Mídia cobrirá os protestos para manter seu público fiel, por Augusto Diniz


O arrefecimento da mídia ao golpe, por que estava levando a economia à ruína, não deve fazê-la ser displicente com seu público fiel nos protestos do dia 16.
Sabe-se que parte expressiva de manifestantes contra o governo usa matérias e opiniões diárias da grande imprensa para pedir pelas redes sociais, no ambiente de trabalho ou entre amigos, o fim do governo Dilma antes de 2018.
São, portanto, leitores, ouvintes e telespectadores da imprensa tradicional. Abandoná-los ou tratar o próximo protesto com parcimônia, poderá ser visto por eles como traição.
Na verdade, a grande imprensa entrou numa cilada. Pressionada pelo poder econômico, teve que desembarcar do golpe, para não levar o País a uma situação de crise insolúvel – e que prejudicaria de forma aguda a economia e, por consequência, a si própria.
Mas a mídia vive de audiência e precisará inserir os protestos dentro de seu noticiário, para atender a esse pessoal que ela criou vínculo, ainda que de forma questionável e distante dos preceitos do jornalismo isento e plural.
A grande imprensa fará exercício de retórico no dia para encontrar um tom menos irracional e estridente contra o governo, mas terá dificuldades.
Enquanto várias vozes da oposição tentam refazer o discurso para adequar-se ao “novo pensamento” sobre o futuro do governo, a imprensa, sem muitas opções de fontes oposicionistas disponíveis, abre espaço de novo a Eduardo Cunha, que se encontra mais do que desimpedido a atendê-la.
As declarações de Cunha são bem aceitas ao sedento público da grande imprensa contra Dilma, embora o objetivo do deputado seja usar todas as suas entrevistas para se defender da Lava-Jato.
Porém, chama a atenção à dificuldade hoje da mídia em lidar com o outro lado, ou da quebra do discurso único em que se acostumou a adotar antes do acordo pela governabilidade.
A Marcha das Margaridas, que culminou nesta quarta-feira com grande protesto com 30 mil pessoas na frente do Congresso, contra Eduardo Cunha e um possível golpe, é o início nas ruas do movimento oposto às manifestações de domingo. A mídia abriu espaço ao assunto, mas já está apanhando por isso de seus seguidores.
Sobre a CUT e outras entidades de grande poder de mobilização de trabalhadores e excluídos, que entraram de cabeça (como jamais visto nesses últimos meses) contra o abreviamento do mandado de Dilma, não se tem análise clara na grande imprensa sobre o assunto – talvez por que ela não queira alimentar o contragolpe perante sua audiência cativa, que demostra ojeriza a grupos desse tipo.
Os protestos contra Dilma foram sempre inflados pela grande imprensa e muitos tiveram público expressivo por conta de sua cobertura. Na verdade, criou-se um pacto entre a mídia e sua audiência em torno do tema. Romper isso pode representar descompromisso com o seu público.
Com a economia quebrada, incentivar essas manifestações difusas tornou-se um problema para a grande imprensa. Mas trair sua audiência poderá ser também uma atitude indigna.
Assim, a opção da mídia tradicional, por certo, deverá ser cobrir com afinco as manifestações de domingo – pelo menos, será uma forma de dar satisfação momentânea aos seus seguidores, e manter relação viva com seu público alvo, em seu momento de “êxtase” pela participação na “luta” por mudanças no País, ainda que com bandeiras reacionárias e conservadoras.