PSDB combinou com o Estadão o pedido ao TSE de auditoria na eleição presidencial
Uma bizarra simbiose
por Luciano Martins Costa
O pedido de
auditoria na eleição presidencial, de iniciativa do PSDB, divide o alto
da primeira página do jornal O Estado de S. Paulo, nesta sexta-feira,
(31) com a principal notícia de economia.
O Globo registra o assunto também na primeira página, mas em uma nota
sem grande destaque, e a Folha de S. Paulo deixa o tema sem menção na
primeira página e o coloca em posição secundária na editoria Poder.
O fato, incomum na rotina de manchetes compartilhadas pelos jornais que dominam a cena da mídia nacional, chama atenção.
A razão é explicada por um vazamento da redação do Estado: um dirigente
do PSDB teria sondado editores sobre qual seria a receptividade do
jornal àquela notícia.
Com a garantia de que a iniciativa poderia sair em manchete, os autores
da medida resolveram se arriscar à aventura de questionar o resultado
das urnas, sem o risco de serem execrados pela imprensa por sua atitude
vexaminosa.
Agora, imagine-se o contrário: se, derrotado na disputa presidencial, o
Partido dos Trabalhadores resolvesse pedir uma investigação sobre a
lisura do processo eleitoral.
Evidentemente, não apenas as manchetes, mas os editoriais, os
colunistas, os analistas econômicos, os filósofos, os psicólogos e
outros “especialistas” hospedados na mídia tradicional, e até os
astrólogos, estariam mobilizados para condenar a insinuação de que o
partido governista colocava em dúvida a justeza da decisão popular.
No mínimo, os descontentes seriam considerados maus perdedores, mas o
tom geral seria de condenação a uma suposta tentativa de golpe de
Estado.
E tudo motivado por análises técnicas? Não. O que move os reclamantes é
uma série de manifestações de correligionários nas redes sociais.
O episódio coloca esta sexta-feira no calendário de horrores criado pela
simbiose bizarra entre a imprensa hegemônica e a oposição ao Executivo
federal.
Numa escala imaginária de despautérios, fica apenas alguns graus abaixo
da manobra consumada no último fim de semana, às vésperas do segundo
turno da eleição presidencial, por um panfleto de campanha distribuído
sob o logotipo da revista Veja.
Não por acaso, o assunto é explorado pelo carro-chefe da Editora Abril (leia aqui) e justificado por um de seus mais dedicados pitbulls.
A nau dos insensatos
A iniciativa do PSDB poderia ser considerada uma tolice, não fosse a
revelação de que se trata de operação combinada com pelo menos um dos
principais jornais do País.
Qual seria o efeito de tal notícia no ambiente das redes sociais digitais?
Evidentemente, essa manobra tende a acirrar o radicalismo na parcela
mais aloprada do eleitorado, aquela que prega diariamente o golpe
militar e até o assassinato de adversários como ação política legítima.
Sua escalada pode gerar uma crise de governabilidade.
O fato de um dos principais partidos do País buscar apoio nesse
substrato da cidadania, onde se aglomeram os mais insensatos entre os
analfabetos políticos, demonstra a falta de espírito democrático de seus
dirigentes, entre os quais já se alinharam alguns intelectuais
respeitados.
O fato de um jornal de influência nacional embarcar na aventura golpista revela o baixio a que se dispõe a mídia tradicional.
Mas a adesão de Veja não surpreende: a revista simboliza há muito tempo a
destruição do legado de Victor Civita, processo que pode ser mais bem
analisado à luz da psicologia freudiana do que sob as muitas teorias da
comunicação.
Quanto aos observadores da mídia, desponta aqui um tema interessante
para ser considerado: carece de fundamento a suposição, bastante
difundida a partir da distribuição dos votos na última eleição, de que
os mais educados entre os eleitores tendem a votar com mais
racionalidade.
A se julgar pelas manifestações de energúmenos que pregam medidas
antidemocráticas como reação à decisão soberana das urnas, pode-se
afirmar que é nos estratos com mais anos de escolaridade que se
expressam a insensatez, o desatino e a irresponsabilidade.
Estudo do instituto americano Pew Research Center sobre a polarização política nos Estados Unidos (ler aqui,
em inglês), mostra que conservadores se informam por fontes menos
diversificadas – por exemplo, 88% deles confiam na reacionária Fox News -
enquanto os cidadãos mais liberais usam uma variedade maior de fontes
de informação e opinião.
Aplicada ao Brasil, a pesquisa provavelmente mostraria como a mídia
partidarizada contribui para acirrar os ânimos e coloca em risco a
própria democracia. ( VIOMUNDO )
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