por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile
O jogo de cinco tabuleiros
Olá, para governar, Lula tem que operar ao mesmo tempo na economia, no Congresso, no STF, nas relações exteriores e no enfraquecimento da oposição.
.A volta dos que não foram. A aposta de Lula em distensionar o clima político com a viagem à China foi por água abaixo. A visita talvez fique só para maio, depois da ida a Portugal e Espanha e a depender da disponibilidade do governo chinês. Claro que o encontro continuará sendo estratégico para ambas as partes, principalmente diante da frustração brasileira com as negociações com os Estados Unidos e Europa. De todo modo, o cancelamento da viagem deixou no centro da agenda o embate público com o Banco Central e as pressões em torno da nova regra fiscal. O comunicado da última reunião do Copom reafirmou as tendências de alta nos juros, conseguindo unificar a equipe econômica contra o tom político da turma de Campos Neto. Mas a permanência desse círculo vicioso mostra que o BC quis emparedar o governo e condicionar qualquer mudança nos juros à aprovação do novo arcabouço fiscal, desde que considerado “sólido e crível” pela autoridade monetária - entenda-se - o mercado. Por isso, Haddad aproveitou a semana para pisar no acelerador. A proposta da nova regra fiscal foi apresentada à Câmara, depois de aprovada por Lula, pela equipe econômica e pela direção do PT, para não haver cotoveladas. A meta é zerar o déficit público no próximo ano, alcançar o superávit em 2025 e estabilizar a dívida pública em 2026. A reação positiva da Bolsa e do Legislativo devolve a responsabilidade para o BC, que se mantiver os juros altos é por convicção ideológica e fisiologismo. Porém, para que tudo isso seja viável, o governo conta com um aumento da receita que viria como resultado da reforma tributária. O problema é que a reforma não tem hora pra sair do papel, principalmente porque mexe num vespeiro, ao acabar com isenções fiscais, além do temor de municípios de perderem arrecadação. Por outro lado, alguns economistas veem a nova regra fiscal como uma armadilha que pode tornar o governo refém da austeridade. Além da possível solução para o impasse da regra fiscal, há duas boas notícias na economia: a inflação dos alimentos desacelerou, e os aportes do Novo Bolsa Família podem contribuir para turbinar o mirrado PIB brasileiro.
.Os piores vizinhos do mundo. Que Lula não procure paz e tranquilidade do outro lado da Praça dos Três Poderes. Próximo do presidente do Senado desde a eleição e aproximando-se de Arthur Lira após o segundo turno, o governo esperava ter alguns meses de lua de mel com o Congresso. Mas a verdade é que nenhuma proposta relevante foi votada até agora e as Medidas Provisórias emitidas pelo governo ficaram emperradas graças à disputa de Lira com Pacheco pela composição das Comissões Mistas que analisam as MPs. Ainda que o governo tenha dito que o caso era assunto interno do Legislativo, na prática, a ação da base governista liderada por Renan Calheiros no Senado foi decisiva para encerrar o assunto e derrotar Lira. As más notícias são que o governo perdeu tempo com a disputa, atrasou seu calendário de votações e que ainda pode sofrer uma revanche do coronel alagoano movido pelo rancor. A boa notícia é que talvez Arthur Lira não seja tão poderoso quanto pensa. Além do revés na primeira vez em que foi confrontado, Lira também está vendo parte de sua base se reaglutinar num “centrão com Lula”, também articulado por Renan Calheiros. Outro protagonista que não quer voltar para as sombras é o STF. Os neo-aliados Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes decidiram entrar na disputa pela escolha do próximo nome a usar toga no Supremo. Para alívio de Lula, Mendes e Moraes querem discutir o sucessor de Rosa Webber em outubro. O que sinalizaria uma aceitação do nome de Cristiano Zanin para a vaga de Ricardo Lewandowski. Além do ex-advogado do presidente, concorrem à vaga o jurista Pedro Serrano (indicado pelo grupo Prerrogativas); o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas (preferido de Mendes e Moraes); o ex-secretário do STF, Manoel Carlos de Almeida Neto, favorito de Lewandowski que também indicou os juristas Heleno Taveira Torres e Pierpaolo Bottini (ambos da USP). Com menores chances, os ministros do STJ, Luis Felipe Salomão e Benedito Gonçalves, também são citados. A favor de Zanin está a fidelidade a Lula, o que não é pouco considerando o histórico dos outros indicados pelos petistas.
.Indesejados. Como se já não tivessem incômodos suficientes, o governo e o próprio Lula também sabem como arranjar mais problemas. Como, por exemplo, ao ressuscitar Sérgio Moro para as manchetes políticas. Tendo descido do Olimpo do Judiciário e reduzido a mero mortal no Senado, Moro seria apenas mais um rostinho feio na multidão a disputar o espólio do bolsonarismo, bem atrás dos concorrentes mais fortes. Mas com uma ajudinha do governo, ao invés das absurdas taxas de juros e de bater em Campos Netos, assistimos Lula e ministros debatendo o irrelevante ex-juiz. E talvez sejam estas dificuldades do governo que tenham estimulado Bolsonaro a voltar, assim como o trono vazio de líder da oposição. É verdade que há um deserto intelectual na oposição, como demonstram o passeio do ministro Flávio Dino na Comissão de Constituição e Justiça, surfando na ignorância dos bolsonaristas, ou o pedido de impeachment contra Lula articulado pelos deputados do PL, sem nenhum fundamento além da emoção do momento. Porém, Bolsonaro dificilmente será aclamado como o líder da verdadeira força do bolsonarismo, as Forças Armadas. Além disso, estes três meses de fuga foram suficientes para que Romeu Zema, Tarcísio e até Michelle Bolsonaro se animem a ocupar o seu posto, e agora o capitão tenta conter as ambições dentro de seu próprio time. E, por fim, a oposição quer bater no governo pela economia, um tema que Bolsonaro não tem nada a dizer. Ou seja, o capitão volta muito menor do que quando partiu. Além disso, ele tem seus próprios problemas, como explicar as jóias sauditas, a participação do seu círculo mais próximo na preparação do golpe de 8 de janeiro e a possibilidade de se tornar inelegível. Tirando tudo isso, sua presença cria uma situação inédita, onde ele agora estará na oposição enfrentando um Lula vitaminado pelo poder presidencial. O risco, avalia Elio Gaspari, é Lula se tornar refém da polarização imposta pelo antipetismo bolsonarista, o que poderia agravar o quadro político.
.Ponto Final: nossas recomendações.
.O problema com a IA é o mesmo com o capitalismo. A Inteligência artificial está sendo introduzida pelo capitalismo para acabar com empregos. Mas no Socialismo, ela seria libertadora. Na Jacobin.
.Que os bancos queimem. Para o Ex-ministro da economia grego Yanis Varoufakis, o sistema financeiro é incorrigível e precisa ser implodido para o bem da maior parte da população.
.Em câmera lenta, catástrofe global avança em nome de Deus, Pátria e Família. Fome, concentração de renda e inflação são decisões políticas, lembra o economista Ladislau Dowbor.
.De Rock in Rio a Lollapalooza, festivais são palco de escravidão há 10 anos. Não é só na agricultura. Redes de fast food e festivais musicais violam os direitos trabalhistas nas cidades, escreve Leonardo Sakamoto.
.Uberizando a vida. No infográfico da Piauí, quem são, qual a idade e a renda dos 1,7 milhões de brasileiros que trabalham para aplicativos de entregas.
.Trabalheira #15: Do OnlyFans ao Xvideos, será que até o trabalho no pornô foi uberizado? No podcast do Repórter Brasil, como a uberização alcançou até a indústria pornográfica.
.Maior greve em três décadas paralisa a Alemanha. Na DW, como os sindicatos realizaram a maior paralisação dos últimos anos na Alemanha.
Minha filha tinha com a Vale um compromisso, mas a empresa não teve a mesma responsabilidade com ela. Um testemunho de Maria Regina da Silva, da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão.
Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Nenhum comentário:
Postar um comentário