Por Glauco Faria
A crise atual do mercado imobiliário estadunidense, com todos seus efeitos, gera uma série de considerações e ponderações que colocam em xeque os dogmas do neoliberalismo. A mais óbvia delas é o chamamento do Estado para intervir na economia, com o governo dos EUA tendo que assumir o controle de gigantes do setor e injetando recursos para evitar uma catástrofe maior. Ao que parece, o modelo econômico neoliberal parece aquele garotinho rico que sai de casa, grita aos quatro cantos que é independente, mas quando a coisa aperta pede socorro pro papai.
Há quase seis meses, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo já alertava sobre os riscos da crise nos Estados Unidos e também contava que o governo brasileiro já se preparava para os possíveis cenários decorrentes de tal situação. À época, o professor da Unicamp adiantava que os EUA teriam que tomar medidas que contrariavam seu próprio ideário, vendido ao resto do mundo (principalmente aos países em desenvolvimento) como remédio para todos os males. "Na Crise de 29, o endividamento total das famílias era de 40% do PIB. Hoje é mais de 100%. Uma diferença fantástica, o nível de endividamento é fantástico. (...) Esse é um problema de inadimplência, não de liquidez. Como são 14 milhões de contratos de devedores, uma parte substancial não vai ser honrada e você tem que fazer como o Getúlio fez, moratória. Isso é doído pra eles [estadunidenses]. Eles pensam 'como fazer isso e quebrar os contratos'?". E completava: "A coisa é muito clara: vai ter que ter uma operação de salvamento, com uma intervenção do Estado brutal, só comparável ao New Deal. O controle do Fed sobre os bancos vai ter que ser rigoroso."
Esse é o tipo de crise que pode não apenas questionar fundamentos, mas provocar outros tipos de reflexão sobre a própria eficiência e atualidade do atual modelo econômico, algo que à primeira vista interessa mais aos operadores do mercado do que à esquerda (embora não seja verdade). É disso que trata Ladislau Dowbor, entrevistado principal e capa da Fórum de setembro que está nas bancas. Para ele, o "salve-se quem puder" da concorrência sem limites está se tornando ineficiente para o capitalismo e mesmo quem não está situado no campo progressista começa a enxergar nos princípios colaborativos uma saída para o impasse.
É o que faz, por exemplo, um gigante como o Google quando lança seu navegador próprio em código aberto. Porém, pela frente existe uma série de obstáculos, como as grandes corporações que enxergam na propriedade intelectual seu grande diferencial em relação aos demais. "O problema das patentes e do controle do conhecimento é absolutamente vital. Ignacy Sachs, quando lançou o último livro dele no Brasil, disse que, se no século passado o embate era por quem controlava as fábricas, porque o centro da economia era a indústria, hoje o grande embate é quem controla o direito de acesso ao conhecimento", diz Dowbor.
Se quisermos de fato discutir e propor mudanças no atual modelo econômico, esse é o momento de se debater como democratizar a peça-chave da nova economia, o conhecimento, e a propriedade deste. Do contrário, discutindo nos mesmo moldes de sempre, quem tem a ganhar são os defensores do status quo e esses já ganham há tempos...
Fonte: Blog do Rovai.
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