sexta-feira, 21 de junho de 2024

Cobrando a juros

 


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Sex, 21/06/2024 08:09

Brasil de Fato


por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile


21 de Junho de 2024

Cobrando a juros

Olá, as forças progressistas foram às ruas e tiraram o governo das cordas, mas o Banco Central insiste em ser a última barricada da reação.

.Não há mal que nunca acabe. Quem imaginaria que mobilizações a favor do aborto legal derrotariam a direita no Congresso e bagunçariam o jogo viciado de Arthur Lira? O movimento de oposição ao PL do Estupro, liderado pelas mulheres, não só ganhou a sociedade, mas também mostrou que não é proibido enfrentar e discordar dos chamados “temas morais”, como aliás é possível vencê-los. O fato inesperado pegou todos de surpresa e deu alento ao governo e à esquerda, que descobriram que a sociedade não está inerte e imune a disputas. A prepotência e o erro de cálculo da extrema-direita pode ter respingado inclusive na bancada evangélica, facilitando a substituição da linha dura por uma liderança de “perfil mais light”. Mas quem teve mesmo que administrar a derrota foi Arthur Lira, que adiou a votação do PL para o segundo semestre, uma saída honrosa para não admitir uma derrota acachapante. O problema é que o estrago já estava feito e abalou os rumos do processo de sucessão à presidência da Câmara. A possível perda do controle fez com que o cacique alagoano caísse no improviso e no desespero, tirando da gaveta a PEC da Anistia para tentar angariar o apoio das lideranças partidárias no Congresso, mas acabou sendo derrotado dessa vez pelo Senado que não quis compartilhar o ônus de levar adiante uma medida tão impopular. E, como em política uma derrota nunca vem sozinha, o STF em breve voltará a analisar o orçamento secreto. Com tudo isso, o governo acumulou forças para novas batalhas, e a vitória no tema do Ensino Médio foi um suspiro de alívio depois de uma sucessão de reveses no Congresso. O susto com o PL do Estupro fez Lira voltar-se para as pautas econômicas e a regulamentação da reforma tributária pode sair do papel. Lula pode comemorar, ainda, um pequeno aumento na popularidade, o que talvez seja reflexo tanto da recuperação econômica no primeiro trimestre, quanto da resposta contundente do governo à crise no Rio Grande do Sul.

.Nem bem que sempre dure. A ofensiva progressista ainda permitiu ao governo entrar na briga que sempre lhe interessou, a economia. Por um lado, o debate do PL do Estupro ofuscou a cantilena da mídia e do mercado por cortes nas àreas sociais para garantir a meta fiscal. Por outro, o Planalto começou a semana invertendo a discussão e mudando o foco dos futuros cortes para os polpudos subsídios fiscais, como os que recebem o agronegócio. Sozinhos, os ruralistas consomem 11,52% dos gastos da União, deixando de pagar R$59,7 bilhões em impostos em 2023. Mas a cereja do bolo foi a derrapada de Vossa Santidade Campos Neto, mandando às favas o falso argumento do mercado de que o Banco Central é politicamente autônomo, sendo homenageado pelo governador de São Paulo e confessando que aceitaria ser ministro da economia num hipotético governo Tarcísio de Freitas. Lula aproveitou a deixa para dar um chega-pra-lá no adversário e voltar à carga pela redução dos juros, animando os parlamentares petistas à ofensiva. Porém, na reunião do Copom, o governo optou pela cautela e os diretores indicados por Lula endossaram a interrupção da queda dos juros por unanimidade. Cautela, porque o mercado não estava brincando com a chantagem e ameaçava levar o dólar a patamares mais altos e o governo preferiu não pagar para ver. Cautela também porque por trás de toda pressão da mídia e da Faria Lima está a pressa em manter a economia como lhes interessa enquanto controlam o presidente do BC, cujo mandato se encerra em dezembro. Lula deve anunciar o sucessor de Campos Neto em agosto. A escolha por uma votação unânime no Copom preservou dois dos candidatos, os diretores Gabriel Galípolo e Paulo Pichetti, antes que fossem queimados por antecipação pelo mercado. O grau da disputa com a Faria Lima também tem levado Lula a considerar nomes mais experientes, como o ex-diretor do BC Luiz Awazu ou o presidente do BNDES Aloizio Mercadante. 

.Ponto Final: nossas recomendações.

.O massacre de Nuseirat. No Outras Palavras, Jeffrey St. Clair analisa o maior ato de terror cometido por Israel desde o início do genocídio em Gaza. E na Pública, confira a entrevista com o jornalista e quadrinista Joe Sacco.

.De quem é essa guerra? Na Ucrânia, Natália Viana detalha quem são os mercenários que lutam uma guerra terceirizada. Na Agência Pública.

.Políticas pró-mercado da "terceira via" causaram um desastre eleitoralNa Jacobin, a socióloga Stephanie L. Mudge analisa como o neoliberalismo acabou com a social-democracia.

.Haddad e financismo: uma conexão incômodaNo Outras Palavras, o economista Paulo Kliass analisa a “condescendência civilizada” de Fernando Haddad com o mercado.

.O fenômeno El Niño chegou ao fim. O que vem depois? O Nexo traz projeções climáticas nada otimistas para os próximos meses. E na CNN, veja o estudo que mostra que um em cada quatro hectares do Brasil queimou entre 1985 e 2023.

.Brasil Paralelo mira Geografia e Ciências Sociais após curso que desinforma sobre História. Na Agência Pública, como a produtora audiovisual de extrema-direita quer formar a “próxima geração” de professores.

.Mônica de Menezes: conheça a primeira diplomata negra brasileira. O Nós recupera a trajetória da primeira diplomata preta brasileira em plena ditadura militar.

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