domingo, 12 de outubro de 2008

ECONOMIA - Por que o Brasil não cresce? Porque o Meirelles ainda não é o presidente.

Gustavo Santos

Ao contrário do que tentam difundir certos candidatos a “sábios modernos”, economia não tem grandes mistérios. Qualquer estudante de economia sabe que existem 3 tipos de políticas macroeconômicas indutoras do crescimento: juros baixos, expansão dos investimentos e gastos públicos e câmbio desvalorizado.

Qualquer estudante sabe também que existem três tipos de políticas para redução da taxa de crescimento: juros altos, redução dos investimentos públicos e câmbio valorizado.

Qualquer estudante sabe também que, se os empresários estiverem muito otimistas e investindo muito, pode não ser necessário realizar políticas macroeconômicas adicionais indutoras do crescimento; mas se estiverem muito pessimistas ou não tão otimistas, será, sim, necessário colocar em prática políticas indutoras do crescimento. Desde que o governo tenha realmente como meta evitar a estagnação.

Essas proposições são matéria básica em qualquer curso de economia há pelo menos 55 anos. O jornalismo econômico e o debate político já as consideram triviais há ainda mais tempo.

Nesse sentido, o motivo pelo qual a economia brasileira segue estagnada é cristalino. O governo mantêm há muito tempo fortes políticas de contenção do crescimento. Essas políticas são tão firmes que mantemos-nos estagnados apesar de estarmos vivendo o período de mais rápido crescimento da história da humanidade.

As três políticas macroeconômicas são escancaradamente estagnacionistas no Brasil. A política monetária, com os maiores juros do mundo, é incrivelmente recessiva, restringindo não só os investimentos, como o consumo baseado em crediário. A política fiscal também é estagnacionista, pois ela é passiva e não permite expansões contra-cíclicas como em qualquer país civilizado.

A política cambial também é recessiva, pois manter o câmbio valorizado afunda a rentabilidade dos investidores potenciais na indústria e na agricultura. Com um câmbio super-valorizado, apenas a explosão do preço das commodities e o diferencial da taxa de crescimento brasileira com relação resto do mundo é capaz de sustentar o superávit em conta corrente.

É preciso ter claro que o câmbio brasileiro está muito valorizado e isso não pode ser captado pelo saldo em conta corrente, porque a taxa de crescimento do PIB – muito baixa para nossa necessidade – limita a taxa de crescimento das importações. Além disso, estamos vivendo um raríssimo processo de alta das commodities exportadas pelo Brasil. Esses fatores permitem que ocorra superávit em conta corrente, apesar da valorização cambial.

A elevada demanda por nossas exportações de commoditites normalmente promoveria crescimento. Porém, a reação do Banco Central (BC) de manter os juros elevadíssimos para valorizar o real e assim cumprir metas cada vez mais ambiciosas de inflação, está causando no país o chamado “mal holandês”. “Mal holandês” é um processo de desindustrialização e de recuo competitivo nos setores tecnológicos. Ele decorre da permissão de valorização cambial pelo BC em resposta a um crescimento das exportações de commodities e também, no caso brasileiro, aos maiores juros do mundo. Ele representa o efeito negativo da valorização cambial sobre o desenvolvimento, mesmo em situação de crescimento das exportações. É um mal muito comum na história da América Latina. Aos conhecedores dos princípios básicos da economia, é consensual, portanto, que as 3 políticas macroeconômicas estão direcionadas para restringir o crescimento, que seria normalmente inevitável na atual conjuntura internacional.

O recém-criado PAC é uma tentativa de alterar esse quadro. Infelizmente ele é insuficiente frente ao potencial contracionista das outras políticas. Essas políticas recessivas são todas resultado única e exclusivamente da opção do BC em manter por mais de 12 anos as maiores taxas de juros reais da história da humanidade. E, de forma oposta aos BCs do restante dos BRICs (Rússia, Índia e China), o BC não aproveita o contexto de saldo positivo em conta corrente e boom das exportações para acumular reservas no volume necessário, permitindo uma valorização cambial inédita.

A política monetária e cambial são soberanias exclusivas do BC. Em um contexto de autonomia prática para o BC, como o que estamos vivendo, a única política cujo controle estaria sob responsabilidade do governo democraticamente eleito é a política fiscal. Mas no Brasil atual, o governo não tem poder nem sobre essa política. Nesse aspecto, o governo está completamente refém do BC, pois a meta de superávit primário, tão duramente defendida pelo BC, faz com que a política fiscal seja totalmente passiva. E não é apenas a formalidade da meta de superávit que torna a política fiscal passiva. Com as taxas de juros extremamente elevadas, como as atuais, um aumento significativo do déficit nominal levaria, de fato, a dívida pública a uma trajetória explosiva, como aconteceu no primeiro mandado de FHC. O que comprometeria ainda mais a distribuição de renda. Além de colocar o governo sob pesada crítica por parte da mídia, da academia ortodoxa e dos sistemas empresariais e financeiros.

A falta de autonomia do governo em relação ao BC é agravada se levarmos em conta que qualquer crescimento acima de 4% é considerado exagerado e inflacionário pelo BC, que responde sempre a essa possibilidade com elevação contínua dos juros. Para ficar bem claro a indisposição a uma política fiscal autônoma, o BC aumentaria as taxas mais rapidamente do que usualmente faz, pois considera esse tipo de política uma desobediência às diretrizes ortodoxas que defende. Para o BC a “ousadia” fiscal precisaria ser respondida com rapidez para induzir o governo a recuar de qualquer autonomia. Recentemente, o BC demonstrou essa disposição ao cortar os juros em apenas 0,25, quando tudo indicava ampla margem para reduzir em 0,5.

Oscilar os juros dentro de um patamar ineditamente alto não é fazer política monetária ativa. Fazer política monetária significa adotar juros baixos quando o desemprego é elevado e juros um pouco maiores quando o desemprego é baixo e os salários estão crescendo rapidamente. Porém, a política monetária brasileira oscila entre juros estupidamente altos, próximo ou acima de 20%, para juros extremamente altos, como os atuais 11%.

O BC brasileiro reduz a taxa de juros como se fosse o BC suíço, desconsiderando que os juros vigentes são completamente anormais. Em qualquer país de baixas taxas de inflação, uma taxa de juros nominal de 6% é considerada substancialmente contracionista e raramente atinge esse patamar. Estranhamente, aqui o BC nem cogita aplicar esse patamar.

Nossa “política monetária” sempre é incrivelmente contracionista e, portanto, nunca impulsiona de fato o nível de atividade, que raramente passa de 4%, definido pelo BC como “teto inflacionário”. Como pode o BC estabelecer autonomamente um “teto” de 4% para o crescimento econômico quando o presidente democraticamente eleito procura atingir um crescimento de 5%? Com o controle total da política monetária e cambial e indireto da política fiscal, se for concedida autonomia formal ao BC que está aí, que autonomia terá o governo democraticamente eleito?

O Brasil não cresce porque o governo e toda a nação estão reféns de uma política monetária radicalmente conservadora. Com os juros extremamente elevados Meirelles é de fato quem determina nossa taxa de crescimento. Ele decidiu que a taxa não deve ser alta no governo Lula. Será que faria o mesmo com um correligionário?
Fonte:Blog Crítica Econômica.

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