terça-feira, 21 de outubro de 2008

MERCADO DE TRABALHO - 1998, o ano que ainda não terminou.

Voltou a tramitar na Câmara dos Deputados o projeto de lei 4302/98, que trata da terceirização de mão-de-obra e certamente o maior ícone do desmonte da legislação trabalhista da Era FHC.

Há cinco anos, Lula requereu o arquivamento da proposição. A mensagem presidencial até hoje não foi votada, o que deu margem para que o projeto de lei voltasse à pauta. Vale lembrar que ele já tramitou na Câmara e no Senado, onde sofreu modificação. Por isso, voltou para a primeira Casa. Uma vez aprovado, vai direto à sanção.

Por esse motivo, é urgente exigir que o governo e a base aliada se mexam para que a Câmara analise a mensagem presidencial e vote pelo arquivamento do projeto de lei.

Herança maldita...

Se é para falar em herança maldita, voltemos ao ano de 1998. Nesse ano, o Congresso aprovou uma série propostas do governo FHC que desregulamentavam a legislação trabalhista, entre as quais a suspensão temporária do contrato de trabalho (uma espécie de demissão sem custas rescisórias); o contrato por prazo determinado com redução do FGTS, o banco de horas e a `jornada parcial`. Encaminhado ao Congresso em março de 1998, o PL 4302 se inscreve no kit predatório do tucanato.

Nenhuma das medidas daquele ano, contudo, foi tão perigosa como esta última proposição, que agora volta a atormentar os trabalhadores. Isso porque ela não se limita a `legalizar` a contratação terceirizada, mas corrompe os dois princípios basilares de toda a legislação trabalhista, inscritas nos artigos 2º e 3º da CLT: os conceitos de empresa e de empregado, a partir dos quais a relação de trabalho se define.

Seguramente, a aprovação do PL 4302/98 representa o fim do vínculo empregatício. Ele poderá até existir no papel, mas dificilmente será adotado pelas empresas. Veja por que:

a) O projeto generaliza a contratação terceirizada em caráter permanente e para qualquer atividade, urbana ou rural, inclusive do mesmo grupo econômico. A empresa poderá ter 100% dos seus funcionários por terceirização ou até mesmo quarteirização (esta possibilidade também está prevista na proposição).

b) O projeto assegura não haver `vínculo empregatício entre os trabalhadores ou sócios das empresas prestadoras de serviços (...) e a empresa contratante`. Ora, isso legaliza aquela situação em que a empresa `propõe` ao seu empregado a abertura de uma empresa ou a adesão a uma pseudocooperativa. Um prato cheio para a Super-Receita analisar...

Afinal, quem são os `sócios` se não os funcionários que passaram a condição de `prestador de serviços`, cooperados ou não ??. Esse é o grande `pulo do gato`. Livra a empresa do ônus de contratar, promovendo, simultaneamente as reformas trabalhista e tributária.

c) Ainda que exista vínculo do empregado com a empresa prestadora de serviço, uma coisa é certa: ao contratar `serviços` e não mais pessoas, a empresa estará livre de cumprir as regras estabelecidas por Convenções Coletivas dos empregados agora substituídos por `terceirizados`.

d) A proposta ainda retroage no tempo e declara `anistiadas dos débitos, das penalidades e das multas` as empresas que vinham contratando irregularmente, antes da eventual mudança.

e) Pior ainda: a nova modalidade instituída pelo projeto não vale para as empresas que já vinham contratando irregularmente (as mesmas que serão anistiadas). Para essas, os contratos `poderão adequar-se à nova lei`, mediante contrato entre as partes.

f) O projeto ainda exime a empresa tomadora dos serviços da responsabilidade pelo não-pagamento das contribuições previdenciárias e/ou trabalhista. Embora seja ela a maior beneficiária, sua responsabilidade é apenas subsidiária em relação aos danos causados ao trabalhador ou aos cofres públicos.

Além de introduzir a terceirização como norma legal, o PL 4302 altera as regras de contratação temporária, também por empresa interposta. Entre outras medidas, um trabalhador poderá permanecer em uma empresa como `temporário` por até 270 dias ou prazo ainda maior, se constar de acordo ou convenção coletiva. Ao final do contrato, sai da empresa com uma mão na frente e outra atrás... A proposta também cuida de assegurar que não existe vínculo empregatício entre o empregado temporário e a empresa contratante.

O retorno do PL 4302/98 à pauta e o descaso com a mensagem presidencial que solicita o seu arquivamento configuram um ato de irresponsabilidade e má fé. Mas é também uma boa oportunidade de enterrar definitivamente um período ruim da nossa história. Caso contrário, 1998 será, de fato, o ano que não terminou...

Silvia Barbára, professora e diretora da FEPESP – Federação dos Professores do Estado de São Paulo e do SINPRO-SP – Sindicato dos Professores de São Paulo.
Fonte: AEPET.

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