É hora de Dilma olhar para o novo

Em seu artigo na Carta Capital desta semana, o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos alerta para o vácuo de crítica consistente ao governo.
Ao criar o que ele denomina de “centro estendido”, o PT jogou a oposição para perto da extrema direita.  Restou a ela "a encenada indignação moral e acenos genéricos de eficiência".
Por seu lado, com esse centro-baleia o governo Dilma Rousseff conseguiu se fortalecer parlamentarmente, mas à custa do enfraquecimento da relação com a  sociedade em mudança. Nas hostes do governo, “qualquer opinião divergente, autônoma, em relação à cadeia de comando dos líderes do centro-baleia é atacada como reacionária”.
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O que move a democracia é a lógica das inclusões sucessivas, que ocorrem à medida em que grupos minoritários vão se organizando e ganhando voz através dos votos – e, mais que isso, à medida em que as elites nacionais se civilizam.
O princípio da igualdade tornou-se cláusula pétrea na consciência jurídica nacional. Mas não consiste apenas em assegurar patamar mínimo de dignidade a todos os cidadãos, mas dar-lhes a oportunidade de se integrarem à sociedade em todos os seus níveis.
É esse alargamento do conceito que vem movendo as grandes transformações sociais da humanidade.
Nas políticas raciais, criminalizou-se a proibição de locais públicos impedirem a entrada de  pessoas por cor. Na saúde, inspirou os movimentos de desospitalização de pessoas com problemas mentais. Na educação, significou conferir  às pessoas com deficiência o direito de estudarem na rede básica com colegas sem deficiência. Na vida em comum, significou reconhecer o direito de casamento gay.
Há uma consciência modernizadora atuando em todas essas áreas. É essa vanguarda que representa o novo. O velho é defendido pela rede dos sanatórios garantida pela política de internação compulsória de viciados, pelas escolas especiais (tipo APAE) e por outras formas de apartheid.
É por aí que se entende a repercussão da operação Cracolândia, trabalho meticuloso da Prefeitura de São Paulo montado durante 6 meses, envolvendo diversas secretarias de governo, visando atender a apenas 300 pessoas.
Do ponto de vista quantitativo não se compara a programas massificadores, como o Bolsa Família, Brasil Sem Miséria, Luz Para Todos etc.
Do ponto de vista simbólico, foi uma explosão, que conferiu uma legitimidade inédita ao prefeito Fernando Haddad.
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Nos últimos anos, esses movimentos modernizantes foram deixados à deriva por uma oposição sem nenhuma sensibilidade social e por um governo que abdica do moderno por alianças políticas menores. A operação Cracolandia foi um respiro nesse oceano de anacronismo. 
Uma das maiores vitórias modernizadoras – a política de inclusão de crianças com deficiência na rede básica, responsável pelo atendimento de 800 mil crianças– está prestes a sofrer um golpe tremendo, devido aos interesses eleitorais paroquiais da Ministra-Chefe da Casa Civil Gleisi Hoffmann e da Secretaria de Direitos Humanos Maria do Rosário.
Seria bom que, de vez em quando, Dilma Rousseff olhasse para baixo, para as transformações que estão ocorrendo em uma sociedade em movimento, e incluísse a consolidação do novo como peça política central.