sábado, 31 de dezembro de 2022

Não é ingratidão.

 

Não é ingratidão: é o sistema e a realpolitik, por Luis Nassif

Faz parte da lógica do poder, a quem chega procurar apenas os órgãos da mídia corporativa.

Não sei quanto tempo dura. Mas, agora, Lula e seus Ministros se tornaram sistema, mais ainda do que em 2003, quando assumiram sob desconfiança. Agora, depois da ameaça Bolsonaro, Lula se tornou a esperança não apenas dos mais pobres, mas da Globo. Por isso, ele, Ministros e segundo escalão estarão cada vez mais à disposição da Globonews e outros canais, e cada vez menos para os canais alternativos.

Nem os tome por orgulhosos: faz parte da realpolitik, embora o excesso de ego contamine os perfis mais fracos. Eles precisarão eliminar as desconfianças do sistema, alimentadas por  vinte anos de fake news disseminados por esses mesmos veículos, imputando a Lula propósitos castristas, chavistas, bolivarianos ou qualquer outra bobagem, sabendo que não era.

Uma entrevista para a Globonews vale mais do que uma coletiva para blogs, pela abrangência e pelo público – mercado e outros, de fora da bolha.

Está certo que o aggiornamento foi muito rápido. Para a cerimônia de posse houve convites para influenciadores, mas não para blogueiros. Achei bom: influenciadores falam para milhões, blogueiros falam para bolhas. Na última hora, acharam que era excesso de ingratidão e enviaram convites para blogueiros, para a cerimônia no Itamaraty. Os convites foram enviados no dia 30, para confirmação no dia 30, e retirada pessoal do convite no dia 30.

O diabo é sábio por ser velho, já dizia o ditado. A vantagem da idade é a experiência. Assisti esse mesmo processo desde que os Cruzados chegaram ao poder. Antes, o espaço na mídia lhes era aberto por meia dúzia de jornalistas que jogavam na contramão, sempre procurados por eles para suas mensagens. No Poder, passam a dar atenção apenas aos grandes veículos. 

Lembro-me apenas de uma exceção, o ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser Pereira. Eu já estava fora da Folha e tinha apenas o programa na TV Gazeta. Bresser marcou uma coletiva na sua casa. Cheguei atrasado com a sala tomada por jornalistas. Bresser me viu e me chamou para uma cadeira ao seu lado, que ele tinha guardado para mim.

Mas Bresser é Bresser, é único.

Repito: faz parte da lógica de poder. E, no caso de jornalistas que saltaram do ódio mais entranhado à admiração mais incontida por Lula – seguindo a orientação da casa -, é questão de caráter.

Novos tempos

Mesmo assim, não há motivos para ressentimentos. A luta dos últimos 6 anos não foi por Lula, pelo PT, mas pelo Brasil, pela defesa da democracia. Lula foi apoiado porque representa a esperança na recuperação da democracia e da justiça social. 

A melhor contribuição para o país, agora, será o apoio crítico a Lula, a crítica quando se desviar dos objetivos sociais, quando ceder muito ao mercado.

A propósito, passou despercebido uma decisão das mais relevantes: a criação de um conselho com três representantes de movimentos e meio ambiente, para servir de orientação a cada Ministério.

Lá atrás, quando Lula transformou secretarias sociais em Ministérios, a idéia era lhes conferir status para colocar a marca social em cada projeto dos ministérios fortes. Agora, os conselheiros sociais passam a fazer parte de cada ministério.

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