sábado, 20 de abril de 2013

HAITI - O papel do Brasil.

CUT: Brasil está jogando no Haiti o papel de terceirizado dos EUA



Senador Jean Charles Moisei: As tropas brasileiras no Haiti têm sido usadas para reprimir manifestações sociais de todo o tipo
por Isaías Dalle, no site da CUT
O senador haitiano Jean Charles Moise voltou a denunciar, na noite da última quinta-feira, que as tropas brasileiras em ação no Haiti têm sido usadas para reprimir manifestações sindicais e protestos de todo o tipo promovidos pelos cidadãos daquele país. Mais grave ainda: relatou casos de estupros e enforcamentos que os soldados da força de ocupação da ONU – chefiada pelo Brasil – têm cometido no Haiti desde que lá chegaram, em 2004, após golpe que derrubou o presidente eleito Bertrand Aristide.
Moise participou de audiência pública na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), convocada para reafirmar a necessidade de retirada imediata das tropas brasileiras e dos demais países que participam da missão da ONU.
A audiência é parte da campanha “Defender o Haiti é Defender a Nós Mesmos”. Ela foi convocada e apoiada pela CUT,  pelo MST, Movimento Negro Unificado, SOS Racismo e por parlamentares do PT e do PSB. A audiência foi presidida pelo deputado estadual Adriano Diogo (PT).
A atividade de ontem insere-se na preparação da Conferência Continental Pela Retirada de Tropas do Haiti que vai ocorrer na capital, Porto Príncipe, em 1º de junho, quando a ocupação completará nove anos – a ONU alegava inicialmente que a ocupação duraria apenas seis meses. A Conferência deve reunir movimentos sociais e lideranças político-partidárias de diversos países.
O diretor-executivo da CUT, Júlio Turra, ao falar durante o ato na Alesp, destacou a contradição na política externa brasileira, usando como parâmetro as posições adotadas pelo Governo Dilma em relação às eleições venezuelanas e a ocupação no Haiti.
“A presidenta Dilma acertou ao reconhecer a vitória de Nicolás Maduro e ao comparecer à posse do novo presidente da Venezuela, contrariando a posição dos Estados Unidos”, disse.  “Mas no Haiti o Brasil está jogando o papel de terceirizado dos Estados Unidos”.
Turra também lembrou que há efetivos de países como Bolívia, Equador e Peru, atuando na missão da ONU. “O que os governos progressistas da América Latina estão fazendo lá? Devemos lembrar que quando Bolívar [Simón Bolívar, herói das lutas independentistas do continente] enfrentou revezes militares em 1815, foi procurar e recebeu ajuda de quem? Do Haiti…”.
O senador Moise relatou que com a repressão aos movimentos sociais e a proteção a instalações de empresas privadas, as tropas da ONU têm garantido margem de ação ao atual presidente Michel Martelly em seus ataques sistemáticos às garantias democráticas e suas operações suspeitas com os Estados Unidos.
As eleições para o Senado e para as prefeituras, que deveriam ter acontecido há dois anos, ainda não foram organizadas pelo atual governo; por causa disso, os mandatos atuais estão esvaziados ou mesmo vencidos por decurso de prazo.
Recentemente, parlamentares da oposição, segundo Moise, tiveram acesso a documentos restritos que comprovam a existência de minas de ouro em solo haitiano que valeriam bilhões de dólares. “E o nosso presidente, de extrema-direita, fez o quê? Em lugar de dar espaço a empresas locais capazes de fazer a mineração, abriu sua própria companhia, em sociedade com empresários estadunidenses”, contou.
Bárbara Corrales, do comitê “Defender o Haiti é Defender a Nós Mesmos”, reivindicou que a presidenta Dilma “dê o exemplo” e decida pela retirada imediata das tropas brasileiras:
“Imaginem um exército de 12 mil soldados num país que não está em guerra. Só agem na repressão. Se as tropas estivessem ajudando como dizem estar, por que os haitianos estariam fugindo do país, a exemplo desses 5 mil que entraram no Brasil através do Acre?”
O governo brasileiro, por sua vez, anunciou em setembro do ano passado que pretendia iniciar retirada “gradual” das tropas. O mês previsto para o início do processo era março.
O conceito de que defender o Haiti é defender “a nós mesmos” pode ser compreendido por meio de alguns exemplos citados pelos presentes à plenária. Joelson Souza, do movimento Juventude Revolução, informou que ouviu de um comandante brasileiro que a ação no Haiti é um “laboratório” para futuras ações em morros e periferias. Julio Turra acrescentou que ceder à pressão dos EUA na questão haitiana pode enfraquecer as posições dos governos progressistas em disputas em nosso continente.
Por três vezes o senador Moise acenou com o risco de conflitos no Haiti. “O presidente Martelly assinou acordo com o FMI que proíbe nosso país de produzir arroz, produto importante de nossa economia. Está desalojando camponeses de suas terras com a ajuda das tropas da ONU. Está reprimindo os movimentos sociais. Vocês acham que nós vamos ficar quietos para sempre? Eu acho que não. Nós já fomos guerreiros, hoje somos apenas soldados. Mas não deixaremos jamais que tirem nossa dignidade”, afirmou. O Haiti foi o primeiro país negro a conquistar a independência, em 1804, em revolução popular que expulsou o exército napoleônico.

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