Jornal GGN - Dilma Rousseff surpreendeu ao prometer que vai tratar da regulamentação midiática no plano de governo que apresentará à população até outubro próximo, para um possível segundo mandato. Surpreendeu, porque desde que tomou posse do Palácio do Planalto, a presidente não deu qualquer sinal de que colocaria a pauta em sua lista de prioridades. Ao contrário. É público a reação negativa de Dilma sempre que o assunto lhe era, até então, questionado. Controlar os meios de comunicação não soa, a qualquer presidente condicionado a tratar disso, como uma atitude democrática e bem quista.
A questão é que desde os tempos de Lula no poder a regulamentação da mídia é cobrada assiduamente por movimentos sociais e militantes de partidos políticos que não concordam com o monopólio da informação instituído no país nas últimas décadas. Talvez o grande problema seja que os veículos de comunicação - a quem a regulamentação não interessa nem um pouco - deturpam, com maestria, o que vem sendo discutido. Regular a mídia, em qualquer grau, é um ato associado à censura, conforme salientou recentemente o ex-ministro da Secom (Secretaria Nacional de Comunicação), Franklin Martins, durante uma aula pública sobre o tema, em São Paulo.
O cenário hostil a um debate sobre como "democratizar os meios de comunicação", entretanto, pode mudar à medida que o governo Dilma se dedica a explicar melhor o que seria essa tal de regulamentação. O primeiro passo foi dado quando a presidente disse que sua proposta será de ordem econômica, com base nos artigos da Constituição Federal que regem o tema, sem pretender violar a liberdade de geração de conteúdo, e válida somente para as mídias eletrônicas, ou seja, rádio e televisão.
Em entrevista publicada pelo Valor Econômico nesta quinta (5), Paulo Bernardo, atual ministro das Comunicações, revelou que as ideias da atual administração para a regulamentação midiática destoam um pouco das diretrizes do também jornalista e cientista político Franklin Martins - um sinal de que o debate ainda será amadurecido.
Mas, pelos pontos convergentes, é possível imaginar o que o brasileiro pode esperar de Dilma num segundo mandato quanto à regulamentação da mídia. O GGN elenca quatro propostas com base nas declarações que já foram dadas sobre o tema:
1. Regionalização do conteúdo
Pela proposta do governo Dilma, segundo Paulo Bernardo, a questão de impedir a continuidade dos monópolios e oligopólios de mídia no Brasil ainda será debatida com cautela, mas não com a importância que tem a regulamentação do artigo 221 da Constituição Federal, que prevê que o conteúdo propagado pelos meios de comunicação devem ser regionalizados.
A ideia, no caso, é criar cotas mínimas para produções locais e independentes na grade de programação das emissoras, tanto para programas de caráter noticioso como de entretenimento. Dilma instituiu norma semelhante nos canais de TV por assinatura.
Para Bernardo, essa proposta está acima da invenção de mecanismos que limitem o tamanho de grupos de mídia, como seria se o governo federal decidisse seguir o modelo de legislação da Argentina. Franklin Martins também concorda que o Brasil precisa encontrar um modelo genuinamente seu e, não necessariamente se espelhar na experiência vizinha.
2. Fim de oligopólios e monopólios
Na aula pública promovida em abril pelo Opera Mundi, Franklin Martins (que hoje atua na campanha de reeleição de Dilma) explicou que nos Estados Unidos, por exemplo, o combate aos monopólios e oligopólios da mídia foi feito a partir do questionamento da propriedade cruzada. "Isso significa que um mesmo grupo de comunicação não pode ter rádio, televisão e jornal na mesma região, tem que ser dividido. No Brasil, isso não existe. Mas ninguém considera que nos EUA isso é um atentado à liberdade de imprensa", explicou o ex-ministro.
"Há uma preocupação generalizada no mundo, nas sociedades democráticas, de botar freios que impeçam a monopolização e oligopolização da mídia. Por que? Porque se trata de algo essencial à sociedade. Mas se são poucos grupos e eles se acertam entre si, eles controlam a informação e você acaba sendo manipulado", endossou.
Já para Paulo Bernardo, é preciso, antes, discutir o conceito de monopólio. "Na época em que a Constituição foi feita, em 1988, a situação era outra, as tiragens dos jornais eram muito maiores e a audiência da TV aberta bem mais expressiva. Os conceitos daquele tempo talvez não se ajustem aos tempos de hoje", afirmou ao Valor.
3. Direito de Resposta
O único ponto que afetaria diretamente a produção de conteúdo pela mídia atual é, de acordo com Paulo Bernardo e Franklin Martins, a proposta de ajustar o direito de resposta. Embora prevista na Constituição, apenas após disputar judiciais é que os meios de comunicação brasileiros abrem espaço para isso.
"Não sou a favor da regulamentação da mídia de forma geral. Não acho que a imprensa escrita precisa ser regulamentada. Ela só precisa obedecer a algumas leis. É necessário uma lei de direito de resposta, que não existe no Brasil hoje em dia, e é necessário uma resposta que seja rápida e proporcional ao agravo. Que tenha leis que punam quando o jornal comete acessos contra alguém. Isso tem que estar na legislação, mas não precisa de regulação. Regulação é necessária para aquilo que é concessão pública, que é a radiodifusão, ou seja, rádio e televisão", disse Franklin Martins.
4. Fim da concessão a políticos
Ao Valor, Paulo Bernardo também refez uma proposta de caráter pessoal há anos conhecida: proibir que políticos e parentes até segundo grau detenham meios de comunicação. "É preciso que haja apoio social para uma proposta desta natureza ir adiante", observou.
No Brasil, isso seria uma medida providencial, tendo em vista mais de 30% das concessões de rádio e TV estão em poder de congressistas, segundo levantamento feito pela Folha de S. Paulo em 2011. O periódico apontou que especuladores, igrejas e políticos utilizam o nome de terceiros para comprar concessões de rádio e TV e, posteriormente, fazem uso político, em benefício próprio, desses meios.
À época da reportagem, Bernardo admitiu que "é mais fácil fazer o impeachment do presidente da República do que impedir a renovação de uma concessão de rádio ou TV", embora uma pesquisa dos institutos Data Popular e Patrícia Galvão, de 2013, aponte que 63% da população achem que emissoras de rádio e TV não deveriam ser propriedade de políticos.
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