A crise no sistema financeiro mundial é muito séria, está apenas começando, mas não deve pegar o Brasil muito forte. A avaliação é do ex-diretor do Banco Central Luís Eduardo Assis, que atualmente chefia a área de integração de negócios do banco HSBC na América Latina. É dele o texto (‘Salvos pela simplicidade”) que republiquei esses dias, sobre as razões da não contaminação do sistema bancário brasileiro,
Assis afirma, em entrevista ao blog, que a turbulência externa reduzirá o ritmo de crescimento da economia brasileira. “Não vamos crescer 6% nos próximos anos”, avisa. Mas ele não espera uma catástrofe, embora prefira não fazer previsões sobre o tamanho da desaceleração. O menor impacto da crise na economia brasileira, diz Assis, “deve-se mais ao fato de sermos uma economia insular do que às nossas virtudes”.
Assis, que já foi professor da PUC-SP e da FGV-SP, chegou há um mês de uma estada de um ano em Londres, onde assessorou diretamente a presidência do HSBC. De lá, traz a percepção de que a crise financeira está longe do fim. “Estamos no meio de um incêndio de grandes proporções”.
Qual o impacto da crise global no Brasl?
Não dá para ficar imune, mas é uma contaminação de segunda ordem. Em primeiro lugar, porque os bancos brasileiros não têm a sofisticação necessária para pegar essa doença causada pelo subprime. O sistema, no Brasil, é fortemente regulado. É um esquema papai-mamãe dos anos 60. Portanto, não temos esse canal - que é o principal - de contaminação. Em segundo lugar, os bancos brasileiros não são internacionalizados o suficiente para ter algum tipo de dificuldade com o subprime. Se fossem, estariam contraindo o crédito aqui dentro, o que também não é o caso.
E os bancos estrangeiros que operam no País?
Mesmo os grandes bancos estrangeiros que atuam aqui não estão entre os maiores perdedores nessa crise - e também não estão entre os maiores do ranking nacional.
A economia real?
Haverá, sim, impactos, mas filtrados por algumas condições. Por exemplo, a contribuição do comércio exterior para o PIB tem sido negativa. Se a absorção interna não estivesse vazando para fora, via importações, estaríamos crescendo num ritmo de 8%. Outro filtro está relacionado ao fato de que nossas exportações para os EUA, centro da crise, são relativamente pequenas. O canal de remessas internacionais de dinheiro - dos EUA para outros países - é muito forte na América Central, mas não no Brasil. Em alguns países daquela região, essas remessas chegam a 25% do PIB.
Mas o crédito internacional já não começou a secar?
Esse é um ponto importante. No crédito, realmente, a coisa vai pegar. O crédito externo vai apertar. Está todo mundo revendo linhas de financiamento. Isso significa destruição de moeda. Em resumo, o que haverá é uma desaceleração do crescimento econômico, talvez em decorrência de um câmbio mais forte, que, por sua vez, será resultado da diminuição do fluxo de capitais para o Brasil. Isso deve também desacelerar o ritmo de expansão do crédito aqui dentro. Algo, aliás, que ocorreria de qualquer forma, pois é insustentável o crédito crescer 30% ao ano indefinidamente, como recentemente no Brasil.
Estamos blindados?
Não é isso. Esse impacto pequeno no País deve-se mais ao fato de sermos uma economia insular, com sistema financeiro regulado, do que às nossas virtudes. É importante salientar que o que houve nesse último fim de semana é algo que vemos muito, muito raramente. Não dá para subestimar, mas, no Brasil, a vida segue normalmente, estamos fora disso. Podemos ver que as manchetes aqui se concentram na queda da Bolsa, que é pequena em termos internacionais e concentradas em commodities. Por isso, aliás, a Bolsa não é um termômetro da economia brasileira.
Dá para estimar qual o tamanho dessa redução do ritmo de crescimento do PIB?
Não me arrisco a dizer. O que dá para afirmar é que nossa economia corre pelo consumo interno. Aqui não temos alavancagem. O máximo que pode acontecer é a inadimplência subir por causa de sobreendividamento.
Estamos no início, no meio ou no fim da crise?
Recentemente, participei de uma reunião em Londres, na qual fizeram para um dos grandes nomes do banco essa pergunta, só que usando a metáfora futebolística. A questão era se estávamos no primeiro ou segundo tempo ou, quem sabe, na prorrogação. A resposta: ‘Ainda estamos cantando o hino. Tem muito jogo pela frente. Veja, por exemplo, as ações da AIG, que já foi a maior seguradora do mundo. Despencaram 91% em um ano. Era algo impensável. Estamos no meio de um incêndio de grandes proporções. É muito sério.
Fonte: Blog do José Paulo Kupfer.
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