quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

ECONOMIA - Suspensão do pagamento da dívida externa.

Joseph Stiglitz mostra que a suspensão do pagamento da dívida pode ser benéfica para um país e sua população.

Desde que a União Europeia foi duramente atingida pela crise da dívida e vários países se sentem estrangulados pelos seus credores, a perspectiva de uma suspensão de pagamento aparece no horizonte. A maioria de economistas tanto da direita como da esquerda considera que se deve evitar o default. A Troika concedeu créditos pela via urgente à Grécia (maio de 2000), à Irlanda (novembro de 2010), a Portugal (maio de 2011) e ao Chipre (março de 2013) sob o pretexto de evitar um default que teria tido, dizem, efeitos catastróficos para as populações desses países. No entanto, encontramos em várias pesquisas econômicas sólidas argumentos a favor da decisão de suspender o pagamento da dívida. Além disso, atualmente, é difícil negar que as condições que acompanhavam esses créditos, assim como o aumento da dívida, afetaram de forma dramática esses povos, a começar pelo grego. É o momento de compreender que uma suspensão do pagamento da dívida pode constituir uma escolha justificada.
 
Fonte: http://bit.ly/15vhr2m  
A reportagem é de Éric Toussaint e publicada no sítio francês CADTM, 16-01-2015. A tradução é de André Langer.
Joseph Stiglitz (foto), prêmio do Banco da Suécia em economia em memória de Alfred Nobel em 2001, presidente do conselho de economistas do presidente Bill Clinton de 1995 a 1997, economista chefe e vice-presidente do Banco Mundial de 1997 a 2000, traz sérios argumentos àqueles que defendem a suspensão do reembolso das dívidas públicas. Em uma obra coletiva (1) publicada em 2010 pela Universidade de Oxford, Stiglitz afirma que a Rússia, em 1998, e a Argentina, durante os anos 2000, ofereceram a prova de que uma suspensão unilateral do reembolso da dívida pode ser benéfica para os países que tomaram essa decisão: “Tanto a teoria como a prática sugerem que provavelmente a ameaça do não pagamento da dívida tenha sido exagerada” (p. 48).
Quando um país consegue impor uma redução da dívida aos seus credores e redireciona esses fundos, destinados anteriormente a esse pagamento, para financiar uma política fiscal expansionista, isso produz resultados positivos: “Nesse cenário, o número de empresas locais que quebram diminui porque as taxas de juros locais são mais baixas que se o país tivesse continuado a pagar sua dívida (2), e ao mesmo tempo porque a situação econômica geral do país melhora. Posto que a economia se reforça, a arrecadação de impostos aumenta, o que melhora a margem orçamentária do governo. [...] Tudo isso significa que a posição financeira do governo se reforça, fazendo mais provável (e não menos) que os credores queiram conceder-lhe novos empréstimos” (p. 48). E acrescenta: “Empiricamente, há pouquíssimas provas que confirmam a ideia de que a suspensão de pagamento leve a um longo período de exclusão do acesso aos mercados financeiros. A Rússia pôde pedir um empréstimo novamente nos mercados dois anos após a suspensão de pagamento que havia sido decretada unilateralmente, sem uma consulta prévia aos credores. [...] De longe, na prática, a ameaça de ver a torneira do crédito fechada não é real” (p. 49).
De acordo com Joseph Stiglitz, há quem pense que um dos papéis centrais do FMI é impor o preço mais alto possível aos países que quisessem declarar moratória. E muitos países se comportam como se acreditassem nessa ameaça. Stiglitz considera que erraram o caminho: “O fato de que a Argentina tenha saído tão bem da suspensão de pagamento, inclusive sem o apoio do FMI (ou talvez porque não teve o apoio do FMI), pode levar a uma mudança nesta crença” (p. 49).
Joseph Stiglitz também questiona claramente os banqueiros e outros emprestadores que concederam créditos massivamente sem verificar seriamente a solvência dos países que pedem empréstimos ou, pior ainda, que emprestaram sabendo perfeitamente que o risco de suspensão de pagamento era muito forte. Acrescenta que já que os emprestadores exigem a alguns países juros elevados em virtude dos riscos que devem assumir, é totalmente normal que tenham que enfrentar perdas devidas a uma abolição da dívida. Estes emprestadores só tinham que utilizar as taxas elevadas que recebem como provisão para possíveis perdas. Também denuncia os empréstimos “depredados” concedidos rapidamente pelos países devedores (p. 55).
Em resumo, Stiglitz defende que os emprestadores assumam os riscos de suas ações (p. 61). Ao final da sua contribuição, considera que os países que entram no caminho da suspensão de pagamento ou da renegociação para obter uma redução da dívida deveriam impor um controle temporário de mudanças e/ou taxas para inibir a saída de capitais (p. 60). Retoma a doutrina da dívida odiosa por sua conta e afirma que esse tipo de dívida deve ser anulado (p. 61). (3)
Em um artigo publicado pelo Journal of Development Economics (4) com o título «The elusive costs of sovereign defaults», Eduardo Levy Yeyati e Ugo Panizza, dois economistas que trabalharam para o Banco Interamericano de Desenvolvimento apresentam os resultados de suas minuciosas pesquisas sobre a suspensão de pagamento correspondente a cerca de 40 países. Uma das suas conclusões é a seguinte: “Os períodos de suspensão de pagamento marcam o início da recuperação econômica”. (5) Não se pode explicar melhor.
Notas:
(1) Barry Herman, José Antonio Ocampo, Shari Spiegel. Overcoming Developing Country Debt Crises. OUP Oxford, 2010.
(2) Com efeito, uma das condições do FMI quando vem em socorro de uma país à beira da suspensão de pagamento é aumentar as taxas de juros locais. Se um país fugir das condições fixadas pelo FMI, pode, ao contrário, baixar as taxas de juros a fim de evitar tanto quanto possível a falência de empresas.
(3) Joseph Stiglitz defendeu essa posição diversas vezes ao longo dos 10 últimos anos. Ver, especialmente, seu livro A grande desilusão. Lisboa: Terramar, 2002.
(4) Journal of Development Economics 94, 2011, p. 95-105.
(5) “Default episodes mark the beginning of the economic recovery”.

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