quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Os Espinhos do Mandacarú

 

O s   E s p i n h o s    d o    M a n d a c a r ú


Mundo-3: os novos ventos na América Latina

Posted: 17 Jan 2022 11:04 AM PST

 Por Altamiro Borges

Derrubada (1960), Portinari
A luta de classes segue movendo o mundo. Na geopolítica internacional, há importantes mudanças em curso. Os EUA já não mandam e desmandam como antes. A potência imperialista está enfiada em uma crise econômica sem precedentes, perdendo o papel de liderança no planeta. A sua hegemonia nas armas, no front militar, também sofre abalos, como ficou evidenciado após 20 anos de ocupação criminosa no Afeganistão.
A degradação acelerada do império explica, inclusive, o trágico governo do fascista Donald Trump – um ser patético e grotesco –, o que só aumentou o isolamento dos EUA no mundo. A tentativa frustrada de manter o poder, com a violenta invasão em janeiro passado do Capitólio – o congresso ianque – confirmou o grau de degradação dessa nação apodrecida.
O declínio relativo do imperialismo ianque tem relação direta com a ascensão de outras potências, em especial da China, no terreno econômico, e da Rússia, no campo militar. Esses e outros países erguem projetos próprios de desenvolvimento nacional, alguns até com ingredientes socialistas, mas não se apresentam hoje como alternativa mundial ao capitalismo. Eles exploram as contradições e se desenvolvem no âmbito da própria economia capitalista.
Essa profunda mudança na geopolítica mundial tende a aumentar as tensões em todos os terrenos – na briga econômica-comercial por mercados, nas interferências políticas em nações dependentes, nas aventuras militares e até na guerra tecnológica em torno do 5G. Essa alteração, com a crise sistêmica do capitalismo e o declínio relativo do império, gera turbulências e incertezas, mas, ao mesmo tempo, favorece a luta dos trabalhadores.
A resistência crescente dos trabalhadores
Apesar das dificuldades estruturais, decorrentes das profundas mutações no mundo do trabalho e da brutal ofensiva neoliberal contra os direitos trabalhistas, os explorados resistem. No mundo inteiro, os trabalhadores estão em luta. Ela se expressa de diferentes formas e com distintas intensidades.
Na Europa, as greves e mobilizações sindicais têm conseguido conter, minimamente, a retirada de direitos trabalhistas e previdenciários. Há ricas experiências de lutas dos escravos dos aplicativos, dos “uberizados”, inclusive com a conquista de alguns avanços na regulamentação desse trabalho. Essas lutas também têm sido decisivas para barrar a eleição de novos expoentes da extrema-direita europeia – como em Portugal, na Espanha, na Itália e nos países escandinavos.
Já nos EUA, houve uma explosão de protestos contra o racismo e a miséria. O assassinato em maio de 2020, na cidade de Minneápolis, do trabalhador negro George Floyd – que fora infectado pela Covid-19, demitido da sua empresa e morreu sob o joelho de um policial branco – foi o estopim de uma onda de revolta só vista nos anos 1960. A frase “não consigo respirar” virou o lema dos que lutam por uma vida digna, sem opressão e exploração.
Essa massiva e radicalizada mobilização nas ruas foi decisiva para a derrota, nas urnas, do racista e negacionista Donald Trump. Ela ainda forçou o novo presidente dos EUA, Joe Biden, a abrir um debate na sociedade sobre o papel do Estado no enfrentamento da barbárie do “deus-mercado” e sobre a necessidade de novas normas contra o trabalho precário.
Das trevas às luzes no continente
Na nossa América Latina, esse processo de luta também tem produzido resultados alvissareiros. Eles ainda são incertos e instáveis, mas apontam para uma tendência positiva no próximo período. No Chile, os constantes protestos – inclusive durante a pandemia – enfraqueceram o governo neoliberal de Sebastian Piñera e resultaram no enterro da Constituição herdada do ditador Augusto Pinochet. Em dezembro de 2021, a rebeldia nas ruas resultou em uma histórica vitória nas urnas – com o rechaço do neofascista José Antonio Kast e a eleição do líder de esquerda Gabriel Boric.
Pouco antes, em novembro, Xiomara Castro foi eleita a primeira presidenta de Honduras, derrotando os fascistoides que depuseram seu marido, Manuel Zelaya, no golpe de Estado de 2009. Já em julho, no Peru, a onda de insatisfação contra o desmonte neoliberal resultou na vitória do sindicalista e professor Pedro Castillo no pleito presidencial.
Também na Nicarágua e na Venezuela, as forças direitistas, ligadas aos EUA, perderam nas urnas no ano passado. Já no final de 2020, em um feito heroico, os povos indígenas da Bolívia derrotaram a oligarquia racista e o império ianque, que haviam dado um golpe em novembro de 2019, e mandaram para a cadeia a fantoche Jeanine Áñez e os generais golpistas.
Já na Colômbia, o clima insurrecional dura mais de dois anos. Os trabalhadores e a juventude erguem trincheiras em Bogotá e outros centros urbanos, enfrentam a brutal violência policial e já derrotaram o plano de austeridade fiscal do facínora Iván Duque. Gustavo Petro, candidato de uma ampla aliança progressista, é o favorito para as eleições de maio próximo.
Dos massivos protestos de rua às urnas, os explorados do nosso sofrido continente têm derrotado as forças da ultradireita neoliberal. Com todas suas contradições e limitações, os novos governos procuram saídas para a grave crise econômica, social e política na região. Das trevas às luzes, a América Latina – que tem o Brasil como uma importante força – se levanta e volta a ter esperanças!
* Terceira e última parte do primeiro bloco. Texto elaborado como contribuição para o 10º Congresso do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente de São Paulo (Sintaema).
** Continua... No próximo bloco, uma análise da complexa conjuntura nacional.Texto original : BLOG DO MIRO
Texto replicado de : CARLOS - Professor de Geografia
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Mundo-2: neofascismo e ultraneoliberalismo

Posted: 17 Jan 2022 11:02 AM PST

 Por Altamiro Borges

Família (1935), Portinari
Nessa nova fase regressiva e destrutiva do capitalismo, que concentra a riqueza e faz explodir a miséria, há uma combinação perversa entre o ultraneoliberalismo na economia, o fascismo na política e o obscurantismo nos valores e nos direitos humanos. Ocorre um processo de fascistização no mundo.
O neoliberalismo aguçou as contradições do sistema, o que ampliou suas deformações e depravações, como aumento da violência urbana e do drama da imigração. Ele também fragilizou as instituições democráticas do Estado, travou as mudanças mais progressistas na sociedade e fragmentou a capacidade de resistência dos trabalhadores.
Esses fenômenos foram o caldo de cultura para o avanço de ideias ultradireitistas contra os imigrantes, em favor da necropolítica, do negacionismo na ciência, da rejeição das conquistas recentes contra o machismo, o racismo, a homofobia, entre outros direitos civilizatórios.
A eleição do neofascista Jair Bolsonaro no Brasil faz parte dessa onda reacionária internacional; não é um fator isolado. Isto explica a ascensão de figuras sinistras e patéticas, como Donald Trump (EUA), Boris Johnson (Reino Unido), Matteo Salvini (Itália), Marine Le Pen (França), Viktor Orbán (Hungria), Rodrigo Duterte (Filipinas), entre tantos outros.
Golpes e retrocessos na América Latina
A nossa América Latina sentiu o impacto dessa onda fascistizante. Após despontar como vanguarda na luta contra o desmonte neoliberal no planeta – como seus Fóruns Sociais Mundiais, greves urbanas, revoltas indígenas e camponesas e eleições de governos progressistas no início deste século –, nosso subcontinente sofreu uma devastadora regressão.
Para bloquear as tímidas reformas sociais e implodir as iniciativas de integração regional – que barraram a Alca, reforçaram o Mercosul e criaram a Unasul, a Celac e outras instâncias de unidade latino-americana –, as oligarquias locais e o império ianque promoveram golpes judiciais-parlamentares-midiáticos em Honduras (2009), Paraguai (2012), Brasil (2016) e Bolívia (2019).
Na treva que se abateu na região, as forças da extrema-direita e da direita neoliberal também venceram eleições na Argentina, Uruguai, Equador, Paraguai, Chile, El Salvador, entre outros países da América Latina e Caribe. E o imperialismo seguiu apostando na desestabilização da Venezuela e de Cuba.
Foi um tsunami reacionário, que resultou em desmonte dos Estados nacionais, em ataques aos direitos trabalhistas, em destruição de políticas públicas, na explosão de desemprego e da miséria e no avanço do autoritarismo, com o endurecimento das relações com o sindicalismo e os movimentos sociais. Anos sombrios, que finalmente começam a ser superados.
* Segundo parte. Texto elaborado como contribuição para o 10º Congresso do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente de São Paulo (Sintaema).
** Continua...Texto original : BLOG DO MIRO
Texto replicado de : CARLOS -Professor de geografia

Mundo-1: pandemia, desigualdade e resistência

Posted: 17 Jan 2022 11:00 AM PST

 Por Altamiro Borges

Família (1935), Portinari
O mundo do trabalho vive o pior dos mundos. A pandemia da Covid-19 só agravou o cenário de desigualdades sociais, desemprego, queda de renda, regressão trabalhista, desalento e falta de perspectivas – principalmente entre os mais jovens. A crise do capitalismo, que é prolongada, estrutural e sistêmica, ganhou contornos ainda mais trágicos com o novo coronavírus.
Por outro lado, a pandemia acelerou o processo de mudança na geopolítica mundial, com o declínio relativo dos EUA e a ascensão de novas nações, com destaque para a China. A humilhação do império no Afeganistão, após 20 anos de ocupação criminosa e gastos de dois trilhões de dólares, é a prova mais recente dessa mutação do quadro internacional.
O agravamento das contradições no capitalismo tem como consequência o aumento da resistência dos trabalhadores em todos os países. Greves, explosões de revoltas e novas formas de confronto pipocam pelo mundo, mas ainda não conseguiram alterar a situação de defensiva estratégica da luta dos trabalhadores.
Na América Latina, os povos voltam a se insurgir contra as oligarquias locais, aliadas dos EUA, obtendo expressivas vitórias no Chile, Peru, Honduras, Bolívia – entre outras nações da nossa sofrida região.
Esse cenário complexo, volátil e cheio de incertezas confirma que para enfrentar a barbárie capitalista é urgente investir cada vez mais na mobilização, na conscientização e na organização dos explorados. A humanidade corre sérios riscos sob a égide do capitalismo!
Explosão das desigualdades sociais
Estudo divulgado em fevereiro passado pela ONG Oxfam Internacional, intitulado “O vírus da desigualdade”, confirma que a pandemia do novo coronavírus só agravou as desgraças que já vinham devastando a sociedade neste longo período de capitalismo destrutivo e regressivo.
“O vírus expôs, alimentou e aumentou as desigualdades de renda, gênero e raça já existentes. Milhões de pessoas já morreram e centenas de milhões estão sendo jogadas na pobreza, enquanto os mais ricos – indivíduos e empresas – prosperam. As fortunas dos bilionários voltaram ao pico pré-pandêmico em apenas nove meses, enquanto a recuperação para as pessoas mais pobres do mundo pode levar mais de uma década... Estima-se que o total de pessoas que vivem na pobreza pode ter aumentado entre 200 milhões e 500 milhões em 2020”, afirma o relatório.
Entre março de 2020, quando a pandemia do novo coronavírus foi reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e no final daquele ano, os bilionários acumularam US$ 3,9 trilhões em riquezas. Apenas os 10 maiores ricaços do planeta aumentaram em US$ 540 bilhões sua fortuna no período, segundo o ranking elaborado pela revista Forbes.
Violenta regressão do trabalho
Nesse acelerado e brutal processo de regressão, os assalariados foram duramente atingidos – apesar da resistência do sindicalismo em vários países. Segundo relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT), atualmente meio bilhão de pessoas estão desempregadas ou subempregadas no planeta.
Os ataques do capital aos trabalhadores se deram em duas dimensões. No nível macro, a aplicação do receituário ultraneoliberal na economia resultou em demissões, arrocho salarial e retirada de antigos direitos trabalhistas. Estudos da OIT apontam que na maioria dos países os governos aprovaram “deformas” trabalhistas e previdenciárias e adotaram medidas autoritárias para conter a ação sindical, enfraquecendo a união e a resistência dos trabalhadores.
Já no nível micro, das empresas, a reestruturação produtiva se intensificou com as novas tecnologias de informação. A pandemia da Covid-19 acelerou ainda mais o processo que já estava em curso de “uberização” do trabalho e do chamado home office, com a individualização das relações no trabalho – uma nova modalidade de regulação, com jornadas maiores, salários menores e cortes de direitos.
* Texto elaborado como contribuição para o 10º Congresso do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente de São Paulo (Sintaema).
** Continua...Texto original : BLOG DO MIRO
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