Que há caixa dois em empresas e governos, sabe-se, ainda que seja, quase sempre, muito difícil de provar sua existência. Que muitos partidos aparelham ministérios, secretarias de estados, diretorias de órgãos públicos e de empresas estatais e de economia mista e utilizam as facilidades auferidas no desempenho dos cargos para prover recursos para suas campanhas eleitorais também não é novidade para quase ninguém. A grande mídia sabe disso, o ministério público, os poderes legislativo e judiciário, além do próprio poder executivo e, claro, grande parte da população sabem disso. Aceitam-se estes fatos quase que como um fenômeno natural, contra o qual nada ou muito pouco se pode fazer.
O que causa estranheza, no presente momento, é que se tenha escolhido um ministro e um partido político como os alvos capazes de, ao serem atingidos, possibilitar o resgate e o restabelecimento da ética no universo público brasileiro. Orlando Silva e o PCdoB passaram a ser os vilões da hora e alguns grandes veículos de imprensa tornaram-se grandes defensores da honra e da moralidade política no país.
Cai, na metade do décimo mês de governo, o sexto ministro da presidenta Dilma Rousseff, um recorde no período democrático brasileiro. Nunca tantos ministros foram trocados em tão pouco tempo de mandato na história deste país. Embalados por alguns dos maiores veículos da imprensa nacional, integrantes das classes médias brasileiras têm saído às ruas e bradado que “agora chega!” e a presidenta tem se visto na contingência de exigir que os ministros acusados entreguem suas cartas de demissão.
Mais do que pautar o governo, prática tentada corriqueiramente por parte da grande mídia, o que se está conseguindo fazer agora é paralisar parcialmente, por dias, setores do governo federal até que, ao final, o ministro escolhido seja abatido. Foi assim com Antônio Palocci, da Casa Civil, com Pedro Novais, do Turismo, com Alfredo Nascimento, dos Transportes, com Wagner Rossi, da Agricultura, e até com Nelson Jobim, da Defesa.
Se, excetuando-se o último, todos os outros cinco ministros demitidos praticaram atos que podiam e podem ser caracterizados como eticamente condenáveis e foram, por este motivo, justamente denunciados pela mídia, causa surpresa, entretanto, que a mesma mídia tenha se calado, em todos e em cada um dos casos, tão logo o ministro tenha caído. Derrubado o ministro, a indignação midiática estanca instantaneamente, como que por milagre. Não mais se veiculam denúncias relacionadas aos fatos, não mais se investigam desmandos e corrupções que tenham sido praticadas no exercício do mandato e, sobretudo, nunca se passa a cobrar que as investigações aconteçam pelos órgãos competentes, sejam policiais ou judiciários, e se desenvolvam celeremente. É como se, com a demissão do possível corrupto a corrupção por ventura praticada deixasse de existir.
As denúncias e a indignação só voltam a ocorrer com a descoberta de um novo ministro suspeito. Novamente manchetes, novamente campanhas midiáticas, novamente investigações e novamente manifestações de rua aos brados do “agora chega!”. Dilma tem atendido, até aqui, aos apelos e acedido às denúncias, promovendo a troca de ministros. Tem dado provas de que seu governo não compactua com a corrupção ou com a suspeita de que ela possa ocorrer sem punição. É um avanço e uma novidade num país tão acostumado à leniência e a tolerância com os desmandos.
Até quando, entretanto, a presidente Dilma Rousseff aceitará que a mídia denuncista molde seu ministério e tente impor a “faxina” como política de governo? Por quais motivos, além disso, esta parcela da mídia e das classes média – que sempre conviveram com a corrupção, o caixa dois, o aparelhismo e os desvios de recursos públicos – se declaram agora “indignadas” e passam a exigir uma ação saneadora do governo federal?
Fonte: FNDC
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