29 de Julho de 2022
A hora da saideira
Olá, depois de quatro anos de tolerância e cumplicidade, será que finalmente o PIB se cansou do capitão? Leia esta edição ouvindo Martinho da Vila.
.Sozinho na mesa. A semana está terminando melhor do que começou. Ao que parece, o plano de Bolsonaro para agosto era aumentar a temperatura e manter o caldo fervendo até o 7 de setembro, que seria uma espécie de ensaio geral de mobilização para atropelar as eleições de outubro. Mas tudo deu errado antes mesmo de começar. Ainda no domingo (24), o lançamento da candidatura do capitão fracassou, sem conseguir juntar 13 mil gatos pingados no Maracanãzinho. Apesar disso, ignorando o script feito por aliados que esperavam um discurso moderado, mais uma vez Bolsonaro elevou o tom e fez ameaças. Foi o suficiente para que os ministros do STF, alvos preferidos dos ataques, sentissem cheiro de blefe no ar. Talvez essa tenha sido a saideira, pois sem forças para sustentar o tom do discurso golpista, Bolsonaro conseguiu o que até então parecia improvável: comprometer o alto PIB brasileiro com a lisura do processo eleitoral e ao mesmo tempo emparedar os militares que flertavam com a aventura. A “Carta aos brasileiros”, que já conta com centenas de milhares de assinaturas, incluindo representantes da elite econômica, intelectual e jurídica do país, ainda reforça o clima de Diretas Já para a eleição de outubro, reeditando o ato simbólico de dissidência com a ditadura em 1977. Com tudo isso, é claro que os responsáveis pela campanha de reeleição viram que o enorme erro de cálculo pode custar caro. Antes de tudo, o sonho de um golpe pode ter sido enterrado de vez e Bolsonaro será obrigado a aceitar as regras do jogo eleitoral. Os aliados contam agora que as pesquisas eleitorais façam o capitão voltar atrás e usar o 7 de setembro para fazer campanha e não para aumentar ainda mais seu isolamento. Ao que parece, apenas a PGR insiste em permanecer fiel ao capitão, engavetando as investigações de crimes cometidos durante a pandemia. Enquanto isso, prevendo o pior, aliados no Congresso já articulam uma PEC salvadora que daria imunidade e foro privilegiado vitalícios a Bolsonaro para que ele não acabe na prisão.
.Pagando a rodada. Mesmo que a Carta aos brasileiros não pretenda afiançar a candidatura Lula e sim traçar uma linha do que o mercado considera aceitável na disputa política democrática, de alguma forma o fracasso da operação de Bolsonaro fortalece o petista. Com os insistentes arroubos golpistas, também os 12% de eleitores da “terceira via” podem mudar de opinião, fazendo do voto um espécie de seguro anti-autoritário, o que garantiria uma vitória do petista no primeiro turno. Além disso, Lula já exibe uma significativa vantagem de 23% entre os eleitores mais jovens, 18% entre as mulheres, e 23% entre os mais pobres em relação ao capitão. Seguindo a linha de “jogar parado”, Lula tem sido discreto, deixando o protagonismo para as instituições e signatários da Carta, o que também reforça a ideia de que a chapa Lula-Alckmin é uma frente ampla pela democracia, acima de antagonismos, que aposta na polarização política, mas não pela via do confronto. Mas também não joga tão parado assim. Além de ganhar a eleição e tomar posse, Lula já mira na governabilidade. Ainda que a operação para inviabilizar a candidatura de Simone Tebet não tenha funcionado, a porta para que o MDB se some à nova base governista no próximo ano mantém-se aberta. Da mesma forma, o PT sonha também com o PSD e até com o União Brasil. Não à toa. Fora os parlamentares, MDB e União Brasil têm também o maior número de governadores competitivos nas eleições estaduais. Além da prevenção contra um terceiro turno bolsonarista de desestabilização, a governabilidade com apoio de parlamentares e governadores será imprescindível para o próximo desafio que Lula precisará enfrentar: recuperar uma economia em frangalhos, sem recursos, no meio de uma crise global.
.Ponto Final: nossas recomendações.
.A permanente crise da América Latina: agora é a vez da Argentina e do Panamá. Bruno Lima Rocha analisa os mecanismos de desigualdade que aprofundam a crise no continente.
.O melhor prefeito do mundo é um comunista francês. A Jacobin entrevistou o prefeito comunista que está recuperando uma cidade no subúrbio de Paris com programas sociais.
.Apple, Google, Microsoft e Amazon usaram ouro ilegal de terras indígenas brasileiras. Na Reporter Brasil, Daniel Camargos rastreia a trilha do ouro ilegal da Amazônia até os produtos das transnacionais de tecnologia.
.Como uma rede de políticos articulou ataques virtuais contra professores em SC. A Agência Pública revela como servidores e políticos catarinenses perseguem e ameaçam professores e estudantes nas redes sociais.
.Documentos inéditos indicam que Crematório da Vila Alpina foi planejado para ocultar cadáveres da ditadura. O Intercept recupera a história do crematório e dos cemitérios clandestinos da Ditadura em São Paulo.
.Chacinas e criação de movimentos sociais de mães no RJ. O infográfico do Diplô Brasil registra 32 anos de chacinas no Rio e a construção dos movimentos sociais de mães no estado.
Um marxista na constituinte. A Jacobin Brasil relembra o histórico discurso de Florestan Fernandes em 1987, em que defende o socialismo como via para a superação do modelo capitalista dependente e periférico brasileiro.
Acompanhe também os debates políticos no Tempero da Notícia e diariamente na Central do Brasil. Você pode assinar o Ponto e os outros boletins do Brasil de Fato neste link aqui.
Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Nenhum comentário:
Postar um comentário