Quatro estados americanos confirmam poluição da água decorrente de perfurações para extração de petróleo e gás
Em pelo menos quatro estados norte-americanos responsáveis por um grande aumento na produção energética foram feitas centenas de reclamações sobre a contaminação da água de poço derivada das perfurações de poços de petróleo e gás. A poluição da água confirmou-se em muitos deles, de acordo com um estudo que lança dúvidas sobre a afirmação das empresas de que tais problemas têm acontecido só em casos raros.A reportagem é de Kevin Begos, publicada pelo USA Today, 05-01-2014. A tradução é de Isaque gomes Correa.
A agência de notícias Associated Press – AP solicitou informações sobre as reclamações relacionadas às perfurações nos estados da Pensilvânia, Ohio, Virgínia Ocidental e Texas, e descobriu grandes diferenças de como os estados reportam tais problemas. O estado do Texas forneceu a maior parte dos detalhes, enquanto os demais estados providenciaram apenas informações em linhas gerais. E enquanto os problemas confirmados representam somente uma pequena parcela dos milhares de poços de petróleo e gás perfurados a cada ano nos EUA, a falta de detalhes em alguns dos relatórios poderá ajudar no aumento da confusão pública e na desconfiança a respeito do tema.
A AP descobriu que o estado da Pensilvânia recebeu 398 reclamações em 2013 alegando que a extração de petróleo ou de gás natural poluiu ou afetou poços particulares de água, um índice menor se comparado com as 499 reclamações feitas em 2012. As reclamações aqui podem incluir queixas relativas à diminuição no fornecimento de água em curto prazo, bem como poluição advinda do gás de rua ou outras substâncias. Mais de 100 casos de poluição se confirmaram ao longo dos últimos cinco anos.
Só ouvir o número total de reclamações já foi o suficiente para deixar preocupada a senhora Heather McMicken, um proprietária do leste da Pensilvânia que se queixou sobre a contaminação dos poços que, por fim, as autoridades acabaram confirmando.
“Uau! Estou surpresa”, disse McMicken, dizendo que ela e seu marido souberam quantas pessoas haviam feito reclamações similares, já que principal fonte de informação “era através das más línguas”.
Ela e seu marido formam uma das três famílias que conseguiram chegar a um acordo de 1,6 milhão de dólares com uma empresa de extração. Heather McMicken disse que o estado deveria estar aberto para repassar todos os detalhes.
Ao longo dos últimos 10 anos, o emprego do método de fraturamento hidráulico (ou “fracking”) para perfuração de poços levou a um grande aumento na produção de petróleo e de gás natural em todo o país. Isso reduziu as importações e levou a centenas de bilhões de dólares em receita para empresas e proprietários de terra, embora também tenha criado temores na população com relação à poluição.
Para extração de combustível a partir de formações de xisto são necessárias centenas de milhares de galões d’água, areia e produtos químicos, tudo isso disposto no solo para quebrar as rochas e liberar o gás. Certa quantidade desta água, junto de grandes quantidades da água existente no subsolo, retorna à superfície e pode conter altos níveis de sal, produtos químicos usados na técnica de perfuração, assim como metais pesados e, naturalmente, pode ocorrer radiação ainda que de baixo nível.
Mas alguns poços de petróleo e gás convencionais ainda são perfurados, de modo que as reclamações sobre contaminação da água podem vir delas também. Especialistas dizem que o tipo mais comum de poluição envolve o metano, e não produtos químicos decorrentes do processo de perfuração.
Algumas pessoas que dependem da água de poço próximas das operações de perfuração e extração se queixam da poluição, porém tem havido muita confusão sobre a amplitude de tais problemas. Por exemplo, iniciado em 2011, o Departamento de Proteção Ambiental do Estado da Pensilvânia lutou fortemente contra os esforços da Associated Press – AP e de outras agências noticiosas que queriam obter informações sobre as reclamações relacionadas à perfuração. O departamento argumentou, como se lê nos arquivos judiciais, que ele não conta quantas “cartas” de contaminação emite, nem que rastreia o local em que elas são guardadas em seus arquivos.
Steve Forde, porta-voz da empresa Marcellus Shale Coalition – o grupo líder se setor na Pensilvânia –, disse, em comunicado à imprensa, que a “transparência e o tornar disponíveis os dados para o público é fundamental para encarar de forma correta esta oportunidade histórica e também manter a confiança pública”.
Quando o Departamento Ambiental determina que o desenvolvimento de gás natural tem causado problemas, afirmou o porta-voz, “as nossas empresas-membro trabalham, de modo colaborativo, com os proprietários e legisladores a fim de encontrar uma solução rápida”.
Entre os resultados da pesquisa feita pela AP estão os seguintes:
— O estado da Pensilvânia confirmou ao menos 106 casos de contaminação de poços de água desde 2005, e contabilizou mais de 5 mil poços novos. Houve cinco casos confirmados de contaminação de poços nos primeiros nove meses de 2012, 12 em todos os meses de 2011 e 29 em 2010. O Departamento Ambiental disse que informações mais detalhadas poderão estar disponíveis em alguns meses.
— O estado de Ohio teve 37 reclamações em 2010 e nenhuma contaminação no abastecimento de água; 54 reclamações em 2011 e dois casos confirmados de contaminação; 59 reclamações em 2012 e duas contaminações confirmadas; além disso, 40 reclamações para os primeiros 11 meses de 2013, com duas contaminações confirmadas e 14 ainda sob investigação, disse o porta-voz do Departamento de Recursos Naturais, Mark Bruce, por email. Nenhum dos seis casos confirmados de contaminação relacionava-se com o faturamento hidráulico, disse o porta-voz.
— O estado de Virgínia Ocidental teve cerca de 120 reclamações de que a prática de perfuração contaminou poços de água ao longo dos últimos anos, e em quatro casos as evidências eram fortes o suficiente, tanto que a empresa responsável pela perfuração concordou em tomar ações corretivas, disseram as autoridades.
— Uma planilha disponibilizada pelo estado do Texas contém mais de duas mil reclamações, e 62 delas alegam possível contaminação de poços de água derivada da atividade de extração de petróleo e gás, disse Romana Nye, porta-voz para a Comissão Railroad, do Texas, que supervisiona o setor. Os legisladores texanos não confirmaram nenhum caso de contaminação de poços de água relacionadas com a prática de perfuração/extração nos últimos 10 anos, afirmou.
Na Pensilvânia, o número de casos confirmados de poluição da água na parte leste do estado “caiu significativamente” em 2013, se comparado com anos anteriores, escreveu a porta-voz do Departamento de Proteção Ambiental, Lisa Kasianowitz, por email. Dois casos em que a prática de perfuração afetou a poços de água se confirmaram no ano passado, disse ela, e uma decisão final não foi tomada ainda em três outros casos. Porém, disse que não poderia informar quantas das outras queixas estaduais foram resolvidas ou quantas foram descobertas como sendo provenientes de causas naturais.
Divulgar informação detalhada sobre os problemas relativos a perfurações e extração de petróleo e gás é algo importante, porque o debate não é mais somente sobre justiça, mas também sobre confiança, disse Irina Feygina, uma psicóloga social que estuda questões de política ambiental. Perder a confiança pública é uma “maneira infalível para prejudicar” a reputação de qualquer negócio, afirmou.
Especialistas e legisladores concordam que é particularmente difícil investigar as reclamações de contaminação dos poços de água, em parte porque algumas regiões têm poluição natural de gás de metano ou outros problemas não relacionados com as práticas de perfuração e extração. Um estudo feito em 2011 no estado da Pensilvânia descobriu que, aproximadamente, uma parcela equivalente a 40% dos poços de água testados antes das perfurações falhou em, pelo menos, um aspecto dos padrões federais de água potável. O estado da Pensilvânia é dos poucos estados que não têm padrões para construção de poços particulares de água.
Todavia, outros especialistas dizem que as pessoas que tentam entender os benefícios e os malefícios advindos desta grande quantidade de perfuração de poços precisam de mais informações sobre as reclamações, mesmo se alguns dos casos forem de causas naturais.
Na Pensilvânia, o número bruto de reclamações “não quer dizer nada”, afirmou um cientista da Universidade de Duke, Rob Jackson, que estuda questões relacionadas à perfuração e contaminação da água.
“Estejam certas ou erradas, muitas pessoas pensam que o Departamento responsável vem obstruindo algumas destas investigações”, afirmou Jackson sobre a situação na Pensilvânia.
Em contraste com as informações limitadas fornecidas pelas autoridades da Pensilvânia, funcionários do Texas disponibilizaram uma planilha detalhada de 94 páginas quase que imediatamente, listando todos os tipos de reclamações relacionadas com a extração de petróleo ou gás dos últimos dois anos. As informações do estado do Texas incluem os dados da reclamação, do proprietário de terras, da empresa perfuradora e um breve resumo de todos os problemas relatados. Muitas reclamações envolvem outras questões, tais como fortes odores ou abandono de equipamento.
Scott Anderson, especialista em perfuração e extração de petróleo e gás junto ao Fundo de Defesa Ambiental (uma organização sem fins lucrativos sediada em Austin, no Texas), observa que os legisladores texanos começaram a guardar mais informações sobre as reclamações na década de 1980. Uma nova legislação, datada de 2011 e 2013, levou a relatórios mais detalhados e forneceu financiamentos para um novo sistema tecnológico de informação, disse.
Anderson concordou que a falta de transparência fomenta a desconfiança.
“Se as empresas não têm nada a esconder, então deveriam querer fazer com que os fatos falem por si mesmos”, afirmou. “O mesmo vale para agências reguladoras”.
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