quinta-feira, 22 de setembro de 2011

ECONOMIA - A lição da Argentina.

O presidente da Argentina, Néstor Kirchner, deu em 2007 “uma banana” ao Fundo Monetário Internacional (FMI), rechaçando a possibilidade de negociar um novo acordo entre a Argentina e a instituição. “Aqui, não vamos fazer acordos com o FMI”, disse, fazendo o clássico gesto da banana durante um longo discurso de abertura do ano legislativo em sessão do Congresso argentino. “Sob nenhum sentido, nenhum aspecto, estamos dispostos a fazer novo acordo com o FMI.” .

Falando por duas horas e meia, Kirchner destacou a forma como o país quitou sua dívida com o FMI, em janeiro de 2006, a qual permitiu que “já não tenhamos a ditadura” dessa instituição, “manejando as finanças da Argentina”. Em tom irônico, recordou as críticas recebidas por ter “arriscado as reservas” com o pagamento ao FMI, argumentando que elas “duplicaram” no último ano.

Kirchner também fez um apelo para que não se copiem “receitas enlatadas” e defendeu uma atuação coletiva para a construção de “um modelo em que o povo argentino seja o principal ator e beneficiário”. O presidente reafirmou que a Argentina “é um país soberano” e que “a melhor base para o desenvolvimento nacional estratégico é um modelo de crescimento e inclusão que inclua a criação de trabalho digno”.

Kirchner destacou que “os resultados (econômicos) são eloqüentes em todas as frentes”, já que o país registra o “quinto ano consecutivo de crescimento”. Segundo ele, “o país mostra um crescimento econômico sustentável que deixa atrás as carências de estruturas”.


Agora em setembro de 2011, o FMI não se rende diante das evidências da economia argentina.


No início de sua conferência anual, o organismo admitiu que a Argentina será o segundo país que mais crescerá no mundo nesse ano, depois da China. Advertiu, entretanto, que deixará de se basear apenas nos indicadores do Indec e sugeriu a aplicação de receitas ortodoxas.

A reportagem é de Fernando Krakowiak e publicado pelo Página/12, 21-09-2011. A tradução é do Cepat.

O Fundo Monetário Internacional, disse ontem que a Argentina vai crescer 8% este ano. É a percentagem mais alta na região e mundialmente perde apenas para a China. No entanto, os técnicos do organismo multilateral deixaram claro que não perdem as manhãs, e numa nota de rodapé em seu Panorama Econômico Mundical desacreditam as estatísticas oficiais do Indec, usadas como subsídio para esse informe. “Em que pese a melhora da qualidade dos dados apresentados, o FMI utilizará também outros indicadores, entre os quais se incluem análises de analistas privados”, destacou. “O importante não o que digam lá fora, o importante é que o nosso povo passou a consumir mais”, respondeu o ministro da Economia Amado Boudou que participará da assembléia anual do organismo.

A sede do FMI fica a apenas 200 metros da Casa Branca, numa área de luxo em que a crise que vive os Estados Unidos passa inadvertida entre arranha-céus espelhados e lojas de marcas e últimos modelos. Os preparativos da assembléia transcorriam ontem com tranquilidade, até que a burocracia do Fundo esquentou a prévia com um duro questionamento às estatísticas oficiais argentinas. Não é a primeira vez que a agência lança dúvidas sobre os dados do Indec, mas até agora tinha se limitado a incluir em seus relatórios uma nota de rodapé, onde os números do PIB e da inflação eram menores do que as estimativas privadas que assessoravam o governo na elaboração de um índice de preços nacional.

Desta vez, assume que os números oficiais têm deficiências ao afirmar que as autoridades estão empenhadas em melhorar a qualidade das estatísticas, "para que o fornecimento de tais dados se torne consistente com as obrigações estabelecidas no acordo do FMI. " Em seguida, acrescenta que utilizará indicadores alternativos de analistas privados, mas não esclarece como irá incorporar ao informe. O FMI não menciona que está realizando uma assessoria, apesar de que faz um ano e meio presta assessoria técnica ao Governo. Em abril do ano passado, Nicolás Eyzaguirre, diretor do Departamento para o Hemisfério Ocidental do organismo, revelou que o governo concordou em enviar uma delegação para trabalhar com o Indec no desenvolvimento de um índice de preços nacional. A primeira missão foi em 08 de dezembro e se reuniu com executivos e economistas Indec e consultores privados. Em abril deste ano uma segunda delegação chegou e se dedicou a conhecer como se realizam as medições em algumas províncias.

Depois daquelas visitas, o governo informou que o IPC-Nacional estará pronto em 2013, porque antes é necessário realizar um levantamento dos gastos nos lares em todo o país, que será implementado no próximo ano. O FMI convalidou esse cronograma, pois em 13 de julho, o Conselho emitiu uma declaração em que se limitou a afirmar que "recebeu com agrado o compromisso feito recentemente pelas autoridades argentinas para trabalhar em estreita colaboração com os serviços do FMI para melhorar a qualidade dos dados da argentina sobre o IPC-GBA".

Agora, entretanto, subiu a aposta, no que parece ser uma pressão política para apressar mudanças, mais do que uma decisão de substituir os números oficiais. Isso seria um fato sem precedentes na história do organismo e tampouco garantiria maior precisão, porque consultores privados deram conta de uma precariedade metodológica alarmante nos informes que apresentaram na Secretaria de Comércio Interior. Outro dado a ser destacado é que o Fundo tampouco se caracteriza pela rigorosidade técnica. Em 2003, prognosticou que a economia argentina cresceria 3% e chegou a 8,8%; em 2004 disse que o teto era de 5,5% e chegou a 9% e assim sucessivamente até o momento atual. Além disso, nos últimos anos foram surpreendidos pela crise mexicana de 1994, a russa, a do Brasil, a do leste europeu e as das hipotecas subprime dos Estados Unidos.

A advertência do FMI sobre as estatísticas expressa uma disputa política que também se vê no restante das recomendações que o organismo incluiu no informe apresentado ontem pelo seu economista chefe, Olivier Blanchard. Em sua análise sobre as economias da América Latina, o Fundo destaca que “a região se beneficiou do intercâmbio e das condições de financiamento externas favoráveis”, atribuindo exclusivamente a isso o crescimento de 6,1% do ano passado e os 4,5% que se espera para esse ano. Na sequência adverte que a atividade está acima do seu potencial e acrescenta que “provavelmente se justifique uma maior contração monetária naquelas economias onde os riscos de superaquecimento parecem mais eminentes (Argentina, Paraguai, Venezuela)” e assinala que “a consolidação fiscal deve continuar”.

O único ponto em que se afasta de sua tradicional pregação liberal é o reconhecimento de que os controles de capitais poderiam proporcionar certo alívio temporário, dada a grande afluência de divisas, mas esclarece que "estas medidas não devem substituir o ajuste macroeconômico necessário”. As propostas tentam minar os pilares macroeconômicos que permitiram atravessar a crise financeira em melhores condições que as potências desenvolvidas, ao mesmo tempo em que propõe incorporar as ferramentas recessivas que estão afundando a Europa

Fonte:IHU

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