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A FINANCEIRIZAÇÃO DOS ALIMENTOS | ||
Um dos traços do capitalismo contemporâneo, a financeirização na economia global – modelo em que predomina a especulação em detrimento da produção – vem sendo sentida nas mesas dos brasileiros, em especial os mais desfavorecidos. Os preços dos alimentos explodiram nos últimos anos, puxando a inflação para cima em todo o mundo. Estudo divulgado em agosto pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) confirma: ficaram 68% mais caros entre janeiro de 2006 e março deste ano. Entre os principais responsáveis por essa elevação, a especulação. `Muitos fundos financeiros e agentes, particularmente nos países desenvolvidos, migraram de áreas como a imobiliária, por exemplo, para alimentos, porque ficou muito claro que o desequilíbrio entre oferta e demanda ocorreria`, salientou o ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. Presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e coordenador do Centro de Agronegócio da FGV (Fundação Getúlio Vargas), ele explica que esse desequilíbrio ocorreu porque a demanda explodiu nos países emergentes, em que a renda per capita está crescendo 3,5 vezes mais do que nos desenvolvidos. Na sua ótica, o protecionismo agrícola praticado pelas nações ricas contribuiu para reduzir a oferta. Os estoques mundiais despencaram e, como reação, subiu o custo dos alimentos. `E a especulação, quando o mercado é demandante, joga os preços para cima.`
Para o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, o choque de commodities deve-se a uma `seqüência de erros cometidos na política energética e agrícola no mundo inteiro que o modelo neoliberal só agravou`. Ele observa que se abandonou o planejamento, deixado por conta do mercado, inepto para questões de longo prazo. `Não existem no Brasil, como no resto do mundo, estoques reguladores. Só temos de arroz, acabamos com essas intervenções que são fundamentais.` Nesse modelo, pouco interessa o produto em si, objeto da especulação. `Basta que haja oportunidade, como a defasagem entre oferta e demanda, para operações de vendas futuras.`
Pesquisadora do Núcleo de Agronegócios da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) e professora de MBA em Agronegócios da FGV, a economista Maria Flávia Tavares aponta: `Os fundos vão atrás do que está dando maior rendimento. Com a crise do subprime (espécie de crédito de segunda linha à habitação) nos Estados Unidos, partiram para commodities agrícolas.` No curto prazo, conforme sua explicação, a oscilação nos preços é determinada nas bolsas, sob os fundamentos da oferta e demanda. Na cesta dos agentes financeiros, soja, trigo, milho, suco de laranja, café. Produto básico na mesa dos brasileiros, o feijão não é objeto dessas operações, mas sofre com a alta volatilidade e eventuais quebras de safra. Para interromper o ciclo inflacionário, nesse caso, o próprio ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Reinhold Stephanes, admitiu, segundo publicado na Agência Brasil, a necessidade de estoques reguladores, como propõe Belluzzo.
Milho, cana e insumos
Também contribuiu para a alta dos alimentos o fato de o milho estadunidense, em sua quarta parte, ter virado álcool em vez de comida, afirma Rodrigues. Assim como a elevação nos custos agrícolas, dado o incremento nos preços dos insumos nos últimos dois ou três anos. Entre esses, na opinião de Eliseu Roberto de Andrade Alves, assessor da Presidência da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), o petróleo, cotado a mais de US$ 100 o barril, é o principal responsável. Quanto a outros, como fertilizantes – como destacou o presidente da Comissão de Agricultura do Senado, Neuto de Conto (PMDB-SC), na abertura do 7º Congresso Brasileiro de Agribusiness, realizado em São Paulo pela Abag (Associação Brasileira de Agribusiness), em 11 e 12 de agosto –, seria preciso que o País, hoje fundamentalmente importador, ampliasse sua produção interna. Como resposta, o ministro Stephanes afirmou na oportunidade: `A Petrobras vai construir mais duas grandes unidades de nitrogenados. Queremos resolver um problema na agricultura, nos tornar menos dependentes e vulneráveis tanto quanto a preço, quanto a fornecimento.`
O etanol brasileiro, apontado como principal vilão nesse cenário de escalada inflacionária, diferentemente do estadunidense, proveniente de cultura essencialmente alimentar, não está por trás da alta verificada. Para a Abag, o argumento de que o aumento da área plantada de cana-de-açúcar em território nacional teria como conseqüência redução da oferta global para atender a demanda por alimentos é falacioso. Neuto de Conto elucidou: `Para sua produção, usamos somente 2% do nosso solo agricultável, sendo 1% para açúcar.` Além disso, conforme garante Luiz Carlos Corrêa Carvalho, presidente do Comitê de Agroenergia da Abag, cerca de 88% da expansão da cana se dá em áreas de pastagens degradadas. O ministro completou: `Temos todas as condições de ser produtores de alimentos e energia.`
Como acredita Rodrigues, o reequilíbrio nesse mercado deve vir com resposta dos produtores para atender a demanda acelerada. `No limite, em três anos, a oferta alcançará a procura. Com isso, a especulação tenderá a diminuir e os preços voltarão a patamares históricos.` Para se tornar menos sujeito a crises cíclicas, o agronegócio brasileiro precisa de compensações, as quais, conforme o projeto `Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento` – lançado pela FNE em 2006 e que propugna por uma plataforma nacional de desenvolvimento sustentável com inclusão social –, podem se dar de várias formas. Além de investimentos em ciência e tecnologia para elevar a produtividade e fazer frente a mudanças climáticas, um mecanismo de seguro rural inclui-se entre as propostas. Caso nada seja feito, o fosso entre os que têm acesso aos alimentos e os que têm fome deve se aprofundar.
Soraya Misleh (jornalista) Publicado originalmente: `O Engenheiro` (Nº 76, setembro 2008), informativo da Federação Nacional dos Engenheiros. |
Carlos Augusto de Araujo Dória, 82 anos, economista, nacionalista, socialista, lulista, budista, gaitista, blogueiro, espírita, membro da Igreja Messiânica, tricolor, anistiado político, ex-empregado da Petrobras. Um defensor da justiça social, da preservação do meio ambiente, da Petrobras e das causas nacionalistas.
sexta-feira, 3 de outubro de 2008
ARTIGO - A financeirização dos alimentos.
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