O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva tem mantido a calma nos dias que antecedem a sua diplomação para o cargo, num contraste com a ansiedade dos agentes políticos e do mercado financeiro para conhecer quem vai suceder Paulo Guedes. A torcida por Fernando Haddad é evidente dentro do círculo próximo a Lula, mas interlocutores do ex-prefeito de São Paulo não cravam 100% que seu lugar será no Ministério da Fazenda. “Ninguém sabe exatamente o que Lula tem em mente”, diz à coluna uma fonte próxima a Haddad.
O mistério terá fim na próxima semana, quando as nomeações vão se tornar o grande fato político. A expectativa é que os nomes sejam conhecidos logo após a cerimônia de diplomação no Tribunal Superior Eleitoral, no dia 12 de dezembro, quando Lula e Geraldo Alckmin serão confirmados presidente e vice eleitos.
Haddad já está participando das reuniões do grupo de economia da equipe de transição desde a semana passada. Nesta segunda, 5, ele chegou a Brasília para se reunir com Lula, sem deixar claro sobre qual seria o assunto. “É para falar de assuntos econômicos ou outras questões?”, perguntou um repórter do G1. “Estou tratando disso agora”, respondeu despistando o potencial ministro.
Desde que a transição começou, o candidato derrotado ao governo de São Paulo tornou-se uma espécie de coringa para o ministério de Lula, com credenciais para ocupar outras pastas, além da Economia. Formado em direito, com mestrado em economia, e doutorado em ciência política, já foi cotado para o Itamaraty, Educação e para o Planejamento.
Há quem considere esta última pasta como a mais indicada para o seu perfil de formulador de políticas públicas. Nesse caso, as reuniões com a equipe econômica fariam sentido, uma vez que o Planejamento organiza as políticas de gestão da administração federal e atua próximo à Fazenda.
Mas sua passagem como prefeito de São Paulo, quando conseguiu renegociar dívidas da cidade com a União — que caiu de R$ 80 bilhões para R$ 30 bilhões em sua gestão (2013-2016) — e garantiu investimento recorde para a capital paulista, seria o melhor cartão de visita para se perfilar ao cargo na Fazenda. “Ele é um ótimo nome, de integridade moral, e deixou marcas importantes em sua passagem como prefeito da maior cidade do país, além da passagem exitosa no ministério da Educação”, defende o advogado Marco Aurélio de Carvalho, líder do grupo Prerrogativas, que integra a equipe de Justiça e Segurança Pública no governo de transição.
Apesar disso, seu nome desperta resistência entre agentes financeiros, pelo temor da politização da economia em nome do 'social'.
No final de novembro, Haddad negou que tenha sido convidado para ser ministro da pasta que Guedes está deixando. Ele também negou em 2018, até o último minuto, que poderia vir a concorrer à presidência no lugar de Lula, preso em abril daquele ano. Ao fim, foi cabeça da chapa e concorreu com Bolsonaro, sendo derrotado no segundo turno.
A semana é decisiva para os petistas, incluindo a votação sobre o orçamento secreto no Supremo Tribunal Federal, que começa nesta quarta-feira. O núcleo lulista cruza os dedos para que o instrumento seja derrubado pela Corte para garantir margem de manobra na negociação junto ao Congresso. O presidente da Câmara, Arthur Lira, do PP de Alagoas, sabe o poder que tem a perder com o fim da chamada emenda do relator, que garantiu a distribuição de verbas entre aliados e manter a influência na Casa. O orçamento secreto, porém, ajudou a desorganizar as contas públicas e a encurtar o cobertor para políticas sociais.
PEC dos Gastos
É fato, ainda, que para garantir a gestão no ministério que for, o governo eleito precisa da aprovação da PEC do Teto de Gastos para acomodar o orçamento do Bolsa Família e suprir todas as carências e lacunas que a administração Bolsonaro está deixando. O orçamento de 2023 preparado pela equipe de Guedes, por exemplo, não contempla R$ 600 como benefício social, somente o pagamento de R$ 400 a partir do ano que vem.
Faltam verbas para quase todas as pastas, para aposentadorias, para universidades e até para combate às queimadas na Amazônia, como vêm constatando os integrantes do governo de transição. Mas, uma das faltas de recursos mais sensíveis são para as áreas que atendem as políticas sociais, voltadas aos brasileiros mais carentes: o grande eleitorado de Lula.
Uma nota técnica elaborada por consultores do orçamento da Câmara dos Deputados mostra o potencial de criar uma armadilha para Lula, caso o plano prometido durante a campanha de pagar R$ 600 de Bolsa Família nos próximos quatro anos seja concretizado, ainda mais com o acréscimo de R$ 150 por filho. Os R$ 600, aliás, se tornaram praticamente obrigatórios para garantir a redução da pobreza que se alastrou no país, segundo o economista Marcelo Neri, diretor da FGV Social: o Brasil passou de 50,9 milhões de pessoas pobres em 2020 para 62,5 milhões em 2021, como divulgou o IBGE na semana passada.
Há, ao menos, 8 projetos sendo discutidos para acomodar a responsabilidade social e fiscal do próximo governo, com boa vontade de parlamentares para corrigir o aumento da pobreza deixada pelos anos Bolsonaro.
Se não houver alguma alternativa para controlar as despesas extras, a dívida pública saltaria de 79% para quase 90% — um veneno para qualquer retomada econômica, uma vez que ficaria condicionada à emissão de títulos públicos e juros mais altos. Nesse caso, nem Haddad nem nenhum super ministro, pró-mercado ou não, seria capaz de garantir uma perspectiva de crescimento da economia. |
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