“A subnutrição no Nordeste hoje é estatisticamente igual a subnutrição na região Sul. Eu achava que era uma coisa que nos próximos 50 anos a gente não iria resolver”, diz Paes de Barros



Jornal GGN - Em 2014 o Brasil realizou um feito histórico saindo do mapa da fome da Organização das Nações Unidas. O relatório internacional apontou que o país, em dez anos, conseguiu reduzir pela metade o número da população que sofre com a fome. Um dos destaques para alcançar a meta foi a implantação do programa Bolsa Família, mas que, segundo o economista Ricardo Paes de Barros, responde por 20% do sucesso brasileiro de combate à miséria.

O professor titular da Cátedra Instituto Ayrton Senna, do Insper, foi o líder intelectual da equipe de economistas responsável pela concepção técnica do Bolsa Família, sendo considerado hoje um dos principais estudiosos de políticas sociais do país, com experiência no desenvolvimento de programas na América Latina e Caribe.

Em entrevista concedida ao apresentador Luis Nassif, durante o programa Brasilianas.org e que será exibida segunda (04/01), na TV Brasil, o professor destaca que os outros 80% do sucesso brasileiro de redução da miséria se deve a aplicação de políticas que incluíram trabalhadores pobres ao mercado produtivo, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), que concede financiamento para pequenos agricultores, e a determinação do governo de comprar produtos desses grupos através do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), para abastecer escolas e hospitais.

Para atacar a pobreza nas áreas urbanas, Paes de Barros destacou a importância da conexão do Bolsa Família com o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), e com outros ministérios, como o do Trabalho, que desenvolveu ações para esse público ingressar no mercado formal de emprego.

Pobreza hereditária

Segundo Paes de Barros,  historicamente, no Brasil, uma quantidade considerável de pessoas que sempre trabalharam, desde a juventude, e que tiveram pais e avôs também trabalhadores, permanecia na pobreza, geração após geração.

Assim, a característica da pobreza enfrentada no Brasil era diferente da pobreza em países de primeiro mundo onde, quem trabalha, dificilmente passa fome ou fica sem teto.

“Quando alguém de um mundo desenvolvido chegava no Brasil [e via essa situação] não entendia nada. Ou seja, como pode alguém trabalhar a vida inteira e ser pobre?”, pontuou, completando:

“Hoje o trabalhador pobre está cada vez mais conectado com a economia brasileira. Eles estão cada vez mais produtivos e aumentando sua renda devido ao seu próprio esforço, devido a sua própria produtividade”.

Em 15 anos, a renda dos 10% mais pobres no Brasil cresceu a taxas chinesas, ou seja, 7% ao ano; enquanto a renda dos 10% mais ricos (cerca de 20 milhões de brasileiros), cresceu até 2% ao ano, seguindo taxas típicas de países como a Suécia.

“A subnutrição no Nordeste, por exemplo, hoje é estatisticamente igual a subnutrição na região Sul do Brasil. Eu achava que era uma coisa que nos próximos 50 anos a gente não iria conseguir resolver”, destaca Paes de Barros.

Lógica do Bolsa Família

O professor conta que o Bolsa Família foi baseado em uma lógica simples. Cerca de 10% dos mais pobres no Brasil não eram capazes de responder por mais do 1% do Produto Interno Bruto (PIB). Para aliviar a situação de miséria, o governo transferiu através do programa cerca de 1% do PIB para essas famílias, dobrando suas rendas.

Em contrapartida, e para não perder a bolsa, os beneficiados devem manter suas crianças na escola  e com os exames médicos, pré-natais e carteiras de vacinação em dia. Assim, o estado de pobreza que dificultava o desenvolvimento da geração anterior por falta de educação, alimentação e saúde, é interrompido nas gerações mais novas.

Paes de Barros salienta que o Brasil ainda precisa trilhar um caminho longo para melhorar dados estatísticos e até redesenhar seus programas sociais. Mas o Estado já virou referência para outros países. Ele aposta agora no Programa Brasil Sem Miséria, carro chefe do primeiro mandato do governo Dilma, que elevou ainda mais a interação de diversas pastas ministeriais para combater a miséria, criando as portas de saída às famílias hoje beneficiadas.

Não perca, na segunda (04), a partir das 23h, na TV Brasil, a entrevista completa do professor Paes de Barros ao apresentador Luis Nassif, onde ele aponta os principais eixos do programa Brasil Sem Miséria, fazendo uma avaliação crítica das mudanças necessárias que o país necessita implementar para combater a pobreza.
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Ricardo Paes de Barros é professor do Insper, na Cátedera Instituto Ayrton Senna, engenheiro de formação, e doutor em Economia pela Universidade de Chicago, é considerado um dos principais especialistas em estudos social do país. Trabalhou no Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) durante 30 anos e foi subsecretário de Ações Estratégicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República até o segundo semestre deste ano. Como acadêmico, recebeu diversos títulos, dentre eles o Prêmio Celso Furtado em Estudos Sociais, oferecido pela Academia Mundial de Ciências (The World Academy of Sciences – TWAS).