José Paulo Kupfer.
O Capitalismo em marcha.
Há uma forte expectativa de que o governo americano anuncie, neste domingo, antes que as bolsas asiáticas abram os pregões de segunda-feira, um plano “definitivo” de salvação das gigantes do financiamento de hipotecas, nos Estados Unidos, Fannie Mae e Freddie Mac. As notícias sobre o anúncio vazaram na sexta-feira, depois de reuniões separadas com os presidentes das duas companhias, ambas conduzidas pelo secretário do Tesouro, Henry Paulson, o presidente do Fed, Ben Bernanke, e James Lockhart, diretor da Agência Federal de Financiamentos Imobiliários, o órgão regulador do setor.
Quem mais avançou nos detalhes do plano foi o “The New York Times”, num relato em parte traduzido na edição local do “O Globo”. Em linhas gerais, a idéia é colocar as duas empresas “sob custódia” da agência reguladora, como forma de garantir a continuidade de seu funcionamento.
Trata-se, em resumo, de uma reestatização completa.
Como num Proer das hipotecas, o dinheiro para limpar o balanço e acertar as contas com os credores virá do governo. Mas, diferentemente do modelo brasileiro de estatizar prejuízos, que apenas transferiu recursos públicos para mãos privadas, o controle de Fannie Mae e Freddie Mac ficaria com o governo e tanto seus atuais dirigentes quanto os acionistas teriam de cair fora.
Garantir o funcionamento de Fannie Mae e Freddie Mac é algo crítico para o mercado financeiro americano e internacional. As duas empresas, entes híbridos – com um pé no governo, outro na iniciativa privada, e ações negociadas em bolsa –, são responsáveis pelo financiamento de US$ 5 trilhões em hipotecas e respondem por cerca de 70% dos novos empréstimos negociados depois da eclosão da crise dos subprimes. Na lista de seus acionistas aparecem enormes fundos institucionais, grandes instituições financeiras do mundo todo e até… bancos centrais de diversos países.
Não se sabe ainda o tamanho do resgate, mas é certo que o contribuinte americano vai assistir à aspiração de novas dezenas de bilhões de dólares dos cofres públicos para as contas das duas companhias. É certo também que haverá uma completa mudança nos seus quadros executivos. Nas reuniões de sexta-feira, o presidente da Fannie Mae, Daniel H. Mudd, e da Freddie Mac, Richard F. Syron, teriam sido informados de que eles e seus diretores terão de deixar os cargos.
Os acionistas remanescentes também ficarão a ver navios. Mas, a esta altura, isso não é nada de tirar o sono. Afinal, suas ações, que há um ano valiam perto de US$ 70, hoje mal alcançam US$ 5.
Não dá para chorar por eles. Em um ano, as ações da Freddie Mac perderam 94% de seu valor, mas só os lerdos e os sonsos tomaram chumbo. Muitos ganharam rios de dinheiro operando sob altíssimo risco, num esquema que não poderia se manter indefinidamente. Chamam a atenção, os pacotes salariais dos executivos que conduziram ao desastre. Richard Syron, presidente da falida Freddie Mac, por exemplo, acumulou, nos últimos cinco anos, quase US$ 40 milhões em bônus de desempenho.
O capitalismo, enfim, continua sua marcha exitosa. Quando a ganância passa da conta, é só suspender por uns tempos a idéia de que o risco é a base de uma economia de mercado saudável e socializar os prejuízos. Depois, é só devolver ao setor privado, louvar o sistema de mercado e retomar o mantra do Estado mínimo.
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Como você acha que os dois candidatos à Presidência dos Estados Unidos reagiram à notícia da iminente reestatização das companhias hipotecárias?
O republicano John McCain disse que o mais importante era manter Fannie Mae e Freddie Mac em funcionamento, mas a agência reguladora deveria limitar sua capacidade de emprestar e reduzir seu tamanho até que “deixem de ser uma ameaça à economia”. McCain sugere que, em seguida, elas voltem a ser privatizadas, desta vez tomando-se o cuidado de cortar todas as suas ligações com o governo.
Barack Obama, o candidato democrata, classificou as duas empresas como uma “estranha mistura”. Segundo ele, se forem entes públicos, não devem ter fins lucrativos, e, se forem instituições privadas, não devem ser salvas pelo governo.
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