quinta-feira, 2 de outubro de 2008

ARTIGO - Bush ainda pode aprontar alguma.

Mário Augusto Jacobskind.

Depois de ver e ouvir os analistas de sempre sobre a crise financeira em “um momento extremamente delicado”, para usar uma expressão dos próprios “especialistas” na matéria, nós, mortais, ficamos entre a cruz e a espada.

Se dependesse desses ban-ban-bans da economia, não dava para entender absolutamente nada. A preocupação dos analistas na segunda-feira logo após a recusa dos congressistas estadunidenses em aprovar os 700 bilhões de dólares de injeção de Bush ao capital financeiro era com a possibilidade de ocorrer o estouro da boiada. Isto é, depois de anos e anos defendendo o modelo neoliberal que ruiu com o carnaval especulativo, os analistas de sempre queriam a todo custo convencer a opinião pública de que sem o Proer de Bush tudo ia se acabar, o mundo rumaria para o inferno. Não querem, e não podem, dar o braço a torcer admitindo que a casa ruiu e que o mundo está entrando em uma nova etapa. Saíram até em defesa do ídolo FHC, lembrando o socorro aos bancos.

Lula, Guido Mantega, Henrique Meirelles e outros menos votados juravam por tudo que era sagrado que a crise não atingiria o Brasil em grande escala, porque a economia estava com bases sólidas etc e tal. Esqueceram (?) que como a economia brasileira está cada vez mais dependente e globalizada, uma crise com a envergadura da atual, mais cedo ou tarde se refletiria no país de uma forma difícil de prever. A crise, aliás, já está presente com a falta de créditos, segundo até Mantega já admite.

No meio da segunda-feira, os tais analistas de sempre demonstravam tanta, mas tanta preocupação com os acontecimentos, que parecia que de uma hora para outra apareceriam na pequena tela com vestimentas pretas em sinal de luto pelos graves acontecimentos no mercado financeiro. Que o digam Carlos Alberto Sardenberg e Miriam Leitão, dois dos radicais defensores da retirada de cena do Estado e defensores incondicionais de deixar tudo por conta do deus (ou será diabo?) mercado.

A crise financeira provocada pela febre da especulação, já prevista com antecedência por muitos analistas, ocorre em plena campanha eleitoral nos Estados Unidos. Embora não prevista a possibilidade, os estadunidenses se sentiriam mais reconfortados se a eleição presidencial fosse antecipada para Bush passar a faixa mais cedo para o escolhido pelos eleitores, como aconteceu na Argentina no final dos anos 80 com a crise que obrigou o então presidente Raúl Alfonsín a antecipar o fim do seu mandato em alguns meses.

Bush chegou ao fim, mas é capaz de tudo para defender os setores econômicos que lhe deram sustentação estes anos todos na Casa Branca – indústria petroleira, armamentista e os especuladores financeiros–, e não será nenhuma surpresa se algo de grave ocorrer nos próximos dias ou semanas. Bush and Cheney podem se comportar como uma cobra em seus estertores, ou seja, mesmo em fim de linha ainda tenta dar algum bote contra quem estiver à sua frente.

Nesse sentido, a América Latina poderá ser um alvo de Bush, inclusive intervindo em algum país sob qualquer pretexto. A IV Frota, que na verdade se tornou uma base militar móvel para intervir no continente em função das mudanças revolucionárias que estão ocorrendo, sobretudo na Venezuela, Bolívia e Equador, está em estado permanente de atenção. Os Almirantes falcões, golpistas por natureza, podem já estar preparando alguma surpresa. Não seria de se estranhar.

Em plena crise, estão em cena os candidatos John McCain e Barack Obama, num esquema meio cínico de sugestões para a platéia, até porque ambos já receberam milhões de dólares destes mesmos grupos financeiros que estão quebrando. Um informe da jornalista estadunidense e apresentadora do programa radiofônico "Democracy Now!", Amy Goodman, dá bem a idéia do cinismo que também se faz presente na campanha eleitoral norte-americana.

Segundo ela, em 1999 o então presidente Clinton e seu Secretário do Tesouro, Robert Rubin (agora assessor em temas econômicos de Obama), foram os principais promotores da derrubada da Lei Glass-Steagall, lei esta aprovada em 1929 depois do início da grande depressão para exatamente frear a especulação responsável pela calamidade. No Congresso, a derrubada da referida lei foi impulsionada pelo ex-senador republicano Phil Gramm, um dos ex-principais assessores de McCain.

Por estas e muitas outras, tudo o cuidado é pouco em momentos de crise como o atual. Mesmo depois, até porque não se pode prever exatamente o que vem por aí. Não se pode também ter muitas ilusões em matéria de política externa dos Estados Unidos com uma eventual troca de comando de republicanos fundamentalistas por democratas.

Já na terça-feira, Lula admitia em Manaus, quando se encontrou com Hugo Chávez, Evo Morales e Rafael Correia, que a crise financeira pode ser a pior que o mundo já conheceu. Ou seja, mesmo otimista, está começando a botar as barbas de molho.

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