CNV vai responsabilizar institucionalmente ex-presidentes militares
Os marechais e generais presidentes da República durante a ditadura sabiam das torturas e das execuções de presos políticos e, evidentemente, de tudo o que acontecia no aparato de repressão criado e desenvolvido por seus governos durante o regime militar no Brasil (1964-1985). Até porque aquilo foi uma política de Estado, institucionalizada.
Nós, também, sabíamos. A diferença é que, agora, pela 1ª vez neste meio século desde que o regime de exceção foi instalado eles serão considerados responsáveis institucionalmente pelas violações dos direitos humanos cometidas naquele período. Agora oficialmente. Não é mais a ditadura, o Estado ou a União, como se estes fossem figuras etéreas, sem rosto.
Agora, conforme adiantaram membros da Comissão Nacional da Verdade (CNV) ao repórter Roldão Arruda, do Estadão (reportagem publicada ontem), no relatório final de seus 2,5 anos de trabalho que entrega à presidenta Dilma no próximo dia 10, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) decidiu responsabilizar os presidentes da República pelas arbitrariedades daquele período.
Serão responsabilizados por estes crimes os ex-ditadores marechais Castelo Branco e Costa e Silva, os generais Garrastazú Médici, Ernesto Geisel e João Figueiredo. E, também, os três integrantes da Junta Militar – que governou o país em parte de 1969, na doença do Costa e Silva – general Aurélio de Lyra Tavares, almirante Augusto Rademaker Greenwald e brigadeiro Márcio de Souza Mello.
Militares sabiam de tudo
Pela primeira vez, os militares responsáveis pelos crimes da ditadura serão nominados. Tudo muito bem registrado no relatório da CNV. O texto destacará que eles sabiam de todas as barbaridades cometidas pelo aparelho e aparato da repressão que funcionaram em seus governos verdadeiras máquinas de tortura e extermínio.
Como explica os advogados José Carlos Dias e Rosa Maria Cardoso, que estão escrevendo o capítulo do relatório voltado à essa responsabilização, os presidentes militares viabilizaram e deram aval às ações violentas dos órgãos de repressão desenvolvidos em seus governos e às políticas que tiveram como base a Doutrina de Segurança Nacional.
“Os presidentes serão apontados como autores indiretos. O Castelo não esteve envolvido de maneira pessoal e direta com a tortura, mas elas ocorreram em seu governo. Na verdade, ela fazia parte da política de Estado, dentro da ideologia da segurança nacional. A tortura, é preciso ficar sempre claro, não surgiu porque um capitão fanático resolveu torturar alguém. Havia uma longa cadeia de comando”, afirma Dias.
Rosa Maria reforça: “a cúpula militar, até a Presidência da República, sabia das graves violações de direitos humanos”. Ela lembra, inclusive, que no início de seu governo, Castelo Branco designou o general Ernesto Geisel para apurar denúncias de torturas que estariam ocorrendo no Nordeste. “O general constatou as torturas e produziu um relatório, que acabou engavetado”, lembra Rosa.
Punição aos criminosos
Rosa destaca, ainda, que “uma das obrigações da comissão, de acordo com a lei a que a criou, é apontar essas responsabilidades. O que nós vamos fazer é uma declaração pública de responsabilidade institucional das pessoas que governaram o País”.
A questão posta, agora, é a revisão da Lei da Anistia recíproca, uma cobrança inadiável que a Comissão não pode deixar de fazer neste seu relatório. Como todos sabem, por conta deste entulho da ditadura militar, a ação da CNV a rssponsabilização imputada pela comissão aos ditadores ainda não possibilita punição aos ex-presidentes do ponto de vista criminal ou cível.
Nem a eles, nem a nenhum dos criminosos que sequestraram, assassinaram, torturaram, estupraram e desapareceram com os restos mortais de quem ousou combater a ditadura e lutar pela democracia naquele período. “Só o Judiciário pode definir responsabilidades específicas, analisando caso a caso”, adverte José Carlos Dias para quem – e estamos completamente de acordo com ele e com as leis internacionais – “crimes contra a humanidade, como a tortura, não são suscetíveis de anistia e não têm prazo para prescrever.”
Nós aqui desse blog – assim como sempre se pronunciou o ex-ministro José Dirceu - ao longo de todo o trabalho da CNV, esperamos que ela nesse seu documento final proponha a revisão da Lei da Anistia recíproca e que o Supremo Tribunal Federal (STF) revise e revogue sua decisão de 2010 quando considerou legal e constitucional a manutenção intocada desse ultimo entulho da ditadura – a Lei da anistia.
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