Porque a delação da JBS contra Dilma e Lula não pesam como a de Temer
JBS provou relação direta com Temer, além de apresentar provas
de pagamento de propina. Contra Dilma e Lula, há terceiros e o
desgastado "ouvi dizer"
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Jornal GGN - A liberação da chamada lista de
Fachin, com dezenas e mais dezenas de inquéritos contra políticos de
todos os leques, a reboque da delação da Odebrecht, exigia um esforço
que a imprensa não conseguiu fazer: separar o joio do trigo. Naquele
momento, todos foram jogados numa vala comum. Peixe de aquário, com
acusação de receber R$ 30 mil como doação eleitoral via caixa 2, sem
contrapartidas, foi misturado com tubarão que faturou milhões em cima de
obras públicas. A delação da JBS não é diferente nesse sentido.
Não sabemos se é por culpa do Ministério Público Federal (que só
agora tirou da manga a ação controlada) ou da JBS (que só passou a
registrar encontros com políticos após o impeachment), mas a disparidade
nas provas apresentadas contra Michel Temer, de um lado, e Dilma
Roussef e Lula, de outro, é gritante.
Contra Temer, há áudio de conversa com o próprio presidente sobre
pagamento de propina, há grampo telefônico, há entrega filmada de mala
de dinheiro a um deputado de sua "estrita confiança". Contra Dilma e
Lula, há diálogos com terceiros e o já desgastado "ouvi dizer". Pelo
menos é o que depreende-se da leitura de anexo da delação premiada de
Joesley Batista.
Talvez a Lava Jato possa tornar público, nos próximos dias ou
horas, o que Joesley entregou como prova material do que relatou contra
os ex-presidente petistas. Mas, por enquanto, a história repete fórmula
já usada por Marcelo Odebrecht, trocando Antonio Palocco e João Vaccari
por Guido Mantega e Edinho Silva. Resume-se da seguinte forma, a
delação:
- Em 2005, quando Guido Mantega era presidente do BNDES, JBS
conseguiu financiamento de 80 milhões de dólares para a expansão da
empresa. Cerca de 4% dessa valor foi pago a um advogado chamado Victor
Garcia Sandri. Este advogado agendava os encontros com Mantega e
afirmava que dividia a propina com ele a propina fruto das
"facilidades". O pagamento a "Vic" foi feita por meio de offshore
controlada por Joesley, com depósito numa conta no exterior indicada
pelo advogado. Naquele mesmo ano, Mantega recebeu da JBS uma "cesta de
Natal" que custou 17 mil reais.
- Depois de 2006, quando Mantega se tornou Ministro da Fazenda,
foram fechadas 2 operações entre a JBS e o BNDES com intermediação de
Vic. A primeira, de 2007, foi a "aquisição, pelo BNDES, de 12,94% do
capital social da JBS, por 580 milhões de dólares, para apoio ao plano
de expansão daquele ano"; a segunda operação foi "aquisição, pelo BNDES,
de 12,99% do capital da JBS, por 500 milhões de dólares, em operação
conjunta com FUNCEF e, PETROS, para apoio ao plano de expansão do ano de
2008." Não há relato de pagamento de propina nesses casos.
- Em 2009, Joesley conseguiu tirar Vic do caminho e passou a
discutir projetos diretamente com Mantega. O ministro teria dito que a
"propina", segundo o delator da JBS, seria discutida "caso a caso", ou
seja, em cima de cada "intervenção" de Mantega em favor da empresa junto
ao governo.
- O delator, contudo, cita duas operações que ocorreram a partir de
2009 de maneira totalmente regular. Primeiro, em 2009 mesmo, a
liberação de 2 bilhões de dólares para o plano de expansão da JBS e,
segundo, o financiamento de 2 bilhões de reais, em 2011, "para a
construção da planta de celulose da Eldorado". Diz o anexo: "QUE, no
entanto, embora a negociação das operações tenha sido bastante dura,
acabaram sendo realizadas sem que fossem praticadas irregularidades e
sem que a instituição financeira tenha tido prejuízo".
- Entre uma ação e outra, Joesley decidiu criar, em 2010, uma conta
no exterior e depositou nela 50 milhões de dólares. Avisou Mantega. Em
2011, depositou mais 30 milhões de dólares, "já sabendo que seriam para
Dilma".
- Aqui entra a primeira citação a Dilma e Lula: "(...) em reunião
com Mantega ocorrida no final de 2010, este pediu ao depoente [Joesley]
que abrisse uma nova conta, que se destinaria a Dilma; o depoente
perguntou se a conta já existente não seria suficiente para os depósitos
dos valores a serem provisionados, ao que Guido respondeu que esta era
de Lula, fato que só então passou a ser do conhecimento do depoente; o
depoente indagou se Lula e Dilma sabiam do esquema, e Guido confirmou
que sim".
- O delator observou que não pagava propina para fraudar órgãos do
governo, mas para garantir que ninguém colocasse emprecilhos aos
interesses da JBS. "(...) Sempre percebeu que os pagamentos de propina
não se destinavam a garantir a
realização de operações ilegais, mas sim de evitar que se criassem
dificuldades injustificadas para a realização de operações legais."
- Apesar disso, o delator afirma que as contas foram abastecidas
também com esquemas em fundos de pensão, e que os respectivos
presidentes dessas instituições receberam propina. A Lava Jato não
detalhada nada sobre isso.
- O delator, então pula 2014. Ano em que Mantega teria feito
sucessivas reuniões com Joesley para falar de financiamento de campanha.
O então ministro teria apresentado uma lista de candidatos para receber
doação da JBS. O partido citado é o PMDB. Quem fazia a distribuição era
Ricardo Saud, diretor de Relações Institucionais da J&f, holding da
JBS.
- Aqui, a primeira citação de encontro com Lula. EM meio à eleição
de 2014, "o depoente encontrou-se com Lula e relatou a ele que as
doações oficiais da JBS já tinham ultrapassado 300 milhões de reais e
indagou se ele percebia o risco de exposição que isso atraía, com base
na premissa implícita de que não havia plataforma ideológica que
explicasse tamanho montante; QUE o ex-presidente olhou nos olhos do
depoente, mas nada disse."
- Depois, o relato do único encontro com Dilma, após a eleição:
em novembro de 2014, o depoente, depois de receber
solicitações insistentes para o pagamento de 30 milhões de reais para Fernando
Pimentel, governador eleito de MG, veiculadas por Edinho Silva, e de receber de
Guida Mantega a informação de que "isso é com ela", solicitou audiência com
Dilma; QUE Dilma recebeu o depoente no Palácio do Planalto; QUE o depoente
relatou, então, que o governador eleito de MG, Fernando Pimentel, estava
solicitando, por intermédio de Edinho Silva, 30 milhões de reais, mas que, atendida
essa solicitação, o saldo das duas contas se esgotaria; QUE Dilma confirmou a
necessidade e pediu que o depoente procurasse Pimentel; QUE no mesmo dia, o
depoente encontrou Pimentel no Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, disse
que havia conversado com Dilma e que ela havia indicado que os 30 milhões
deveriam ser pagos; QUE Pimentel orientou o depoente a fazer o pagamento por
meio da compra de participação de 3% na empresa que detém a concessão do
Estádio Mineirão; QUE afora essas duas ocasiões, Edinho Silva, então tesoureiro da
campanha do PT, encontrava-se, no período da campanha de 2014, semanalmente
com Ricardo Saud e apresentava as demandas de distribuição de dinheiro;
- Com Edinho, Saud combinou que a JBS ia financiar principalmente
candidatos do PT e, num segundo plano, tratar dos aliados. A Lava Jato
esclareceu que se trata de "compra de apoio de partidos políticos".
- Por fim, Mantega teria solicitado (1) um empréstimo pessoal de 5
milhões de dólares para injetar na empresa PEDALA EQUIPAMENTOS
ESPORTIVOS, que não deu certo e que a dívida acabou perdoada. E que,
depois, Mantega "solicitou ao depoente que fizesse um investimento de 20
milhões de dólares, debitado da conta-corrente do PT, em uma conta no
exterior; QUE o depoente consentiu e determinou fosse realizada a
transferência; QUE após 1 ano, o investimento foi devolvido para a
conta-corrente do PT, em igual valor, não sabendo este qual o destino ou
a finalidade do investimento."
Essa é a delação. Está em anexo, abaixo.
Em nota, Lula sustentou que "as afirmações de Joesley Batista em
relação a Lula não decorrem de qualquer contato com o ex-Presidente, mas
sim de supostos diálogos com terceiros, que sequer foram comprovados."
Dilma alegou que "jamais tratou ou solicitou de qualquer
empresário, nem de terceiros doações, pagamentos ou financiamentos
ilegais para as campanhas eleitorais, tanto em 2010 quanto em 2014,
fosse para si ou quaisquer outros candidatos". E acrescentou: "Nunca
autorizou, em seu nome ou de terceiros, a abertura de empresas em
paraísos fiscais."
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