sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

SAÚDE -Privatização, mais um placebo do que uma panacéia.

Por Marina Litvinsky

Os países do Norte rico e o Banco Mundial deveriam deixar de promover a privatização dos serviços de saúde nas nações pobres, devido aos maus resultados desse enfoque, alertou a organização humanitária Oxfam Internacional. O informe “Otimismo cego; Desafiando os mitos sobre a saúde privada nos países pobres” oferece abundante evidência sobre o péssimo rendimento das iniciativas de saúde conduzidas pelo setor privado em todo o mundo, defendidas durante décadas pelo Banco Mundial e pelos países doadores.

“A visão romântica sobre os serviços privados de saúde está completamente divorciada dos fatos”, disse Anna Marriott, autora do documento, de 52 páginas. “O Banco e outros doadores devem deixar para trás o otimismo cego em relação ao mercado. A atenção universal à saúde somente se consegue com a intervenção do governo nos serviços”, afirmou. O Banco Mundial costuma lamentar o fracasso dos serviços públicos de saúde nos países pobres, apesar de ser em parte responsável por isso, ao condicionar seus empréstimos ao setor estatal a reduções de gastos e ambiciosas reestruturações.

Seu argumento para promover a privatização é que agentes alheios ao Estado podem fazer um trabalho melhor. Portanto, incentiva soluções baseadas no investimento e no crescimento do setor privado. Através de condições aos seus créditos aos países pobres, e com apoio de doadores do Norte industrial, o Banco insistiu em mudanças intensivas nos sistemas de saúde, através de um enfoque conhecido como “nova gestão pública”, que constitui a tentativa de introduzir mecanismos de mercado nos serviços públicos. Assim, o Estado relega o papel de fornecedor de serviços ao regulador e comprador desses serviços.

O “Informe sobre o desenvolvimento mundial 2004: Serviços para os pobres”, do Banco Mundial, mantém esse enfoque básico: os governos devem incentivar os operadores privados a fornecer serviços de saúde a quem possa contratá-los e, por sua vez, contratar instituições sem fins lucrativos ou empresas para cobrir a demanda dos pobres. O informe da Oxfam, divulgado esta semana, constata a urgente necessidade de reavaliar esses argumentos, pois a evidência mostra, segundo seus autores, que esse enfoque deixa os pobres extremamente desprotegidos.

O Banco considera que a competição entre empresas pelos contratos do governo e para atrair os usuários ricos levaria à eficiência, à qualidade e ao acesso pleno à saúde. Mas, segundo a Oxfam, a busca do lucro determinou que os operadores privados ficassem sem incentivos para prestar serviços a quem era incapaz de pagar por eles. A Oxfam, organização humanitária de origem católica e sede em Londres, rechaça a afirmação de que o setor privado pode dar financiamento adicional aos empobrecidos sistemas de saúde pública, porque nos arriscados mercados de baixa renda trata-se de um investimento que requer significativos subsídios públicos.

Na África do Sul, por exemplo, a maioria das empresas médicas recebe um grande subsidio, via isenção de impostos, o que depende da quantidade de usuários procedentes do sistema público. Cada vez mais investigações confirmam que, apesar dos sérios problemas registrados em muitos países, os serviços financiados e proporcionados pelo Estado continuam tendo melhor rendimento e são mais equitativos, segundo o documento da Oxfam. “Graças ao aumento do gasto estatal com saúde no Sri Lanka, por exemplo, as mulheres têm expectativa de vida equivalente à da Alemanha, apesar de terem uma renda 10 vezes menor”, disse Marriott.

O Banco Mundial e os países doadores acreditam que, como o setor privado já é um fornecedor importante de serviços de saúde nos países mais pobres, seu papel deve ser central em qualquer estratégia de melhoria. Mais da metade dos serviços de saúde da África é prestada por empresas alheias ao Estado, segundo a Corporação Financeira Internacional (CFI), braço do Banco Mundial que fornece empréstimos ao setor privado. A Oxfam alertou que, segundo suas próprias estimativas, quase 40% dessas companhias privadas identificadas pela CFI são pequenos comércios que vendem medicamentos de qualidade duvidosa.

Os defensores da “nova gestão pública” asseguram que o setor privado pode alcançar melhores resultados com menores custos. Porém, o informe da Oxfam considera que, pelo contrário, seus serviços são mais caros. O Líbano, por exemplo, tem um dos sistemas de saúde mais privatizados do mundo em desenvolvimento e gasta mais que o dobro que Sri Lanka para proporcionar o serviço. Mas a mortalidade materna libanesa é 2,5 vezes superior à de Sri Lanka, e a infantil é três vezes maior. O sistema de saúde do Chile, um dos que tem maior participação privada, possui uma das maiores proporções de parto por cesariana, mais caro que o natural e frequentemente desnecessário, afirma a Oxfam. (IPS/Envolverde)

Marina Litvinsky, da IPS.
Fonte:Revista Fórum.

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