir em frente.
Há
mais de dez anos, conversando no hospital com uma paciente querida que
infelizmente não está mais aqui neste andar do Universo, pensamos em um
projeto para divulgar as boas coisas que cada um faz, coisas simples
feitas por uns para outros. Tinha algumas regras; não precisava ser uma
ação de grande visibilidade: podia ser o ir à feira para quem estivesse
doente em casa, levar um amigo à
radioterapia, ajudar a buscar as
crianças na escola, limpar a casa no dia da quimioterapia, qualquer ação
que confirmasse que o Bem ainda existe. Se algum famoso quisesse entrar
no site do Bem, teria de passar pelo escrutínio de uma comissão, pois o
objetivo não era que o Bem fosse utilizado como um escudo do ego ou do
orgulho pessoal. Tanto que não quis colocar o site atrelado ao instituto
que coordeno.
Sabemos
que bem mais do que 99,9% de nossos amigos e conhecidos é boa; não
mata, não rouba, não estupra, não vende drogas. É honesta e
trabalhadora. As poucas maçãs podres da cesta da Humanidade acabam tendo
uma visibilidade "ad nauseum" pela mídia, campo em que um fato
escabroso fica meses nos jornais. Tive a oportunidade rara de falar com
uma médica psiquiatra que me encaminhou dois pacientes com câncer grave,
sendo que, com um deles, ela foi junto ao cirurgião para fazer com que
tivesse a coragem de ser operado, o que lhe garantiu alguns anos a mais
de sobrevida. Quando liguei, para elogiá-la pela postura, recebi a
seguinte resposta: "Os meus pacientes são muito legais". Talvez eu tenha
sido uma das últimas pessoas a falar com essa psiquiatra, Marize Von
Richthofen, morta algumas horas depois, em um caso que abala a crença
dos pais nos filhos, até hoje. Porém, a pessoa por trás da história,
nunca ficou conhecida, o que ela fazia de bem no seu consultório
tampouco foi revelado.
Em
diversos momentos lutei (e luto) pelos direitos dos cidadãos com
câncer, tendo criado entidades de defesas dos pacientes, distribuído
mais de 200.000 cartilhas junto com amigas e pacientes, com informações
relevantes. Também enfrentamos lobbies importantes pelas leis de
controle de tabagismo no Brasil. Nas madrugadas, dias da semana e fins
de semana em que cuido da dor dos meus pacientes, dos seus medos e dou
apoio aos familiares. Meu norte é a Ciência e toda a gama de
conhecimento disponível hoje em dia na Biologia Molecular, Genética do
Câncer, medicamentos personalizados e tratamentos que diminuem os
sofrimentos de náuseas, mal estar e que promovem qualidade de vida.
Quero um mundo melhor. Desejo um Brasil pujante, em desenvolvimento,
honesto e trabalhador. Sou filha das oportunidades de uma nação que
acolhe com carinho os que trabalham. Precisamos continuar. Que na Copa
do Mundo, nosso país possa dar uma lição de civilidade, de acolhida aos
estrangeiros que virão aqui, com o melhor de nós para o mundo. Como
cidadã, desejo "Paz Brasil na Copa do Mundo"! Vamos unir o país com
orações, meditações, dedicações à paz, atitudes de carinho uns com os
outros, e de amor na veia! Acorda Brasil!
Nise Yamaguchi, 54 anos, médica Oncologista e Imunologista
Doutora em Medicina pela Faculdade de Medicina da USP
Diretora do Instituto Avanços em Medicina
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