Uma semana sem ler comentários de Internet, por Sakamoto

Prazer, meu nome é Sakamoto e estou há sete dias sem ler comentários

Há uma semana, eu não leio um mísero comentário no meu blog. Os leitores do bom diálogo, conservadores, progressistas ou corinthianos, que sempre passam por aqui e contribuem com os temas apresentados, talvez fiquem chateados com essa confissão, mas ela é real. E me orgulho dela.

No começo, por conta de uma longa viagem a trabalho, não tive tempo de dar uma espiada nas discussões que estavam rolando. Como aqui já disse, raramente vejo os comentários um a um, preferindo uma leitura transversal. É por que me acho a última cocada do tabuleiro? Nem tanto. Prefiro captar o espírito do conjunto, sem me ater às sandices individuais de pessoas que dizem que sou um instrumento dos Illuminati. Além do mais, isso já é suficiente para escrever mais posts sobre o comportamento na internet do que alguém é capaz de ler.

Mas vi que era possível ficar sem os comentários, assim como um fumante que, após muito sofrimento, percebe que é possível viver sem aquilo depois de ficar horas preso em um avião e, de lá, ser levado a locais sem fumódromos.

Propus a mim mesmo um desafio: uma semana sem ler não apenas a seção de comentários do meu blog mas todas as seções de comentários em blogs, sites e afins. No lugar de adesivos de nicotina e outros remédios usados na redução do vício, continuei acessando os comentários do Facebook e outras rede sociais. Até porque, convenhamos, seria pedir demais.

Por vezes, após escrever um post novo, me pegava pronto para clicar e ver os comentários do anterior (que, graças a todos os deuses pagãos, são moderados por uma competente equipe ligada ao UOL). Um vez, no automático, até cliquei, mas saí rápido ao perceber que estava começando a ver algo que não podia. Cheguei a captar algumas coisas desconexas como: “Cuba'', “idiota'' e “volta pro Japão''. Muita coisa voltou à cabeça. O processo de detox certamente sofreu um revés.

É mais difícil no começo, tenho que dizer. Ainda por cima quando você sabe que um post tem potencial de gerar bastante debate e você quer ir lá ver o que o pessoal está “argumentando''. Sabe como é: qualquer romano que, inicialmente, achava brutal o Coliseu, caso assistisse acarnificina todos os dias, acabaria por se tornar dependente de todo aquele sangue e vísceras jogados ao chão.

Mas resisti. Pelo bem da ciência e dos futuros estudos de transtornos do comportamento humano.

Lembrei-me de Ivan Pavlov, o médico russo responsável por aquela experiência que, de tão famosa, aparece até em desenhos animados. Ao alimentar um cão, ele tocava um sino. Daí, com o passar do tempo, os caninos associaram o som à comida a ponto de salivarem, mesmo sem alimento, quando ouviam o barulho. Enfim, todos nós podemos ter nossos reflexos condicionados.

De certa forma, ao clicar na caixa de comentários, meu espírito já se aquecia, esperando rir ou me assustar com alguma tosqueira. Uns chamariam esse aquecimento de reflexo condicionado. Eu prefiro encarar como vestir uma armadura para enfrentar o mal.

Da mesma forma, não li os comentários de outros blogs que sigo à esquerda e à direita, de notícias ou reportagens, de sites de humor e de interesse geral. Se por um lado, perdi parte da experiência de construção coletiva da rede, no qual a interação do leitor com o texto provocador exerce um papel central, por outro me sinto mais leve. A ignorância é um lugar quentinho, não nego. Mais do que isso: uma benção. E foi ótimo se aninhar no silêncio longe do bate-estacas, mesmo sabendo que o barulho continuava lá.

Até porque, desconfio, que à medida em que nos aproximamos das eleições, as caixas de comentários vão se tornar cada vez mais espaços selvagens, em que o único requisito para frequentá-las é deixar a interpretação de texto, a razão e a capacidade de empatia com o semelhante do lado de fora ao entrar.

Conversando com um psiquiatra sobre os processos de dependência química e social, ele disse que as recaídas podem ser mais avassaladoras do que a situação anterior. Decidi pegar leve.

Portanto, hoje de manhã, dei só uma olhadinha. De canto de olho, quase que sem querer.

Constatei que o distanciamento me deu uma nova perspectiva.
Daí, após muito refletir, resgatei o que um sábio professor disse a uma turma de universitários diante de barbáries e sandices, muitos, muitos anos atrás, mas que ainda serve de referência para a natureza dos nossos dias: Afe!