POLÍTICA
Julian Rodrigues: A juíza representante das classes dominantes e o vereador que luta contra todos os tipos de opressões
A juíza de Florianópolis e o vereador de Curitiba
Por Julian Rodrigues*
E se esse mesmo deputado
Defender a adoção da pena capital
E o venerável cardeal disser que vê tanto espírito no feto
e nenhum no marginal ?
(Caetano Veloso – Haiti)
Joana ou Renato?
Santa Catarina. Joana Ribeiro Zimmer (juíza) – juntinha com Mirela Dutra Alberton (promotora) oprimiram, torturaram e tudo o mais fizeram para aniquilar a dignidade de uma criança de apenas 11 anos.
Estuprada, essa menina engravidou. Desesperada, a mãe foi atrás de salvar a filha.
Reportagem do The Intercept Brasil detalhadamente conta e mostra a via crúcis dessa pequenina brasileira. E escancara o horror que é nosso atual “sistema de justiça”.
“Dois dias após a descoberta da gravidez, a menina foi levada ao hospital pela mãe para realizar o procedimento [interrupção legal da gestação]. O Código Penal permite o aborto em caso de violência sexual, sem impor qualquer limitação de semanas da gravidez e sem exigir autorização judicial. A equipe médica, no entanto, se recusou a realizar o abortamento, permitido pelas normas do hospital só até as 20 semanas. A menina estava com 22 semanas e dois dias”.
A violação dos direitos dessa criança se inicia aí, com tais médicos. Provavelmente um bando de homem branco velho machista (bolsominions) – mas é isso um mero palpite, embora que seria bem típico, aliás.
A juíza em questão trata a menina estuprada como mera fêmea parideira, chocadeira ambulante ou algo do gênero – é repugnante.
Não recomendo à saúde mental de ninguém assistir ao interrogatório macabro conduzido pela senhora “magistrada”.
Trata-se da prolongada tortura de uma criança. Sim, é isso mesmo.
Grande alerta vermelho. Diz tudo sobre a fascistização de boa parte do nosso Judiciário (e Ministério Público).
Ocorre que não se trata só do reacionarismo insensível da jovem loira magistrada catarinense, a Joana (parceirinha da promotora Mirela Dutra Alberton).
Uma desembargadora, magistrada de segunda instância – Cláudia Lambert de Faria – se negou a tirar a menina estuprada do abrigo ao qual havia sido confinada pela loiraça fake, nossa sábia, a Ribeiro Zimmer – que, registre-se de novo, realizou o desejo da promotora. Três senhoras do bem – afinal das contas.
A mega ponderada, empática e sensível (contém ironia) juíza chegou a nomear um “curador do feto”. Sim. É isso mesmo.
Posições políticas ou ideológicas à parte, a medicina é unânime em destacar o altíssimo risco que uma criança de 10 anos enfrenta ao tentar completar uma gravidez ( e vamos repetir: fruto de estupro, estupro, estupro, estupro, estupro, estupro).
É sempre baixíssima a probabilidade do parto ser bem sucedido, resultando no nascimento de um bebê saudável.
Mas será que um feto deve ter mesmo ter tantos e tão supremos direitos? Ou as decisões da juíza em tela são motivadas por outros valores morais, políticos e ideológicos?
Qualquer embrião em desenvolvimento deve ter mais proteção do Estado do que uma mulher adulta e violentada, que gerou e carrega no seu próprio ventre esse amontoado de células?
A promotora, a juíza e a desembargadora catarinenses acharam que sim. Acreditam que uma mulher grávida não tem nenhum direito, só o embrião ou feto – mesmo oriundos do esperma de um estuprador, os tem.
Mas nem mesmo um tiquinho de dignidade há de merecer uma criança brutalmente violentada? Pergunta direcionada – com repulsa e asco especialmente às vossas excelências Joana (juíza) e Cláudia (promotora).
Não sei em quem essas três operadoras do direito votaram em 2018. Apenas posso imaginar – enquanto sigo chorando pela menina duplamente violentada.
A propósito: sua majestade togada, a senhora Joana Ribeiro se negou a comentar o caso – pretensamente indignada pelo vazamento das imagens da audiência. Sim, aquela mesma na qual essa juíza torturou a menina gestante, vítima de estupro.
A carne mais barata
Renato Freitas, apesar de ter nascido em Sorocaba – e ter só 38 anos- é curitibano, de fato e de direito.
Aparenta ter uns 25, no máximo.
O moço petista preto virou vereador em 2018. 5 mil votos, um mestrado mais um lindo cabelo black power. Em Curitiba.
É, lá mesmo, no berço do lavajatismo – na branca e conservadora capital do Paraná. Um feito por si só.
Renato é fã de rap, graduado e mestre em direito pela UFPR, filho de um pai que foi encarcerado – e morreu aos com pouco mais de 30 anos, igualzinho ao seu irmão mais velho (assassinado com um tiro na cabeça).
Em junho do ano passado, Freitas ficou 3 horas em cana. Motivo: estava jogando basquetebol em uma praça e foi denunciado. “Perturbação do sossego” era a alegação. Os PMs o prenderam por “atrapalhar o procedimento da polícia”. Tudo registrado em vídeo.
O incômodo da burguesia curitibana com a força e representatividade do vereador petista é um negócio que mereceria até uma pesquisa acadêmica detalhada. Além de regozijo e divulgação.
Renato é um alvo.
Como também os foram Marielle Franco, Bruno Pereira, Dom Philips e Margarida Alves.
E como ainda o é Lula – junto com todas pessoas que se colocam de pé – enfrentando as classes dominantes neoliberais neofascistas.
Renato Freitas não poderia nunca ter pisado ali, naquele salão chic da Câmara de Curitiba.
Nem ser um preto tão inteligente, preparado, carismático e com voto. Ainda, muito menos ainda, sendo um mero petista. Foi demais.
Perseguição, isolamento, difamação. Até que os vereadores curitibanos cassaram o mandato de Freitas.
Zimmer e Freitas
Mas o que tem a ver uma coisa com outra- Renato e Joana?
Tudo. Ou nada, a rigor – a despeito de ambos serem de estados do sul do país, com idades aproximadas, atuando no ramo do Direito.
A juíza de Santa Catarina é uma personagem nefasta que representa o que há de mais atrasado, autoritário, regressivo e machista no sistema de justiça nacional.
O vereador de Curitiba, que incomoda em demasia seus pares, simboliza o que há de mais avançado, progressista e democrático no Brasil.
Ocorre que enquanto Renato está a lutar contra a violência e por cidadania, Joana parece ter prazer em violentar e revitimizar uma menina de apenas dez anos.
Freitas, progressista, luta contra as opressões de todos os tipos, por dentro e por fora – do sistema e do Estado.
Zimmer é opressora e autoritária, representante das classes dominantes. Com cruel gozo segue exercendo seu micro poder nesse mesmo Estado.
*Julian Rodrigues é jornalista e professor – mestre em ciências sociais, ativista de Direitos Humanos e LGBTI, doutorando em América Latina pelo Prolam/USP.
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