Por que liberou, como governador de SP, 400 milhões de reais do precatório do Parque Villa Lobos, se a lei lhe permitia pagar parceladamente em 15 anos? Mas isso Serra nunca vai explicar.
Carlos Newton
Existem vários casos muito mal explicados na gestão de José Serra como governador de São Paulo, que ele usou como trampolim para tentar a Presidência. Um deles refere-se a um precatório (dívida judicial da Fazenda Pública).
Por que, em 28 de dezembro de 2009, Serra liberou cerca de 400 milhões de reais (a nona parcela do precatório do Parque Villa Lobos, o maior do Brasil, que atualizado supera os 3 bilhões de reais), se a emenda constitucional 62/2009 já permitia que os precatórios em atraso fossem parcelados em 15 anos?
Como se sabe, a 9 de dezembro de 2009 foi promulgada a emenda 62/2009, que ofereceu ao Poder Público (União, Estados e Municípios) a possibilidade de quitarem os precatórios em 15 anos. Anteriormente, essas entidades públicas caloteiras já tinham obtido prazo de 8 anos e depois prazo de 10 anos e assim mesmo quase nada pagaram. Hoje, essas dívidas decorrentes de desapropriação de áreas e de imóveis ou de condenações por danos morais e materiais e de direitos usurpados de funcionários públicos, segundo a OAB, ultrapassam a casa dos 80 bilhões de reais.
Só o Estado de São Paulo deve mais de 20 bilhões de reais e a Prefeitura de sua capital outros 12 bilhões de reais. Por conta dessa vergonhosa dívida, o então governador José Serra e o prefeito Gilberto Kassab, de São Paulo, competentemente, lideraram movimento no Congresso Nacional em favor da aprovação da absurda emenda 62, que acabou sendo promulgada.
Entrando em vigor essa tal emenda Renan Calheiros, (que é flagrantemente inconstitucional, segundo a Procuradoria Geral da República e a OAB nacional), os estados e municípios ganharam, a partir de 9 de dezembro de 2009, uma moratória alargada, uma quase anistia, para saldarem os milhares de precatórios em atraso. Só no Estado de São Paulo, há mais de 500 mil credores aguardando pagamento há dezenas de anos. Ou seja, milhares de titulares desses créditos até já morreram.
Por conta dessa nova emenda, os Tribunais de Justiça que, a pedido dos credores, vinham determinando o seqüestro de rendas contra Estados e Municípios que não estavam pagando as 10 parcelas anuais, estabelecidas na emenda 30/2000, de pronto suspenderam esse procedimento em respeito ao estabelecido na Emenda 62/2009.
Se o Tribunal observou os dispositivos previstos na nova emenda do calote, abortando pedidos de sequestro e a liberação das parcelas sequestradas e ainda não pagas, por que o então governador do Estado de São Paulo, espontaneamente, liberou a 9ª parcela do precatório do Parque Villa Lobos (parcela de quase 400 milhões de reais), que, de acordo com a emenda 30/2000, poderia ser paga até 31 de dezembro de 2010?
Essa liberalidade precisa ser esclarecida, sobretudo se levarmos em conta que em 2009, conforme dados divulgados oficialmente, para pagar dezenas de milhares de precatórios de natureza alimentar, que precisam ter prioridade absoluta, o governador Serra disponibilizou apenas 100 milhões de reais. Já para os precatórios de desapropriação, destinou em 2009 quase 2 bilhões de reais.
Notas inseridas em diversos sites informam que são três os credores do maior precatório brasileiro, os empresários Toninho Abdalla, seu primo José João Abdalla Filho e a empresa S/A Central de Imóveis e Construções.
No Home IG – Gente – Notícias, de 04/11, foi divulgado que Toninho Abdalla, “é considerado um dos últimos playboys de sua geração – ele tem 56 anos”. A nota diz que “Toninho Abdalla recebeu a maior indenização já paga por uma desapropriação de terreno no Brasil. A família de Antonio João Abdalla Filho era dona de uma área de 717 mil metros quadrados em região nobre da cidade. Para transformá-la no Parque Villa Lobos, o Estado de São Paulo acertou com Toninho e um primo seu, João José Abdalla Filho, o pagamento de R$ 1,7 bilhão, que eles receberam em dez parcelas anuais de R$ 250 milhões, entre 1999 e 2009 – Toninho, no entanto, era o sócio majoritário da propriedade”.
Inexplicavelmente, a Prefeitura de São Paulo também transformou-se em credora de parte desse bilionário precatório, referente a uma área na Marginal Pinheiros, onde em 1988 a Prefeitura depositava lixo recolhido e pagava pelo uso do terreno, segundo informação extraída dos autos do processo de desapropriação.
Não bastasse a irregularidade do pagamento da nona parcela do precatório, face à existência da Emenda 62/2009, vigente a partir de 9 de dezembro de 2009, o ex-governador José Serra precisa explicar também por que pagou R$ 17, 2 milhões a mais, a título de juros moratórios, correspondentes a 359 dias de atraso, se ele, espontaneamente, quitou por antecipação a 9ª parcela no dia 28 de dezembro de 2009, a qual venceria só três dias depois, quando realmente começariam a ser contados os dias de atraso para se computar os juros de mora.
Ora, se não houve atraso no pagamento da 9ª parcela, que nem deveria ter sido saldada antecipadamente, por que o pagamento de um acréscimo de quase R$ 18 milhões, referentes de juros de mora que na verdade jamais existiram? Isso cheira mal a quilômetros de distância, faz Serra colocar o falecido Orestes Quércia no chinelo, em matéria de corrupção.
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UMA EMENDA TIPO RENAN CALHEIROS
Vejam o que saiu no conceituado site “Consultor Jurídico”, a respeito da emenda Renan Calheiros: “A Constituição Federal prevê que “uma lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Com base nesse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a inconstitucionalidade incidental do regime que se pretende implantar com a Emenda Constitucional 62/09. A emenda trata de precatórios pendentes de pagamento.
“Ao ferir a coisa julgada, a emenda afronta a independência que deve haver entre os Poderes, afirmou o desembargador Ivan Sartori em acórdão relatado em agosto. “O colegiado entendeu que a EC 62 fere princípios constitucionais como os da proporcionalidade e da razoabilidade”.
Surge, então, uma pergunta ao presidente nacional da OAB e à opinião pública em geral: nas ações de desapropriação em que se discute apenas o valor real da desapropriação com base no laudo pericial, é correto, não fere a moral administrativa e o patrimônio público, que se pague ao escritório de advocacia que atuou no caso 10% do valor real do imóvel desapropriado?
Num caso como o acima relatado, poderia o advogado receber honorários advocatícios de 300 milhões de reais, que seriam pagos também pelo Poder Público (ou seja, pelos contribuintes), na condição de expropriante?
Todos os contribuintes merecem explicações. Mas Serra jamais se explicará.
Fonte: Tribuna da Imprensa online.
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