segunda-feira, 29 de novembro de 2010

POLÍTICA EXTERNA - A imprensa brasileira e resistência ideológica.

A política externa brasileira, liderada pelo ministro Celso Amorim desde 2003 é um dos setores mais elogiados pela esquerda, base de sustentação do presidente Lula desde 2002 e mesmo entre aqueles grupos que se desgarraram para a oposição a partir de 2005. Por outro lado é o setor mais criticado tanto pela direita política quanto pela imprensa muito influenciada pelos interesses norte-americanos. Acusam-nos de praticar uma política ideológica, como se esse adesismo não tivesse forte carga ideológica. Par a direita, só há ideologia na esquerda. Mas essa resistência, quase teimosia, descamba muitas vezes pra o ridículo. E é justamente uma revista americana que desnuda essa relação.

Segundo a revista "Foreign Policy", Amorim foi ao lado da ex-ministra do Meio Ambiente e candidata a presidência Marina Silva, listado entre os 100 maiores pensadores globais de 2010. Mais do que estar entre os 100, o recordista em tempo no cargo de ministro das Relações Exteriores aparece em sexto lugar, atrás apenas de personalidades como Bill Gates e Warren Buffett (empatados em 1º) e Barack Obama (3º). Não é pouca coisa.

No entanto nos editoriais dos grandes jornais brasileiros, Amorim é tratado como um bastião do antiamericano quase infantil. Para o Estadão, por exemplo, o Brasil pratica uma "diplomacia da provocação. Para o jornal paulista, "a fixação antiamericana do Itamaraty é um chavismo de segunda."

Não bastasse a megalomania que a orienta, o presidente parece convencido de que a projeção do País no mundo será tanto maior quanto mais a política externa brasileira se caracterizar pelo contencioso com os EUA, para além das divergências normais no relacionamento bilateral. Essa tolice é insuflada por um antiamericanismo reminiscente dos anos Geisel, sob a ditadura militar. Confundindo diplomacia assertiva com a busca de pretextos para criar marola, o Itamaraty só muito raramente se esforça para minimizar ostensivamente os atritos com Washington.

Para o Instituto Millenium, "diferente do que se espera de uma diplomacia madura e verdadeiramente pragmática, a atual postura da política externa brasileira demonstra estar sendo pautada por um evidente antiamericanismo. Não se trata de um posicionamento independente, mas sim de confronto."

Mas pra a "Foreign Policy" não é bem assim. Na contramão do pensamento conservador nacional, para montar seu ranking, a publicação ficou de olho no que chamou de "ascensão do resto" - países que passaram de figurantes a protagonistas na cena global. E a "diplomacia impaciente" do Brasil tem muito a ver com essa promoção, segundo a "FP". O "astuto e urbano" diplomata brasileiro é exaltado por seguir um caminho independente, sem fazer oposição radical aos Estados Unidos, "como a velha esquerda da América Latina", nem abaixar a cabeça para os americanos. Para a "FP", Amorim ajuda a transformar o Brasil em um "global player" e isso parece incomodar muita gente.

David Rothkopf, editor da "FP" já havia escolhido Amorim o melhor chanceler do mundo. Rothkopf destaca entre muitas causas, sua batalha para transformar os BRICs de uma sigla em uma importante colaboração geopolítica, trabalhando com seus colegas da Rússia, da Índia e da China para institucionalizar o diálogo entre os países e coordenar suas mensagens. Além do fortalecimento do G20.

Nada ilustra quanto evoluiu o Brasil ou quão eficaz é o time Lula-Amorim quanto os eventos das últimas semanas. Primeiro, os países do mundo largaram o G8 e abraçaram o G20, garantindo ao Brasil um lugar permanente na mesa mais importante do mundo. Em seguida, o Brasil se tornou o primeiro país da América Latina a ganhar o direito de sediar as Olimpíadas. Ontem o Financial Times noticiou que a "Ásia e o Brasil lideram na confiança do consumidor", um reflexo da reputação que o governo vendeu eficazmente (com a maior parte do crédito indo para o ressurgente setor privado brasileiro).

E nesta semana as notícias sobre o encontro do FMI-Banco Mundial em Istambul mostraram a institucionalização do novo papel do Brasil com um acordo para mudar a estrutura do FMI. De acordo com o Washington Post de hoje: "As nações também concordaram preliminarmente em reestruturar a estrutura de votação do Fundo, prometendo dar mais poder aos gigantes emergentes como o Brasil e a China até janeiro de 2011".

Nada mal para alguns dias de trabalho. E embora seja o ministro da Fazenda que representa o Brasil nos encontros do FMI-Banco Mundial, o arquiteto dessa marcante transformação no papel do Brasil foi Amorim.

A imprensa no Brasil noticia esse reconhecimento internacional com um misto de surpresa e indignação. Tentam falar em nome dos interesses estrangeiros e são abruptamente desmentidos por publicações desses mesmos países, que veem na política externa brasileira um instrumento de afirmação nacional e não de enfrentamento. O Brasil não deve caminhar pelo caminho mais fácil, confortável. Adquiriu nesses últimos anos musculatura para alçar voos mais altos, negociando com os "donos do mundo" como parceiros e não como subordinados.

Marina Silva divide a 32ª colocação com outras três líderes de partidos verdes: Cécile Duflot (França), Monica Frassoni (Bélgica) e Renate Künast (Alemanha). Após o fiasco na cúpula climática em Copenhague, em dezembro passado, "2010 se transformou no ano dos verdes e, mais especificamente, das mulheres verdes", afirma a "FP". Marina teria "surpreendido a todos ao forçar um segundo turno na corrida presidencial de seu país", alcançando a votação mais expressiva do PV no Brasil.
Fonte: Blog do Alê.

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