Nas
declarações de candidatos à Presidência ou de seus assessores nem tudo é dito
às claras. Remédios amargos são omitidos, mesmo que estejam nos planos. Mas não
há como evitar o debate em torno a certos temas.
Nesse quadro, a Previdência, com seu suposto déficit, e a fórmula para a correção do salário mínimo foram trazidas à discussão, ainda que da forma oblíqua usada quando se trata de retirar direitos ou vantagens das pessoas.
Vejamos o primeiro caso, a Previdência.
O aumento da expectativa de vida das pessoas faz com que elas tenham que ser sustentadas por pensões e aposentadorias durante mais tempo. Assim, a equação de despesas e receitas do sistema tem que ser acompanhada ao longo do tempo, pois a ninguém interessaria quebrar a Previdência.
Por isso, não se discute que os cálculos atuariais tenham que ser atualizados regularmente, para que se mantenha o equilíbrio do sistema. Isso ocorre tanto no Brasil, como no resto do mundo.
Mas – atenção! - não se pode comprar gato por lebre. O propalado déficit na Previdência brasileira não existe. É fruto de um truque estatístico, que não leva em conta fontes de receita para a Seguridade Social previstas na Constituição.
Vale a pena ver isso de perto.
A partir de 1988, com a nova Constituição, os trabalhadores rurais foram incorporados ao rol de beneficiários da Previdência. Até então, isso não acontecia. A medida, justíssima do ponto de vista social, acarretou um custo adicional para o sistema, pois os trabalhadores rurais não tinham contribuído ao longo da vida. Por isso mesmo, a própria Constituição apontou novas fontes de receita para a Seguridade Social, de forma a equilibrar o sistema: a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e um percentual de concursos de prognósticos (loterias).
Assim,
não se pode falar em rombo na Previdência simplesmente comparando-se a receita
obtida com a contribuição de empregadores e empregados e a despesa com
pagamento de benefícios, sem se levar em conta as novas fontes de receita.
Mas é
isso o que fazem os que acenam com o suposto déficit da Previdência e com a
necessidade de novas medidas que prejudiquem os trabalhadores. Não computam as
demais fontes de receita previstas na Constituição de 88.
Há,
ainda, outro problema: a chamada Desvinculação das Receitas da União (DRU).
Criado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em 1994, com o nome de Fundo
Social de Emergência, a DRU permite retirar até 20% dos recursos originalmente
previstos no Orçamento de uma determinada destinação. Assim, um quinto do
destinado à Seguridade Social (onde está a Previdência) tem sido subtraído para
engrossar o superávit primário, a reserva usada para pagamento dos juros da
dívida pública aos banqueiros.
Pois bem,
sem que sejam computadas todas as receitas e subtraindo-se 20% dos recursos
destinados à Previdência, aí, sim, temos déficit. Mas, como se vê, é um déficit
fictício, fruto da manipulação de dados.
Foi esse
suposto déficit que levou à criação, no período FHC, do tal Fator Previdenciário.
É um mecanismo perverso incluído nos cálculos do valor dos benefícios pagos a
aposentados e pensionistas, que diminui em até 30% o seu montante.
Por isso,
com razão, as entidades de trabalhadores reivindicam a sua extinção. E, perto
de eleições, volta e meia um candidato fala em extingui-lo. Foi o que fez,
recentemente, Aécio Neves, numa reunião com sindicalistas.
Depois,
advertido por seus economistas, o tucano recuou. Disse que não se trataria de
extinguir o Fator Previdenciário, mas de estudar, com cautela, um mecanismo que
o substituísse.
Ora,
vamos falar claro. Qualquer outro mecanismo de compensação do Fator
Previdenciário que parta da premissa de que a Previdência tem um rombo e que se
proponha a enfrentá-lo com o aumento do valor das contribuições, com a
diminuição dos benefícios ou com a prorrogação do tempo de contribuição vai
prejudicar os trabalhadores.
O Fator
Previdenciário é injusto. Baseia-se na falsa premissa de que a Previdência está
quebrada. Ele deve ser extinto, e não substituído por outro mecanismo
igualmente perverso.
Outra
questão levantada por economistas ligados a Marina Silva e a Aécio, que também
afeta a Previdência, é o salário mínimo. Ele estabelece um piso para os
trabalhadores que ganham menos, além de servir de indexador para o rendimento
de muitos outros. É também o piso dos benefícios pagos pela Previdência a cerca
de 20 milhões de pessoas (70% dos atendidos por ela).
O aumento
do poder de compra do mínimo – significativo nos últimos anos – foi responsável
pela inclusão social de milhões de brasileiros. Ainda está longe do valor
calculado pelo Dieese como necessário para prover o sustento de uma família
(que é de dois mil, oitocentos e sessenta e um reais), mas sua valorização foi
essencial para uma melhor distribuição de renda.
Ela fez
com que não só melhoraram de vida os que recebem o mínimo, mas também os que
ganham um pouco mais e têm os rendimentos empurrados para cima cada vez que ele
é aumentado. Isso, numa sociedade tão desigual como a brasileiro representou um
avanço considerável.
O
reajuste do salário mínimo é calculado tendo-se por base a inflação do último
ano, acrescida do índice de crescimento do PIB dos dois anos anteriores.
Acenando
com a pressão trazida pela valorização do mínimo sobre a Previdência (e sempre
usando o suposto déficit desta última) economistas neoliberais ligados a Aécio
querem mudar o cálculo de reajuste, de forma a interromper (ou a diminuir) a
recuperação de seu poder de compra.
O custo
social disso seria altíssimo.
Não pode
ser aceito, na hipótese de uma vitória eleitoral do candidato tucano.
Como se
vê, o suposto déficit da Previdência está sendo usado para justificar
“maldades” variadas contra o povo brasileiro.
Quem acha
que uma vitória eleitoral de Aécio não prejudicaria os trabalhadores deve estar
atento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário