quarta-feira, 7 de junho de 2017

POLÍTICA - Eleições na Inglaterra.

 
Por Roberto Requião
 
Nesta semana, teremos eleições na Grã-Bretanha. As primeiras, depois do divórcio com a União Europeia, o brexit. Até algumas semanas atrás, dava-se como barato a vitória dos conservadores da primeira-ministra Thereza May por larga vantagem.
 
Mas, nos últimos dias, as pesquisas identificam uma rápida subida nas intenções de votos para o Partido Trabalhista, do líder Jeremy Corbyn, que pode ganhar.
 
Dizem que os Trabalhistas talvez não vençam, contudo terão uma representação no Parlamento bem maior que as mais otimistas projeções.
 
Por que a mudança, a ponto de os conservadores reorientarem o discurso para evitar a sangria de votos?
 
Simples.
 
Os trabalhistas, como disse um jornal conservador, "agitaram a bandeira vermelha".
 
Isto é, assumiram o compromisso de reestatizar as ferrovias e as empresas de energia; aumentar fortemente os orçamentos da saúde e educação; cancelar a cobrança de taxas para as universidades, já que, sob o Partido Conservador, o ensino superior passou a ser pago. E, heresia das heresias, prometeram ainda aumentar os impostos para quem ganha o correspondente a mais de 25 mil reais por mês.
 
A taxação sobre os mais ricos, segundo a proposta dos Trabalhistas, vai ter números escandinavos, ou seja, até 50 por cento da renda. Com isso, Jeremy Corbyn diz que pode aumentar os gastos públicos em valores correspondentes a 200 bilhões de reais!
 
Ao lançar esse "programa vermelho", Corbyn declarou: "Nosso país só irá trabalhar para a maioria, e não para a minoria, se os muitos, e não os poucos, tiveram oportunidades. O nosso plano de governo é para que todo mundo tenha uma chance justa de se dar bem na vida, porque o nosso país só terá sucesso quando todos tiverem sucesso".
 
Fico imaginando o horror dos 492 comentaristas de economia da Globonews e da CBN, e de todos os economistas de mercado, aboletados no Banco Central, no Ministério da Fazenda, na FIESP, na CNI e na mídia monopolista ao lerem o programa de governo de Jeremy Corbyn.
 
Veja só a ousadia do rapaz!
 
Ele quer aumentar os investimentos públicos. Ele quer estatizar empresas de transporte e de energia, cujas privatizações foram prejudiciais aos consumidores. Ele quer mais dinheiro para educação e saúde. Ele quer a volta do ensino gratuito nas universidades. Ele quer aumentar os impostos sobre a renda dos mais ricos.
 
Ele quer aumentar os gastos públicos anuais em 200 bilhões de reais!
Que perdulário, escandalizar-se-iam o Temer e o Meirelles.
 
Na semana passada, coo presidi a reunião da Assembleia Parlamentar Europa América Latina, a Eurolat, em Florença, na Itália, e vi reproduzido esse mesmo horror dos conservadores diante de propostas de políticas econômicas que fugissem da idiotia neoliberal, cuja máxima, lá e aqui é a mesma: o mundo, além de ser para poucos, já tem dono.
 
Sorry, periferia.
 
A maluquice, a esquizofrenia neoliberal é de tal ordem que, em contraposição ao meu pronunciamento na reunião da Eurolat, dizendo que América Latina e Europa deveriam abandonar as cruéis e fracassadas políticas de austeridade, viu-se o presidente do Parlamento Europeu reivindicando suserania sobre o nosso continente.
 
Assim como Mélenchon, na França, mês atrás, Pablo Iglesias, na Espanha, ano passado, não acredito que Jeremy Corbyn seja eleito. De todo modo, é um alento ver no centro promotor da desgraça neoliberal o avanço de uma proposta anti-austeridade.
 
Proposta que recupera o papel insubstituível do Estado, quer alavancando os investimentos, quer incrementando as políticas públicas de educação, saúde, transportes. Como é ainda um alento ver o Partido Trabalhista de volta à tradição socialdemocrata, depois do desastre Tony Blair-Gordon Brown.
 
Mas, parece que esses ares não refrescam a cabeça dura e insensível de nossos liberais, cujo dogmatismo torna-se a cada dia mais assustador.
 
Vejam.
 
Ainda na segunda-feira, dia 29, leio na coluna de minha amiga Mônica Bergamo, na Folha de S. Paulo, que diretores do Banco Central manifestaram temor que medidas anunciadas pelo novo presidente do BNDES, Paulo Rabelo de Castro, pudessem subverter as políticas de austeridade fiscal adotadas pelo governo Temer.
 
Destrinchando a notícia.
 
Logo que empossado, Rabelo de Castro disse, em entrevista ao "Estadão", que a sua principal missão seria a de "reanimar o setor produtivo brasileiro", voltando a financiar as empresas nacionais, já que sua antecessora, Maria Sílvia cimentara as torneiras do banco.
 
Foi um deus nos acuda.
 
Como liberar o crédito, se o governo está fazendo de tudo para equilibrar as contas, gritaram os diretores do Banco Central, descabelou-se Meirelles, apavoraram-se os economistas de mercado e os 492 analistas econômicos da Globonews da CBN.
 
Enfim, a nossa pátria amada está duplamente azarada.
 
De um lado, o fundamentalismo judiciário que ou é provocado pelo rigorismo sem causa, pelo fanatismo, que queima na pira santa não apenas os pecadores, mas também todos os seus bens, já que contaminados pelo pecado; ou o fazem de caso pensado, a serviço do Departamento de Estado norte-americano.
 
Se isso fosse, não seriam promotores ou juízes, e sim os clássicos quintas-colunas.
 
De outra parte, os fanáticos do capitalismo financeiro, que chegam à demência de impedir qualquer política de crédito à produção, para não afetar as políticas de austeridade.
 
Pois é, estamos bem arranjados. E o líder do governo nesta Casa quer ainda que a bancada do PMDB se solidarize com o presidente.
 
O presidente Temer tem direito à ampla defesa e processo legal, mas solidariedade? Solidariedade à entrega do país, a destruição dos direitos sociais?
 
Estou fora.

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