sexta-feira, 3 de maio de 2024

Repórteres palestinos recebem prêmio mundial da Unesco.

 


'Quando você é jornalista, vive com um alvo nas costas': repórteres palestinos recebem prêmio mundial da Unesco

Alguns dos jornalistas assassinados foram mortos no cumprimento do dever, outros em casa, sob as bombas israelenses

Jornalistas palestinos que cobrem a Faixa de Gaza foram nomeados vencedores do Prêmio Mundial de Liberdade de Imprensa Unesco/Guillermo Cano 2024, por recomendação de um júri internacional de profissionais da mídia. A cerimônia de premiação aconteceu na quarta-feira (02/05), durante a Conferência Mundial de Liberdade de Imprensa em Santiago, no Chile.

Mais de 130 jornalistas e profissionais da mídia foram mortos em Gaza desde 7 de outubro, de acordo com o Sindicato de Jornalistas Palestinos.

Criado em 1997, o Prêmio Mundial da Liberdade de Imprensa Unesco/Guillermo Cano premia todos os anos uma contribuição extraordinária para a defesa ou promoção da liberdade de imprensa em qualquer lugar do mundo, especialmente quando a colaboração foi realizada em circunstâncias difíceis. É o único prêmio das Nações Unidas a ser concedido a jornalistas.

Seu nome é uma homenagem a Guillermo Cano Isaza, jornalista colombiano assassinado em 17 de dezembro de 1986 em Bogotá, Colômbia, em frente à redação do jornal onde trabalhava, o El Espectador.

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De acordo com Audrey Azoulay, diretora-geral da Unesco, “todos os anos, esse prêmio homenageia a coragem dos jornalistas que enfrentam circunstâncias difíceis e perigosas. Este ano, a honraria nos lembra mais uma vez da importância da ação coletiva para garantir que os jornalistas de todos os lugares possam continuar a realizar seu trabalho essencial de informar e investigar”.

Para Mauricio Weibel, presidente do Júri Internacional de Profissionais de Mídia da agência da ONU, a escolha tem um forte simbolismo: “neste momento de escuridão e angústia, queremos enviar uma forte mensagem de solidariedade e reconhecimento aos jornalistas palestinos que estão cobrindo essa crise em circunstâncias tão dramáticas. A humanidade tem uma enorme dívida com eles por sua coragem e compromisso com a liberdade de expressão”.

A Unesco apoia jornalistas que cobrem áreas de conflito e crise. Em Gaza, a organização distribui artigos de primeira necessidade para os profissionais de imprensa, enquanto na Ucrânia e no Sudão foram criados espaços de trabalho seguros e concedidos subsídios de emergência aos funcionários da mídia. A organização também fornece equipamentos de proteção e treinamento para jornalistas no Haiti, além de apoiar a mídia independente no Afeganistão.

Palestinian News & Information Agency (Wafa) in contract with APAimages/ Wikimedia Commons
Mais de 130 jornalistas e profissionais da mídia foram mortos em Gaza desde 7 de outubro
Gaza: onde ser jornalista, mais que um trabalho, é um risco de vida

Alguns dos 130 jornalistas assassinados foram mortos no cumprimento do dever, outros em casa, sob as bombas israelenses, como o restante das vítimas civis em Gaza.

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Nesta sexta-feira (03/05), Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, dois jornalistas de Gaza contaram suas histórias à RFI. “Desculpe pelo barulho dos drones. Eles estão voando tão baixo hoje que talvez não consigamos nos ouvir muito bem”, explica Shorouq Ayla, por telefone. A jornalista mora em Rafah, no sul da Faixa de Gaza. Ela perdeu o marido, também jornalista, em um ataque israelense em outubro passado.

“Por que continuo fazendo esse trabalho? É uma questão de princípio”, explica ela. “Sim, jornalistas estão perdendo suas vidas em Gaza, estou ciente disso. Mas optei por não trabalhar com notícias factuais, em outras palavras, não cobrir o evento no momento em que ele acontece. Cobrir as notícias que te expõem”, acrescenta.

Shorouq justifica a decisão por pensar na sua filha, que perdeu o pai durante a guerra. “Não temo por minha vida, mas temo que minha filha, que perdeu o pai, também perca a mãe”, afirma. “Quando você é jornalista, vive com um alvo nas costas. Às vezes, até as pessoas se recusam a falar com você. Com um microfone e uma câmera, você as coloca em perigo. Então, para evitar tudo isso, optei por fazer documentários. Portanto, não estou cobrindo os atentados, mas a história após os atentados”, relatou à reportagem.

“Tenho medo de ser morto”

No norte da Faixa de Gaza, Said Kilani, um fotojornalista, não exerce mais sua profissão. “Mas ainda sou um jornalista. Fui preso e depois libertado pelo Exército israelense, que destruiu meu equipamento. Meu filho foi morto na guerra e minha casa foi atingida por explosões. Sou um refugiado que vive entre diferentes centros de acolhimento. Então, sim, hoje me sinto ameaçado e tenho medo de ser morto”, diz.

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A maioria dos colegas de Said no norte de Gaza também desistiu de cobrir os combates. Eles preferem fazer reportagens sobre a vida cotidiana da população sitiada, que está sofrendo com a falta de comida e água. Said é pai de três filhos. Em janeiro, seu filho mais velho, Sajed, de 16 anos, foi baleado no pescoço.

“Foi baleado por um atirador israelense na rua”, diz. “Quero que meus outros filhos e minha esposa vivam seguros. Quero viver em segurança, em outro lugar que não seja Gaza. Aqui, não temos mais nem água potável. Vemos larvas de insetos se movendo na água que bebemos. Fui contatado pela Federação Internacional de Jornalistas e eles me dão proteção”.

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